quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Tento, mas sem inspiração não posso ...

Tenho tentado falar de mim mesmo, tenho tentado escrever sobre o que eu sei, sobre coisas que pensei, sobre palavras que aprendi, sobre poemas que eu recitei. Tento, mas tenho andado sem inspiração, o pudor da crítica me escapu pelo meio dos dedos, me amarrei de novo ao encanto da sensação histérico-emotiva, não paro de divagar - encantado na busca frenética pelo etéreo. Não sei se isso é bom, se isso é ruim, apenas vivo cada minuto apertado dos meu dias, esperando que de novo, e mais uma vez, me sinta revestido da estola ortodoxa da teologia sistemática, e pelo espírito crítico das letras que sufocam toda e qualquer espontaneidade, para então, e só então, parar para pensar nos planos e projetos para o ano de 2009.

Até lá .... estarei orando do meu quarto escuro de dentro de mim mesmo. Quarto que já recebeu luz, mas que insiste às penunmbras na busca de cômodos que permitam esconder tantas duras realidades, tantas duras verdades. Tanta realidade me traz ânsia ao estômago, principalmente quando olho para as pessoas irmãs, irmãs pessoas, ou mesmo para mim, e me faço estarrecido com o futuro pensado e absolutizado pela nação que se diz santa. Fico pensando nas tantas surpresas daquele dia.

Reconhecendo os tempos, épocas e ciclos.

“Levanta-te, querida minha, porque eis que passou o Inverno, cessou a chuva, aparecem as flores na terra, Chegou o tempo de cantarem as aves (Cantares, 2.10-12)

Não adianta! A vida é cíclica, e os tempos e fases se sucedem implacavelmente. Alguns ciclos, como os astronômicos, podem ser previstos com exatidão e por isso, sem falhar, ano após ano a natureza concebe os seus períodos, calma e mansamente, passando da explosão de cores e cheiros da primavera ao aquietar-se dos campos e florestas no inverno.

As fases da vida também têm o seu tempo de começar e terminar, e ao contrário do que passa pelo imaginário popular, seu término nem sempre coincide com o último dia do ano e nem experimentam um recomeçar no ano novo.

Temos dificuldades em reconhecer os tempos, em dar por encerrada uma fase para iniciar outro momento na vida. Sabedoria é saber discernir as épocas e passar por elas sem desesperar da esperança.

Dar um período por encerrado é salutar, benfazejo e liberta a alma para iniciar algo novo. Não saber encerrar é como o pintor que retoca indefinidamente uma obra ruim imaginando que pode melhorá-la. É preciso fechar a “gestalt”, ou seja, dar um basta àquilo que está aberto e incomodando.... e despedir-se. Se Abraão ficasse olhando nostalgicamente a cidade natal que o Eterno ordenara deixar, nunca teria chegado à terra da promessa. Não há mapas, não há certezas, só caminhos.

Por mais triste e doloroso que tenha sido um período, é sempre rejuvenescedor encarar uma nova fase. Deus é o Abençoador dos que têm a coragem de deixar “Lázaro” morrer. Não adianta mantê-lo moribundo ligado por aparelhos. Jesus não prolongou sua agonia, mas “atrasou-se”, permitindo que ele expirasse. Só aquilo que morre pode ser ressuscitado.

Por natureza temos medo de encerrar as coisas – até mesmo as ruins: um curso mal escolhido, um namoro arrastado e conflituoso, um emprego asfixiante, uma igreja que neurotiza seus membros....

Parece que estamos adentrando um tempo de grande aflição: as utopias humanas sucumbiram, o comunismo falhou como proposta exeqüível, e o capitalismo mostra sua verdadeira face. Não há mais certezas, tudo que era sólido está se desmanchando no ar.... e o homem sem Deus não tem mais onde se apoiar. Tudo está mal? Nem tudo – tempos de decepções pode ser uma rica oportunidade de rever conceitos.

Deus pôs a eternidade no coração do homem (Ec 3.11), mas este preferiu se perder no efêmero e transitório. Ao cristão é dada a capacidade de discernir entre o valor daquilo que é temporal e aquilo que é eterno. Sofremos quando confundimos as coisas.

Por toda a bíblia é falado do tempo da angústia, tempo da calamidade, tempo de aflição. A bíblia fala do choro que pode durar uma noite... Quando o povo hebreu foi para o cativeiro na Babilônia uma grande tristeza se abateu sobre ele, as harpas foram penduradas nos salgueiros e seus lábios emudeceram para as canções. Porém o propósito divino era para que este período não fosse infrutífero, depressivo ou estéril para o seu povo, ao contrário:

“Edifiquem casas e habitem nelas, plantem pomares e comam de seu fruto, tomem esposas, gerem filhos, casem suas filhas.... Logo que se cumprirem para a Babilônia setenta anos, atentarei para vós...” (Jr 29.10).

Ora, Deus ouviu as preces de seu povo, viu sua aflição, mas haveria um ciclo a ser cumprido, um propósito a ser realizado naquela terra. Na verdade, este é o drama de todos nós. O salmista não poucas vezes clama: “Apressa-te Senhor”, ou “Até quando, Senhor?”. Entretanto Deus fala de um “tempo aceitável” para nos atender. Endosso as palavras do poeta: há um tempo que a dor é inevitável, mas às vezes o nosso sofrimento é opcional.

Há tempo de falar, clamar e consolar, e há tempo de fazer silêncio. Seria de grande proveito se os tagarelas da fé, que vociferam inclementes nas rádios e TVs fórmulas e soluções para tudo, se calassem como os amigos de Jó que sentaram solidariamente a seu lado e nada falaram por sete dias, respeitando sua dor. Lembro-me, quando criança, ao passar um funeral, as portas baixavam, as pessoas interrompiam suas atividades e solenemente juntavam-se à dor dos que choravam. O verdadeiro irmão não é aquele que festeja ao nosso lado, mas que compreende nosso momento e permanece junto, travando um diálogo silencioso conosco.

Acho que compreendo Pessoa quando ele diz que “o valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso, existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”.


Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br

sábado, 20 de dezembro de 2008

CONFISSÕES DE LÚCIFER


Depois de passar 6.000 anos vagueando pela Terra, aprendi muito da natureza humana, suas fraquezas, virtudes e seus desejos mais secretos. Tenho consciência que minha causa foi derrotada, entretanto estou trabalhando freneticamente para levar ao destino que me aguarda o maior número possível de pessoas, pois sei que pouco tempo me resta [1].

Não é fácil a vida de um adversário do Todo Poderoso, principalmente porque Ele conta com um exército fiel espalhado pelo mundo inteiro que com suas orações produzem uma reviravolta em todo mal que intento. Felizmente são poucos os que oram de verdade, porque a maioria está mais preocupada consigo mesma, outros começam bem, me incomodam, mas logo desistem, pois não têm perseverança.

Fico admirado com o fascínio que exerço sobre alguns crentes, que falam mais de mim que de Deus. Rio muito quando eles tentam me amarrar, e dizem que naquela cidade eu não entro mais. Pois acaba a oração e eu continuo fazendo as mesmas estripulias. O que esses cristãos não entendem é que não devem lutar contra mim, mas buscar Aquele que tem mais poder que eu. Quando eu quase destruí a vida de Jó, ele não me dirigiu uma palavra sequer, mas dizia o tempo todo que sua causa estava diante de Deus, e que o seu Redentor vive. Quando humilhei Paulo colocando-lhe um espinho na carne, ele não tentou me acorrentar, mas apresentou sua fraqueza a Deus, que lhe deu vitória. Sinceramente, com gente assim não dá pra lutar.

