“Se o patriotismo é o último refúgio do canalha; as escrituras são o primeiro refúgio dos ignorantes”. [Frase de Pat Condell, um cético].
Uma frase um tanto quanto inquietante, principalmente para nós cristãos. Mas, devo confessar que ultimamente tenho me sentido muito frustrado pelo que vejo as pessoas fazer com o livro que nos serve de base para o exercício da fé. Infelizmente, a Bíblia hoje, está refém de cientistas e/ou estudiosos, palestrantes animadores de platéia, entidades filantrópicas ou não, dentre outros. Ela foi reduzida a manual legitimador de argumentações; prevalece no final “a verdade bíblica” de quem argumentou melhor. O Deus, o Jesus [Cristo ou não, depende em que acredita quem argumenta], o Espírito, etc, tudo vai se tornando original na medida em que o argumentador fulmina a platéia, de uma academia por exemplo, com uma gama de “boas argumentações [quase] lógicas”. A partir do discurso de quem é mais hábil no texto, não sem a devida “base bíblica”, as pessoas vão vencendo umas às outras numa “intensa queda de braço”.
Meu argumento é que a Bíblia, com isso, vai sendo literalmente secularizada. Uma agressão à fé dos poucos, e ainda considerados “ingênuos”, que tocam nela e entram em contato com “o sagrado”.
Alguém um dia disse que “a Bíblia é a mãe de todas as heresias”. Isso não me admira hoje, tempo em que muitos recorrem à ela, para matar, roubar, e destruir “o que é outro”, diferente de mim mesmo.
Na minha opinião a Bíblia deveria ser mais preservada. A Bíblia é base de fé, e a fé vem pelo ouvir, ouvir “a Palavra de Deus”. A fé não vem pelo falar, antes, pelo ouvir; a Bíblia portanto deve servir de parâmetro para quem ouve e não para quem fala [ou argumenta] – aqui citando contexto mais acadêmico. “A palavra escrita da palavra revelada de Deus” [Cf. Barth], na minha opinião, deve estar muito mais ligada ao discipulado cristão, evangelismo seja como for, ao ato de construir pontes, ato concreto de se viver e experimentar a fé. Isso seria bem mais humano e inteligente. O "ide e pregai o evangelho à toda criatura", hoje está confundido e portanto escondido atrás de ideologias pessoais. Quando o eunuco disse a Filipe que não entendia porque não havia quem falasse, também o registro está estritamente relacionado ao falar de evangelho. “O falar” em toda Bíblia, principalmente em Jesus, implica em “metanóia” [conversão] e boas novas.
Hoje, utilizar-se da bíblia, instrumentalizá-la para dizer que fulano ou beltrano está certo e que “o outro está errado” e portanto “condenado ao inferno” é uma aberração – muito distante do que o próprio Jesus ensinou. Usar a Bíblia nesse contexto configura uma tremenda covardia, além de denotar certa ignorância e sinalizar uma possibilidade de que muitos não têm outros recursos enquanto base de argumentação. Ou que pelo menos colocam Deus no discurso para legitimar de uma vez por todas suas ideologias – absolutista e totalitarista, pois quem poderá argumentar contra “o que Deus falou?”. Hoje, citar a Bíblia, em tantos debates - verdadeiros embates, parece conferir status ao palestrante.
Para mim isso é uma vergonha, o que fizeram do evangelho? Um "des"-evangelho[!]
O que proponho é que a Bíblia esteja garantida como Bíblia e que não seja mais utilizada como um outro livro qualquer, porque isso sim é que a equipara a um outro livro: de auto ajuda, receitas de bolo, a arte de comunicar-se, dentre outros. Talvez isso ajude um pouco, minha preocupação é que, assim como já aconteceu antes, e por várias vezes na história, ela seja o argumento legitimador de duras cruzadas, ou de golpes letais contra aquele(a) que pensa diferente de mim. Fico admirado como as pessoas utilizam-se do que está escrito na Bíblia e absolutizam suas falas para diminuir quem está “do outro lado da mesa”; e sendo assim, talvez, e só talvez, a frase supra citada de Pat Condell faça algum sentido.
Sei bem da complexidade da temática e no geral, imagino como esse texto poderá ser interpretado. Mas não tenho responsabilidade sobre o que vão pensar, a não ser sobre as palavras que saem da minha boca e conseqüentemente o texto que vai sendo redigido. É a reflexão de alguém que já está cansado de ver tantas guerras frias dentro da Igreja de Cristo, em nome de Deus, e com base nas Santas Escrituras. Chega de uma vez por todas de tanta violência e “des”-envangelho. O assunto é amplo e de extrema complexidade, reconheço que talvez merecesse uma reflexão bem mais aprofundada, mas, por questões estéticas e de delimitação não vou prosseguir. O interessante será conhecer a sua opinião sobre isso, e assim quem sabe poderemos dialogar em mais algumas linhas de texto.
Abraço, do sempre amigo.