Tenho prazer especial em atormentar esses que ficam preocupados comigo o dia todo. Eles dizem que me vêem em todos os lugares, até onde eu nem estou.... é muito engraçado. Com tais eu nem me previno, pois sei que são cristãos inseguros da fé que dizem possuir. Eles fazem parte daquele grupo que faz uma boa propaganda de mim, pois julgam que possuo muito mais poder do que realmente tenho e afirmam que fiz coisas das quais nada tive a ver. Na verdade, eu sou um pobre diabo, condenado e derrotado, mas da forma que falam, é como seu fosse onisciente e onipotente. Será que eles não sabem que eu não posso fazer absolutamente nada sem a permissão do Todo Poderoso? Ah, se não fosse por Ele.... mas, tudo bem, a propaganda é a alma do negócio.

Sou constantemente acusado de tirar muita gente da igreja. É mentira! Eles saem por que são levados pelos seus próprios interesses. Não fui eu quem instigou o filho pródigo a sair da casa do pai [2] e Demas abandonou o apóstolo Paulo porque amou mais o mundo do que a Deus [3].

Não tenho pretensão de tirar ninguém da igreja, pelo contrário. Quero deixá-los lá, pois farei de tudo para que sejam frios, apáticos, que fiquem brigando entre si por bobagem, que se dividam, e façam panelinhas entre eles. No que depender de mim farei com que tenham uma vida tão miserável, que quando forem evangelizar ninguém vai querer ter uma vida igual a deles. Outra estratégia que uso muito é a de fazer com que os valores da igreja se pareçam cada vez mais com o mundo, pois assim quando as pessoas passarem a freqüentá-la, elas não precisarão mudar nada, e continuarão fazendo as mesmas coisas de antes. Não é genial?

Adoro soprar mentiras nos ouvidos das pessoas, afinal quero fazer jus ao meu nome de “pai da mentira”. É, eu digo-lhes que são como gafanhotos e eles acreditam, digo-lhes que são uns derrotados e eles nem se levantam da cama, digo-lhes que Deus não os perdoou por tal e tal pecado e eles ficam cheios de culpa.

Confesso também que sinto um enorme prazer em oprimir aqueles que se recusam a perdoar ao seu irmão, pois recebi carta branca do Todo Poderoso para atormentá-los com toda sorte de espíritos malignos [4], dos quais eu sou o principal. E não ponham a culpa em mim, pois só posso fazer isso se o cristão recusar a liberar perdão, pois quando ele perdoa é horrível a sensação de paz daquele coração, e eu saio correndo dali.

Acho muito engraçado quando usam sal grosso e oração forte contra mim. Nem ligo. Agora, o que eu temo mesmo é uma vida santificada. Contra um crente santificado, fiel e que tem a Palavra guardada no coração, desse eu fujo [5].

Como minha hora se aproxima eu estou trabalhando num projeto grandioso para este século. É uma estratégia tão ardilosa que são poucos os que a percebem. Todos buscam uma divindade para adorar, por isso eu estou dando “Deus” de todos os tipos e para todos os gostos. Eu estou enchendo o mundo de “Deus” para que eles fiquem tão confundidos que não saibam quem é o verdadeiro. Cada um pode ter o seu, do jeito que quiser. Vocês não imaginam como o povo gosta dessas novidades. Tenho queimado as pestanas inventando sacrifícios, novos rituais, e tenho levantado líderes que falam muito de Jesus, mas são meus súditos. Adoro soprar ventos de doutrinas porque os meninos na fé acreditam em tudo.

O meu objetivo com isso? Confundi-los e fazê-los imaginar que estão servindo a Deus. Agora, eu não aceito levar a culpa de tudo sozinho – eu só dou o que eles querem. Eles gostam do brilho, eles buscam glória pra si, eles crêem em todas as formas de misticismo, e eu nunca imaginei que esse povo gostasse tanto de ídolos. Séculos atrás lhes dei um bezerro de ouro, mas agora eles querem ídolos que cantam, que pregam, que profetizam....

Muitos falam que eu sou feio, e até pintam quadros horríveis dizendo que eu tenho chifres, pêlos e cara de bode. Desde a minha criação sou muito vaidoso e jamais aceitaria ser desta forma. Se vocês ouvissem aquele tal apóstolo Paulo saberiam como eu sou de verdade – sempre fui um anjo de luz, fala mansa, voz agradável, boa aparência e muito convincente [6]. Felizmente são poucos os que me reconhecem.

Para terminar, eu quero dizer a todos que não sou ateu ou agnóstico. Eu creio e tremo diante de Deus [7]. Mas eu não consigo, não consigo me submeter. Submissão significa obediência, e eu não quero ser servo. Aliás, tem muita gente indo comigo que também crê em Deus, pratica seus atos religiosos, freqüenta igreja, e é dessa mesma opinião.

Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br


[1] Ap 12.12
[2] Lc 15.12
[3] 2Tm 4.10
[4] Mt 18.34-35
[5] Tg 4.7
[6] 2Co 11.14
[7]Tg 2.19

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

NÃO HÁ LUGAR PARA ELE

Jesus bateu levemente à porta, mas havia tanta gente orando em êxtase, e ao mesmo tempo, que ninguém escutou.

Jesus bateu à porta, mas naquele exato momento ocorria uma acalorada discussão entre liberais e conservadores sobre a melhor forma de adoração a Deus, e eles nem perceberam.

Jesus chamou suavemente do lado de fora, mas naquele dia a congregação festejava alegremente a presença de convidados famosos.... e ninguém se deu conta.

Jesus insistiu mais uma vez. Mas os gritos do jovem pregador ecoavam tão altos e com tal veemência, que a platéia, hipnotizada, nem se mexeu.

O que fazia Jesus do lado de fora? Simples: ele foi expulso.

Alegorizamos as situações acima a partir do perfil da igreja de Laodicéia, aquela que recebeu a última carta, de uma série de sete, no livro do Apocalipse. Não por acaso, é a igreja que mais se parece com os nossos tempos: ela é rica, seu templo bem construído, e seus membros vivem bem. Os cultos são tocantes, a afluência é grande, a pregação bem ao gosto do povo, e suas canções enchem o ar.... Mas há um problema: Jesus, Aquele pelo qual é a razão de sua existência, está do lado de fora.

Não havia lugar para Jesus na hospedaria, não havia lugar para Ele na igreja de Laodicéia, não há lugar para Ele no mundo. Nós o expulsamos do templo, e o expulsamos da vida. Ele passa ao largo. Fazer menções constantes ao Seu Nome não indicam intimidade, submissão ou identificação com Ele. Ao contrário, Jesus é o desconhecido mais famoso de nosso tempo.

A grande pergunta é: Que relevância tem Jesus para nós diante das inúmeras situações que enfrentamos no dia-a-dia? Qual o peso que Jesus tem diante das decisões que tomamos diuturnamente?

A vida no mundo pós-moderno é um moedor de carnes que mutila o ser: exigências intermináveis, prazos a serem cumpridos, metas a serem alcançadas. E interiormente enfrentamos poderosos impulsos destrutivos: somos por natureza idólatras, maldosos e egoístas. Por nós mesmos, não temos como agir com lucidez e bom senso.

Buscamos, então, refúgio, na religião. Porém, a religiosidade tem se mostrado incapaz de restaurar a paz interior e dar equilíbrio ao nosso ser: hoje é quase imperceptível alguma distinção entre o homem religioso e o não-religioso. A constatação é óbvia: as igrejas estão cada vez mais cheias de pessoas vazias. Tornamo-nos desafeiçoados, perdemos nossa humanidade e os valores do Reino. Fazer diferença no mundo, amar aos pecadores e aos desprezados não é o prato principal do cardápio servido aos fiéis. O motivo? Se Cristo não está dentro, não há preocupação com quem está fora.

Expulsamos Jesus. Ele não é mais o Senhor que dirige a mente e os propósitos do coração, pois isso é dar muita importância ao “invisível” que habita os Céus.... melhor eu mesmo resolver.

Expulsamos Jesus do nosso louvor. As letras das músicas não são mais sobre o que Ele faz, ou Sua Obra, pois Ele não é o centro – o centro sou eu: meus desejos, meus planos, minhas necessidades, e o que estou sentindo....

Expulsamos Jesus de nossas pregações. Não falamos mais Dele e sua cruz, seu sofrimento, sua humildade.... Na verdade, falamos, mas de passagem, quase que envergonhadamente. Os personagens do Antigo Testamento falam mais eloqüentemente para quem precisa da imagem de heróis que vencem batalhas.

Expulsamos Jesus da vida e restringimos a lembrança de Sua pessoa às datas especiais, como o Natal ou a Semana Santa.

Jesus foi expulso até da literatura que pretende ser cristã. O que enche as prateleiras das livrarias, e vende muito, é o gênero pseudocristão, que é um tipo de auto-ajuda com uma roupagem “quase” cristã, onde Jesus é apenas um bom homem que deixou bonitas palavras de amor.

Ou colocamos Jesus de volta no centro de nossas vidas, ou nossa existência será marcada pelo vazio, pela superficialidade e por uma espiritualidade sem Deus. O que Ele mais deseja é entrar e compartilhar conosco de cada momento vivido, de cada momento festivo, e também estar ao nosso lado quando enfrentarmos as dores, que cedo ou tarde virão. Eu diria que ele já está há algum tempo batendo docemente à sua porta.... você percebeu?

Pr Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

CREIO.... NÃO CREIO


Credo Apostólico, Credo Niceno, Credo de Atanásio, Credo... Credo... Creio. Sim, a palavra “Credo” significa justamente isso: “Eu creio”. Todos os credos escritos em diferentes momentos da história cristã resumem os principais aspectos da fé que a igreja ou aquela comunidade possuem. Eles ajudam a perseverar-nos no caminho, a manter a confiança e nos momentos difíceis afastam o perigo dos desvios. Credos não são dogmas a serem decorados, mas gestos, atitudes, fé, a serem vividos na prática.

Entretanto, é necessário que esta fé esteja de fato fundamentada nas Escrituras, para que não seja dado crédito a sofismas e enganos. Daí a advertência bíblica: “Bem aventurado aquele que não se condena naquilo que aprova” (Rm 14.22).

Chamado por Cristo para testemunhar seu Amor entre os homens, é sempre com alegria que reparto um pouco daquilo que “Creio” na esperança de cooperar na caminhada de fé de alguns. Posso dizer que....

CREIO que Deus tem poder para curar cânceres, tumores, e toda sorte de doenças e enfermidades físicas e mentais. Mas NÃO CREIO em promessas mirabolantes de que Ele sempre o fará. Deus não se sente obrigado a curar todos que lhe pedem: às vezes Ele cura, às vezes não, sem que tenha de explicar porquê.

CREIO que Cristo derrotou os principados e as potestades do Mal, triunfando sobre eles na cruz, e que o Inimigo, cheio de cólera, sabe que pouco tempo lhe resta. NÃO CREIO, entretanto, que seja necessário ou possível “amarrar Satanás” como alguns pretendem fazer. Essa é uma interpretação equivocada da bíblia. O que Deus nos ordena é “vigiar.... orar.... e resistir ao diabo”. Só isso.

CREIO que muita gente boa, honesta, e de fé enfrentará dificuldades por toda a sua existência, e há incrédulos que passarão pela vida relativamente tranqüilos. Asafe quase perdeu a fé ao ver a prosperidade dos perversos: “para eles não há preocupações, o corpo é sadio e não partilham da canseira dos mortais” (Sl 73.5). Mas é assim mesmo: “há justo que perece na sua justiça, e há perverso que prolonga os seus dias na sua perversidade (Ec 7.15).

CREIO que o Diabo existe e não ignoramos seus desígnios, e por vezes ele tentará nos barrar o caminho. Mas NÃO CREIO que tudo o que acontece provém do Mal: tropeçou foi o demo... perdeu o emprego foi o coisa-ruim... ficou doente é “encosto”. Há cristãos tão obcecados pelo diabo que se tornaram atormentados que não reconhecem mais a Soberania de Deus sobre a Terra e sobre a sua vida.

CREIO no poder das palavras que provêm de Deus, nas palavras que Ele ordenou. Estas nunca voltam vazias sem cumprir o que Ele determinou. Mas NÃO CREIO que as palavras têm poder em “si mesmas” quando proferidas por “qualquer um”. Simei amaldiçoou e amaldiçoou ferozmente a Davi, mas ele deu de ombros, e ainda ironizou: “Talvez o Senhor pague com bem a maldição que recebi neste dia” (2Sm 16.12). Se assim não fosse, qualquer pagão poderia atormentar-nos com suas imprecações. O que não passa por Deus “não pega”.

CREIO que Jesus é o Mediador entre Deus e os homens, e é Ele que nos dá total acesso ao Pai desde que o véu do templo foi rasgado. Por isso NÃO CREIO na intermediação de homens que afirmam que eles e suas igrejas são os “pedágios” que temos de passar para que alcancemos o trono da Graça.

CREIO que a verdadeira ação do Espírito Santo quebranta corações, gera um profundo senso de pecado, e uma ação permanente que vai além das emoções. NÃO CREIO que manifestações estranhas de riso, quedas ou desmaios sejam de fato espirituais quando o “dia seguinte” comprova que não houve real transformação. Embora o inconsciente possa imitar manifestações que se assemelhem à ação do Espírito, ele não pode produzir frutos verdadeiros de arrependimento que se sustentem no decorrer do tempo.

CREIO na suficiência da obra que Cristo fez na cruz, creio na existência de um céu que nos espera, e que não há pecador deste mundo que esteja fora do amor salvífico de Deus. Mas vivemos tempos tão desconectados das Escrituras, que NÃO CREIO em práticas que ferem a boa hermenêutica, a fé e o bom senso e são resultantes de interpretações esdrúxulas de versos obscuros da bíblia. Por tais motivos, não posso crer em....

...marcha profética,
...transferência de unção,
...unção dos quatro seres,
...maldição hereditária,
...dança profética,
...copo d’água orada (no espiritismo: água fluidificada)
...óleo ungido (óleo unge)
...objetos ungidos
...oração por peças de roupa (no espiritismo: pontos-de-contato)
...confissão positiva,
...entrega de sacrifícios,
...encontros com “hora marcada” para receber batismo do Espírito,
...descontrole da língua que pretende passar por glossolalia originada do Espírito.

O meu povo está sendo destruído porque lhe falta o conhecimento (Os 4.6).

Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Teodicéia - Um texto de Ed René Kivitz.


Acho que Epicuro foi quem formulou a questão a respeito da relação entre a onipotência e a bondade de Deus. A coisa é mais ou menos assim: se Deus existe, ele é todo poderoso e é bom, pois não fosse todo-poderoso, não seria Deus, e não fosse bom, não seria digno de ser Deus. Mas se Deus é todo-poderoso e bom, então como explicar tanto sofrimento no mundo? Caso Deus seja todo-poderoso, então ele pode evitar o sofrimento, e se não o faz, é porque não é bom, e nesse caso, não é digno de ser Deus. Mas caso seja bom e queira evitar o sofrimento, e não o faz porque não consegue, então ele não é todo-poderoso, e nesse caso, também não é Deus. Escrevendo sobre a Tsunami que abalou a Ásia, o Frei Leonardo Boff resume: “Se Deus é onipotente, pode tudo. Se pode tudo porque não evitou o maremoto? Se não o evitou, é sinal de que ou não é onipotente ou não é bom”.


Considerando, portanto, que não é possível que Deus seja ao mesmo tempo bom e todo-poderoso, a lógica é que Deus é uma impossibilidade filosófica, ou se preferir, a idéia de Deus não faz sentido, e o melhor que temos a fazer é admitir que Deus não existe.


Parece que estamos diante de um dilema insolúvel. Mas Einstein nos deu uma dica preciosa. Disse que quando chegamos a um “problema insolúvel”, devemos mudar o paradigma de pensamento que o criou. O paradigma de pensamento que considera o binômio “onipotência/bondade” como ponto de partida para pensar o caráter de Deus nos deixa em apuros. Existiria, entretanto, outro paradigma de pensamento? Será que as palavras “onipotência” e “bondade” são as que melhor resumem o dilema de Deus diante do mal e do sofrimento do inocente? Há outras palavras que podem ser colocadas neste quebra-cabeça?


Este problema foi enfrentado por São Paulo, apóstolo, em seu debate com os filósofos gregos de seu tempo. A mensagem cristã era muito simples: Deus veio ao mundo e morreu crucificado. Pior do que isso: Deus foi crucificado num “jogo de empurra” entre judeus e romanos, isto é, diferentemente dos outros deuses, o Deus cristão foi morto não por deuses mais poderosos, mas por homens. Sendo Deus, jamais poderia ser morto por mãos humanas, e sendo o Deus onipotente, jamais poderia nem mesmo ser morto. Paulo, apóstolo, estava, portanto, diante de um dilema semelhante ao proposto por Epicuro: Deus era uma impossibilidade filosófica.


Foi então que os apóstolos surgiram com uma resposta tão genial que os cristãos acreditamos que foi soprada pelo Espírito Santo: antes de vir ao mundo ao encontro dos homens, Deus se esvaziou da sua onipotência[i], isto é, abriu mão do exercício de sua onipotência, e por amor[ii], deixou-se matar por eles[iii]. (Eu disse que “Deus abriu mão do exercício de sua onipotência”, bem diferente de “Deus abriu mão de sua onipotência”).


O apóstolo Paulo admitia que não era possível pensar em Deus sem considerar o binômio bondade/onipotência. Optou pela palavra amor, assim como o apóstolo João, que afirmou “Deus é amor”[iv]. Jesus de Nazaré foi Deus encarnado na forma de Amor, e não Deus encarnado na forma de Onipotência.


Isso faz todo o sentido. Um Deus que viesse ao encontro das pessoas em trajes onipotentes chegaria para se impor e reivindicar obediência irrestrita, impressionando pela sua majestade e força sem iguais. Jung Mo Sung adverte que “a contrapartida do poder é a obediência, enquanto a contrapartida do amor é a liberdade”. Também assim pensou o apóstolo Paulo, ao afirmar que o que constrange as pessoas a viver para Deus é o amor de Deus (demonstrado na morte de Jesus na cruz)[v], e nunca o poder de Deus.


Na verdade, “Deus não tinha escolha”. Ao decidir criar o ser humano à sua imagem e semelhança, deveria criá-lo livre. Desejando um relacionamento com o ser humano, deveria dar ao ser humano a liberdade de responder voluntariamente ao seu amor, sob pena de ser um tirano que arrasta para sua alcova uma donzela contrariada. Somente o amor resolveria esta equação, pois somente o amor dá liberdade para que o outro seja livre, inclusive para rejeitar o amor que se lhe quer dar.


André Comte-Sponville é um ateu confesso (sei que vou levar pedradas) que discorre a respeito do amor divino como poucos que já li. Acredita que o amor divino é um ato de diminuição, uma fraqueza, uma renúncia. Usa os argumentos de Simone Weil: “a criação é da parte de Deus um ato não de expansão de si, mas de retirada, de renúncia. Deus e todas as criaturas é menos do que Deus sozinho. Deus aceitou essa diminuição. Esvaziou de si uma parte do ser. Esvaziou-se já nesse ato de sua divindade. É por isso que João diz que o Cordeiro foi degolado já na constituição do mundo. Deus permitiu que existissem coisas diferentes Dele e valendo infinitamente menos que Ele. Pelo ato criador negou a si mesmo, como Cristo nos prescreveu nos negarmos a nós mesmos. Deus negou-se em nosso favor para nos dar a possibilidade de nos negar por Ele. As religiões que conceberam essa renúncia, essa distância voluntária, esse apagamento voluntário de Deus, sua ausência aparente e sua presença secreta aqui embaixo, essas religiões são a verdadeira religião, a tradução em diferentes línguas da grande Revelação. As religiões que representam a divindade como comandando em toda parte onde tenha o poder de fazê-lo são falsas. Mesmo que monoteístas, são idólatras” [vi].


Você já imagina onde quero chegar. Isso mesmo, entre a onipotência e a bondade de Deus existe a liberdade do homem, e o compromisso de Deus em respeitar esta liberdade. Isso ajuda a entender porque existe tanto sofrimento no mundo. O mal não procede de Deus e não é promovido ou determinado por Deus. O mal é conseqüência inevitável da liberdade humana, que teima em dar as costas para Deus e tentar fazer o mundo acontecer à sua própria maneira. Diante do mal e do sofrimento, o Deus com os homens, encarnado em Amor, também sofre, se compadece, tem suas entranhas movidas de compaixão[vii].


Mas você poderia perguntar por que razão Deus não acaba com o mal. Isso é simples: Deus não acaba com o mal porque o mal não existe, o que existe é o malvado. O mal não é uma entidade ao lado de Deus. O mal é o resultado de uma ação humana em afastar-se do Deus, sumo bem. O monoteísmo cristão afirma que há um só Deus, e que o mal é a privação da presença de Deus. Os cristãos não somos dualistas que postulamos a existência do bem e do mal. O mal é apenas a ausência do bem. Por isso, o mal não existe, o que existe é o malvado, aquele que faz surgir o mal porque se afasta de Deus, o supremo e único bem.


Ariovaldo Ramos me ensinou assim, e completou dizendo que “para acabar com o mal, Deus teria que acabar com o malvado”. Mas, sendo amor, entre acabar com o malvado e redimir o malvado, Deus escolheu sofrer enquanto redime, para não negar a si mesmo destruindo o objeto do seu amor. Por esta razão Deus “se diminui”, esvazia-se de sua onipotência, abre mão de se relacionar em termos de onipotência-obediência, e se relaciona com a humanidade com base no amor, fazendo nascer o sol sobre justos e injustos[viii], e mostrando sua bondade, dando chuva do céu e colheitas no tempo certo, concedendo sustento com fartura e um coração cheio de alegria a todos os homens[ix].


É uma pena que Epicuro não tenha lido os apóstolos cristãos, não tenha corrido no parque ao lado de Ricardo Gondim, não tenha ouvido Ariovaldo Ramos pregar, e nem tenha assistido às aulas de Jung Mo Sung.


Referências: [i] Carta aos Filipenses 2.6-8[ii] Evangelho de João 3.16[iii] Atos dos Apóstolos 2.23[iv] Primeira Carta de João 4.7[v] 2Coríntios 5.14,15[vi] Comte-Sponville, André, Pequeno tratado das grandes virtudes, São Paulo: Martins Fontes, 1995, Capítulo 18: Amor.[vii] Evangelho de São Mateus 9.36; 14.14[viii] Evangelho de São Mateus 5.44,45[ix] Atos dos Apóstolos 14.17
Ed René Kivitz.
Fonte - Disponível em: <http://www.ricardogondim.com.br/Artigos/artigos.info.asp?tp=69&sg=0&id=1310>. Acesso dia 11 de novembro de 2008.



Não quero ser apóstolo !

Os pastores possuem um fino senso de humor. Muitas vezes, reúnem-se e contam casos folclóricos, descrevem tipos pitorescos e narram suas próprias gafes. Riem de si mesmos e procuram extravasar na gargalhada as tensões que pesam sobre os seus ombros. Ultimamente, fazem-se piadas dos títulos que os líderes estão conferindo a si próprios. É que está havendo uma certa, digamos, volúpia em pastores se promoverem a bispos e apóstolos. Numa reunião, diz a anedota, um perguntou ao outro: “Você já é apóstolo?” O outro teria respondido: “Não, e nem quero. Meu desejo agora é ser semi-deus”. Apóstolo agora está virando arroz de festa e meu ministério é tão especial que somente este título cabe a mim”. Um outro chiste que corre entre os pastores é que se no livro do Apocalipse o anjo da igreja é um pastor, logo, aquele que desenvolve um ministério apostólico seria um “arcanjo”.

Já decidi! Não quero ser apóstolo! O pouco que conheço sobre mim mesmo faz-me admitir, sem falsa humildade, que não eu teria condições espirituais de ser um deles. Além disso, não quero que minha ambição por sucesso ou prestígio, que é pecado, se transforme em choça.
Admito que os apóstolos constam entre os cinco ministérios locais descritos pelo apóstolo Paulo em Efésios 4.11. Não há como negar que os apóstolos foram estabelecidos por Deus em primeiro lugar, antes dos profetas, mestres, operadores de milagres, dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas. Mas, resigno-me contente à minha simples posição de pastor. Já que nem todos são apóstolos, nem todos profetas, nem todos mestres ou operadores de milagres, como consta na epístola aos Coríntios 12.29, parece não haver demérito em ser um mero obreiro.
Meus parcos conhecimentos do grego não me permitem grandes aventuras léxicas. Mas qualquer dicionário teológico serve para ajudar a entender o sentido neotestamentário do verbete “apóstolo” ou “apostolado”. Usemos a Enciclopédia Histórico-Teológico da Igreja Cristã, das Edições Vida Nova: “O uso bíblico do termo “apóstolo” é quase inteiramente limitado ao NT, onde ocorre setenta e nove vezes; dez vezes nos evangelhos, vinte e oito em Atos, trinta e oito nas epístolas e três no Apocalipse. Nossa palavra em Português, é uma transliteração da palavra grega apostolos, que é derivada de apostellein, enviar. Embora várias palavras com o significado de enviar sejam usadas no NT, expressando idéias como despachar, soltar, ou mandar embora, apostellein enfatiza os elementos da comissão – a autoridade de quem envia e a responsabilidade diante deste. Portanto, a rigor, um apóstolo é alguém enviado numa missão específica, na qual age com plena autoridade em favor de quem o enviou, e que presta contas a este”.
Jesus foi chamado de apóstolo em Hebreus 3.1. Ele falava os oráculos de Deus. Os doze discípulos mais próximos de Jesus, também receberam esse título. O número de apóstolos parecia fixo, porque fazia um paralelismo com as doze tribos de Israel. Jesus se referia a apenas doze tronos na era vindoura (Mateus 19.28; cf Ap 21.14). Depois da queda de Judas, e para que se cumprisse uma profecia, ao que parece, a igreja sentiu-se obrigada, no primeiro capítulo de Atos, a preencher esse número. Mas na história da igreja, não se tem conhecimento de esforços para selecionar novos apóstolos para suceder àqueles que morreram (Atos12.2). As exigências para que alguém se qualificasse ao apostolado, com o passar do tempo, não podiam mais se cumprir: “É necessário, pois, que, dos homens que nos acompanharam todo o tempo que o Senhor Jesus andou entre nós, começando no batismo de João, até ao dia em que dentre nós foi levado às alturas, um destes se torne testemunha conosco da sua ressurreição” (Atos 2.21-22).
Portanto, alguns dos melhores exegetas do Novo Testamento concordam que as listas ministeriais de I Coríntios 12 e Efésios 4 referem-se exclusivamente aos primeiros e não a novos apóstolo.
Há, entretanto, a peculiaridade do apostolado de Paulo. Uma exceção que confirma a regra. Na defesa de seu apostolado em I Coríntios 15.9, ele afirmou que foi testemunha da ressurreição (vira o Senhor na estrada de Damasco), mas reconhecia que era um abortivo (nascido fora de tempo). “Porque sou o menor dos apóstolos, que mesmo não sou digno de ser chamado apóstolo, pois persegui a igreja de Deus” (15.10). O testemunho de mais de dois mil anos de história é que os apóstolos foram somente aqueles doze homens que andaram com Jesus e foram comissionados por ele para serem as colunas da igreja, comunidade espiritual de Deus.
O que preocupa nos apóstolos pós-modernos é ainda mais grave. Tem a ver com a nossa natureza que cobiça o poder, que se encanta com títulos e que fez do sucesso uma filosofia ministerial. Há uma corrida frenética acontecendo nas igrejas de quem é o maior, quem está na vanguarda da revelação do Espírito Santo e quem ostenta a unção mais eficaz. Tanto que os que se afoitam ao título de apóstolo são os líderes de ministérios de grande visibilidade e que conseguem mobilizar enormes multidões. Possuem um perfil carismático, sabem lidar com massas e, infelizmente, são ricos.
Não quero ser um apóstolo porque não desejo a vanguarda da revelação. Desejo ser fiel ao leito principal do cristianismo histórico. Não quero uma nova revelação que tenha sido desapercebida de Paulo, Pedro, Tiago ou Judas. Não quero ser apóstolo porque não quero me distanciar dos pastores simples, dos missionários sem glamour, das mulheres que oram nos círculos de oração e dos santos homens que me precederam e que não conheceram as tentações dos mega eventos, do culto espetáculo e da vã-glória da fama. Não quero ser apóstolo, porque não acho que precisemos de títulos para fazer a obra de Deus, especialmente quando eles nos conferem estatus. Aliás, estou disposto, inclusive a abrir mão de ser chamado, pastor, se isso representar uma graduação e não uma vocação ao serviço.
Não desdenho as pessoas, sinto apenas um enorme pesar em perceber que a ambiência evangélica conspira para que homens de Deus sintam-se tão atraídos a ostentação de títulos, cargos e posições. Embriagados com a exuberância de suas próprias palavras, crentes que são especiais, aceitam os aplausos que vêm dos homens e se esquecem que não foi esse o espírito que norteou o ministério de Jesus de Nazaré.
Ele nos ensinou a não cobiçar títulos e a não aceitar as lisonjas humanas. Quando um jovem rico o saudou com um “Bom Mestre”, rejeitou a interpelação: “Porque me chamas bom? Ninguém é bom senão um, que é Deus” (Mc 10.17-18). A mãe de Tiago e João pediu um lugar especial para os seus filhos. Jesus aproveitou o mal estar causado, para ensinar: “Sabeis que os governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade sobre eles. Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo; tal como o Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos” (Mateus 20.25-28).
Os pastores estão se esquecendo do principal. Não fomos chamados para termos ministérios bem sucedidos, mas para continuarmos o ministério de Jesus, amigo dos pecadores, compassivo com os pobres e identificado com as dores das viúvas e dos órfãos. Ser pastor não é acumular conquistas acadêmicas, não é conhecer políticos poderosos, não é ser um gerente de grandes empresas religiosas, não é pertencer aos altos graus das hierarquias religiosas. Pastorear é conhecer e vivenciar a intimidade de Deus com integridade. Pastorear é caminhar ao lado da família que acaba de enterrar um filho prematuramente e que precisa experimentar o consolo do Espírito Santo. Pastorear é ser fiel à todo o conselho de Deus; é ensinar ao povo a meditar na Palavra de Deus. Ser pastor é amar os perdidos com o mesmo amor com que Deus os ama.
Pastores, não queiram ser apóstolos, mas busquem o secreto da oração. Não ambicionem ter mega igrejas, busquem ser achados despenseiros fieis dos mistérios de Deus. Não se encantem com o brilho deste mundo, busquem ser apenas serviçais. Não alicercem seus ministérios sobre o ineditismo, busquem manejar bem a palavra da verdade; aquela mesma que Timóteo ouviu de Paulo e que deveria transmitir a homens fieis e idôneos que por sua vez instruiriam a outros. Pastores, não permitam que os seus cultos se transformem em shows. Não alimentem a natureza terrena e pecaminosa das pessoas, preguem a mensagem do Calvário.
Santo Agostinho afirmou: “O orgulho transformou anjos em demônios”. Se quisermos nos parecer com Jesus, sigamos o conselho de Paulo aos filipenses: “Tende o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz” (2.5-8).
Soli Deo Gloria
Ricardo Gondim Rodrigues.
Fonte - Disponível em: <http://www.ricardogondim.com.br/Artigos/artigos.info.asp?tp=61&sg=0&id=352>. Acesso dia 11 de novembro de 2008.


CAÓTICA, SEM FORMA E EM CRISE

Lembro-me das primeiras aulas de hebraico tentando ler Gênesis 1.2: “a terra estava sem forma e vazia”, e o professor nos ensinando a expressar de forma bem gutural as palavras “tohu va-bohu”, que significam: um amontoado caótico de trevas aterrorizantes.

Segundo os teólogos que defendem a “Teoria da Lacuna” teria ocorrido uma catástrofe cósmica entre o verso 1 e 2 de Gênesis, e uma antiga criação que abrigou uma raça pré-adâmica e também os dinossauros foi destruída pelo juízo divino há milhões de anos. E o que restou foi o caos.

Há algo em nosso ser interior muito próximo disso. Somos seres fragmentados, desconhecidos para nós mesmos, buscando ordenar nossa confusão interna. E o mesmo Senhor que pôs em ordem o cosmos com sua palavra e vontade deseja reorientar o interior do homem. É possível ver este desejo divino em prática quando Paulo diz que Deus nos “libertou do império das trevas e nos transportou para o reino do seu Filho” (Cl 1.13). Enquanto o império das trevas cósmico recebeu a ordem divina: “haja luz”, e houve luz, o reino humano foi irradiado pela presença de Cristo, e nas regiões dominadas pelas sombras brilhou a Luz de Sua Presença entre nós.

Desde o princípio o homem sofre de delírios de grandeza e por isso busca encontrar segurança nas suas realizações. A primeira grande tentativa da humanidade de realizar-se foi erigir uma torre para chegar ao céu, e gravar seu nome ali. De igual modo, a partir da Idade Média também passamos a construir templos monumentais e catedrais, procurando através deles “tocar o céu”, inspirar segurança e passar solidez aos seus freqüentadores.

Hoje, não contentes com o “poder eclesial” este mesmo homem busca também o “poder político”. O maior grupo neopentecostal do Brasil já tem o seu partido (PRB), e agora, a mais tradicional igreja pentecostal foi picada pela “mosca azul” e está montando também uma agremiação – o PRC – para entrar na política partidária. É o ovo da serpente sendo chocado: sabemos que em algum momento da História, a besta que emerge da terra (sistema religioso) juntará suas forças à besta que emerge do mar (poder político) para sua derradeira investida.

Se houve um juízo divino sobre o faraó do Egito e seu povo, se houve sobre os construtores da torre de Babel, se os filisteus sofreram terríveis conseqüências por terem se apossado da arca, se a terra engoliu os adoradores do bezerro de ouro e se o rei Herodes foi comido por vermes na frente de uma multidão por não ter dado glórias a Deus (At 12.23) não viria um juízo também sobre esta geração?

Deus é paciencioso e suporta longamente a perversidade dos que se desviam, mas Ele avisa: “Dei-lhe tempo para que se arrependesse”. Porém, a loucura e a bazófia dos homens tem subido até os céus.

Vivemos a mercantilização da vida onde tudo tem seu preço: valorizamos o que tem utilidade imediata para nós, inclusive gente, e quando não tem mais, a ordem é: jogue fora, e esqueça. Na atividade econômica trabalhadores precisam atingir as metas traçadas por acionistas ávidos de lucros – senão todos perdem o emprego. Mas que ninguém se escandalize, pois isso já é normal nos grandes conglomerados da fé: pastores também têm de atingir suas metas – de valores, diga-se de passagem – e não de amor, visitação, cuidado ou pastoreio. É a mercantilização da fé onde “deus” nada mais é que um sujeito obcecado por dinheiro, e que só sabe falar money, money, money....

Ao contrário do que muitos imaginam, o juízo não começará pelos ímpios, porém, “o julgamento começa pela casa de Deus” (1Pe 4.17). Compreendo agora quando Salomão diz que “se o justo é punido na terra, quanto mais o perverso e pecador” (Pv11.31).

A palavra grega que expressa juízo é “krisis”. Não significa necessariamente condenação, podendo até mesmo ser uma oportunidade para decisão, porém será sempre dolorosa. Para os médicos da Antiga Grécia a palavra “krisis” tinha um especial significado: quando o doente depois de medicado entrava em “crise”, era sinal de que haveria um desfecho: a cura ou a morte.

O Juízo e sua crise estão aí por toda a parte. Vidas tresloucadas, destroçadas, amarguradas. Mas João Batista adverte que a única coisa que pode nos livrar do juízo divino é o arrependimento e a conversão.

Não sei quanto a você, mas algo me diz que estes últimos acontecimentos que abalaram o mundo irão se aprofundar ainda mais para todas as áreas da vida. A humanidade se encontra sob a ira divina, pois “todo aquele que se mantém rebelde contra o Filho... sobre ele permanece a ira de Deus” (João 3.36). Ou seja, o único que pode impedir a ira do Eterno é Jesus. Vamos ouvir mais o que Ele tem a nos dizer, vamos praticar mais as Suas Verdades, e permitir que Ele controle o nosso ser cansado, afinal o Juízo divino já está entre nós e horrível coisa é cair nas mãos do Deus vivo (Hb 10.31).


Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

O Deus que ama "Agapao"

Nada que nós fazemos ou deixamos de fazer diminuirá o amor de Deus por cada um de nós. Tudo o que estipulamos com a pretensão de absoluto, são meramente estruturas "funcionais" [será mesmo que funcionam!?] humanas, e definimos como sendo critérios para que Deus faça isso ou aquilo por nós, é uma tentativa inconsciente, ou não, de reduzir o amor de Deus por toda oikoumene - casa habitada, à aspectos e vontades humanas.
O amor de Deus por toda criação é "Agapao", um amor que "é" e não "está", dependendo "de" [...]. Não implica condicionantes. Deus não estabelece aliança mediante "essa" ou "aquela" condicional.


O querido leitor poderia dizer, mas e a justiça de Deus? E as observâncias judaicas acerca da aliança de Deus com seu povo eleito? Justiça de Deus é "Tsedaká", não é para condenação, antes, para rcuperação. Deus atua com justiça sempre em favor da segunda chance para o indivíduo, nunca dafavorável à vida. Jesus veio nos mostrar a lógica real do Reino de Deus. E uma observação: nós não imitamos Jesus, isso poderia ser frustrante por demais [você já conseguiu?], nós apreendemos Jesus por processo de assimilação - isso é saudável. A lógica do Reino, que até então parece não ter sido bem assimilada pelo "povo", é a de amar a Deus sobre todas as coisas, inclusive dogmas, e ao próximo como a ti mesmo. Muitos/as, enganados/as, acabam idolatrando os dogmas e as doutrinas da instituição, se esquecem da lei maior do criador que é favorável a vida, e a vida em abundância.


Muitos se lançam a uma leitura um tanto fundamentalista dos textos bíblicos, e acabam em algum momento se vendo contrariados, resta-lhes apelar para o argumento de que: "em algumas partes ela é querimática", ou interpretativa. Eu pergunto quais os critérios para dizer o que é e o que não é querigmático? Não são os próprios critérios, leituras humanas ideologicamente contaminadas por crenças, contexto e tantas outras coisas?


Uma das formas mais equilibrada de se entender e conviver de forma harmoniosa com o Deus que ama "Agapao" e sua palavra que é viva e eficaz é mediante a lógica do amor. Só assim venceremos as contradições da vida, em fé, esperança e amor; da maneira mais salutar possível.


Abraços amigos.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Reformar e Revolucionar X Escatologia e Apocalíptica ((?))

Em diálogo com "A Reforma é Anti-bíblica" postado por Roger no site "Teologia Livre"/ [http://teologialivre.blogspot.com"].


Não podemos falar numa suposta "revolução", ou total transformação radical de qualquer coisa que seja, sem antes considerarmos a "reforma" dessa mesma coisa. Na minha opinião, "revolução" deve ser precedida por "reforma", caso contrário, num dado momento ela se torna estéril e irrelevantemente violência, e nada mais que isso: Incapaz de gerar bons frutos. O mesmo acontece se "reformamos" sem pensar em "revolução" - ou subversão do "normismo" - da "nomia viciada" - imposta pelo braço dominador. Tão estéril quanto.
Tenho trabalhado com a tese de que os dois conceitos: "reforma" e "revolução", devem ser trabalhados juntos e sempre nessa ordem: de forma tal que a "reforma" preceda a "revolução".
Reforma pressupõe o "não ignorar o passado", a história, e um olhar constante para o presente. É um olhar para o passado onde cabe relembrar "aquilo que pode gerar esperança". Em termos de "conservar", a reforma não torna o "feito até agora", de tudo, "uma perda de tempo". "Revolução", diferentemente de "reforma", rompe com "o feito até agora", e quase pressupõe que tudo instituído até então não passou de um grande erro. Nesses termos, revolução fala de futuro, e o que passa a ser "o determinante" reside no "daqui por diante". Por isso é fundamental Reformar sim, porém, nunca sem esquecer o dever que temos enquanto Igreja de Cristo e voz profrética à nação, de revolucionar.
E a Bíblia, tem um posicionamento sobre isso? Sim, eu diria. O povo semita, resolve os seus problemas relembrando a ação de Deus no passado. Essa é a esperança do povo de Israel quando em cativeiro, e em vários outros momentos de sua história nas narrativas bíblicas - relembrar dos feitos de Javé para ter esperança de que sua Tsedaká (justiça) não tardará. Nessa mesma lógica está a fórmula de invocação do povo semita ao: "Deus de Abraão, Deus de Isaque e Deus de Jacó".

Mas, e no Novo Testamento? Talvez, aqui sim, encontremos uma lógica mais "revolucionária", com movimentos que indiquem uma certa orientação para o futuro. Fruto do helenismo, das influências gnósticas do final do I século, dentre outros. E Jesus? Jesus foi um "reformador revolucionário" ! Acho que não preciso discorrer com maior detalhe sobre as obras de Jesus, bem como em que contexto histórico se deu o ministério do nazareno - fundamental para sentendermos as "questões" de Jesus com os fariseus por exemplo. Jesus não rompeu com o judeu-fariseu, nem muito menos com a cultura semita em si, ele é crítico severo da salvação condicionada à observância da lei farisaica, "(des)-orientados" pela lei de moisés ["Judaísmo formativo" + Ralaká + Ragadá] = Uma lei que é atraente mas que gera a exclusão da sinagoga, e conseqüentemente miséria para o excluído (a sinagoga possuía poderes econômicos e políticos, além de gozar do reconhecimento romano de "religião lícita" - ser excluído da sinagoga significava estar condicionado às margens). São coisas diferentes: Jesus prega contra a lógica farisaica da observância da lei, mas não rompe com a cultura de sua época, a não ser quando pensamos na exploração que Roma e seus imperadores impigia no mundo siro-palestinense e mediterrâneo. Nesse sentido sim, Jesus foi um revolucionário que levou às últimas conseqëncias (até á cruz) seu compromisso com o "Reino de Deus".
Eu iria discorrer sobre a "Reforma" enquando estimulada por um ideal-imaginário que abraça a escatologia e por isso não a apocalíptica. E a possível relação que existe entre revolução e ideal-imagináro apocalíptico. Nesse sentido, pensar escatologia seria falar em reforma, e falar em apocalíptica, seria falar em revolução. Mas, por temer ser enfadonho aos caros leitores/as, não o farei agora, quem sabe na próxima postagem.
Existe um ideal? Por isso eu defendo a tese do "casamento" dos dois termos, pois tanto a reforma-escatologia, quanto a revolução-apocalípitca, têm papel fundamental para nossa teologia, para nossas vidas.
Abraços amigo.




















































































domingo, 19 de outubro de 2008

Acordei com vontade de te dizer isso ...

Hoje, o dia amanheceu mais cedofoi mágico olhar em volta e te perceber tão perto – ofegante de sono, de tão dócil inspirava versos.

À você minha esposa, mulher dos meus sonhos e força que me desperta os mais intensos desejos: todo o amor do mundo.

Se eu conseguisse contar acertadamente o quanto de amor que tu mereces, eu o buscaria, ainda que me custasse todo o tempo de minha vida. Não me arrisco contar nem muito menos buscar, porque sei, nem mesmo se eu conseguisse quantificar toda beleza no mundo que exprime a ternura do amor, ainda assim te seria insuficiente, não porque és exigente, mas porque nada nunca será tão profundo quanto o que você significa para mim.

Vou vivendo, vou aprendendo a te dar valor, na esperança de que um dia eu consiga te fazer a mulher mais feliz e realizada do mundo. Não é mera ambição - tolice, mas utopia no sentido mais ingênuo e saudável da palavra – sonhos de um jovem que cresce e ama cada dia que vive ao lado de uma mulher tão especial.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

O ser humano é: essencialmente desejo

Primeiramente um esclarecimento: resolvi publicar o material abaixo por querer elucidar o(a) querido(a) leitor(a) sobre o que pensava Freud e os pensadores que influenciaram suas teorias psicanalíticas. Tenho visitado alguns sites, principalmente em alguns blogs, que falam sobre "repressão sexual na concepção freudiana" sem um mínimo de conhecimento sobre o que ele pensava sobre a temática e a teoria que ele desenvolveu. O texto abaixo não foi citado com a pretesão de abastar o(a) leitor(a), mas acrescentar conteúdo aos que apreciam tal discursão e quem sabe promover reflexão, esse útlimo tem sido um dos meus objetivos mais perseguidos nas publicações presentes nesse blog.

Abraço a todos(as).


A psicanálise

"Os sonhos são uma pintura muda, em que a imaginação a portas fechadas, e às escuras, retrata a vida e a alma de cada um, com as cores das suas ações, dos seus propósitos e dos seus desejos". Padre Vieira, no Sermão de São Francisco Xavier Dormindo

Cabe um esclarecimento inicial ao leitor: procurei montar esta página com o pensamento original de Freud, apesar de estar consciente de que vários dos postulados originais da psicanálise foram revisados e modificados, - vários deles considerados ultrapassados pelo próprio Freud em seus últimos anos. Também não abordarei aqui a doutrina freudiana em toda a sua extensão e implicações. Por isso, aconselho o leitor a procurar um psicanalista licenciado que possa orientá-lo corretamente nessa matéria.

A Psicanálise é ao mesmo tempo um modo particular de tratamento de desequilíbrio mental e uma teoria psicológica que se ocupa dos processos mentais inconscientes; uma teoria da estrutura e funcionamento da mente humana e um método de análise dos motivos do comportamento; uma doutrina filosófica e um método terapêutico de doenças de natureza psicológica supostamente sem motivação orgânica.. Originou-se na prática clínica do médico e fisiologista Josef Breuer, devendo-se a Sigmund Freud (1856-1939) a valorização e aperfeiçoamento da técnica e a formulação dos conceitos nos desdobramentos posteriores do método e da doutrina, o que ele fez valendo-se do pensamento de alguns filósofos e de sua própria experiência profissional.

Sua formulação representou basicamente a consolidação em um corpo doutrinário de conhecimentos existentes, como a estrutura tripartite da mente, suas funções e correspondentes tipos de personalidade, a teoria do inconsciente, o método terapêutico da catarse, e toda a filosofia pessimista da natureza humana difundida à época em que foi concebida. Além de alicerçar-se, como método terapêutico, nas descobertas do médico austríaco Josef Breuer, como doutrina tem em seus fundamentos muito do pensamento filosófico de Platão e do filósofo alemão Arthur Schopenhauer.

No entanto, ao serem esses conhecimentos incorporados na Psicanálise, foi aberto o caminho para um número grande de conceitos subordinados que eram novos, como os de atos sintomáticos, sublimação, perversão, tipos de personalidade, recalque, transferência, narcisismo, projeção, introjeção, etc. A psicanálise constituiu-se, por isso, em um modo novo de abordar as condições psíquicas correspondentes a estados de infelicidade e a comportamentos anti-sociais, e deu nascimento ao tratamento clínico psicológico e psiquiátrico moderno.

A extraordinária popularidade da psicanálise poderá, talvez, ser explicada, em parte, pela sua ousada concepção da motivação humana, ao colocar o sexo, - objeto natural de interesse das pessoas e também sua principal fonte de felicidade -, como único e poderoso móvel do comportamento humano. O mundo civilizado, pouco antes chocado com a tese evolucionista de que o homem descendia dos chimpanzés, já não se surpreendia com a tese de que o sexo dominava o inconsciente e estava subjacente a todos os interesses humanos. A novidade foi recebida com divertido espanto e prazerosa excitação. Em que pese os detalhes picarescos de muitas narrativas clínicas, a abordagem do sexo sob um aspecto científico, em plena era vitoriana, representou uma sublimação (para usar um conceito da própria psicanálise) que permitiu que a sexualidade fosse, sem restrições morais, discutida em todos os ambientes, inclusive nos conventos. Essa permeabilidade subjetiva confundiu-se com profundidade científica, e a teoria foi levada a aplicação em todos os campos das relações sociais, nas artes, na educação, na religião, em análises biográficas, etc. Porém, a questão da motivação sexual foi causa de se afastarem do círculo de Freud aqueles que haviam inicialmente se entusiasmado pela psicanálise como método de análise do inconsciente, entre eles Carl Jung, Otto Rank, e Alfred Adler que decidiram por outras teses, e fundaram suas próprias correntes psicanalíticas. No seu todo, a psicanálise foi fortemente contestada por outras correntes, inclusive a da fenomenologia, a do existencialismo, e a da logoterapia de Viktor Frankl.

O pensamento de Freud está principalmente em três obras: "Interpretação dos Sonhos", a mais conhecida, que publicou, em 1900; "Psicopatologia da Vida Cotidiana", na qual apresenta os primeiros postulados da teoria psicanalítica, publicada em 1901, e "Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade", que contem a exposição básica da sua teoria, de 1905.

Em "Mal Estar na Civilização", publicado em 1930, Freud lança os conceitos de culturas neuróticas, conceitos de projeção, sublimação, regressão e Transferência. Em "Totem e Tabu (1913/14) e "O Futuro de uma Ilusão"(1927) sua posição sobre a religião. Os postulados da teoria são numerosos, e seu exame completo demandaria um espaço muito extenso, motivo porque somente os aspectos usualmente mais expostos da doutrina e do método serão examinados nesta página.

Importância do instinto sexual. Freud notou que na maioria dos pacientes que teve desde o início de sua prática clínica, os distúrbios e queixas de natureza hipocondríaca ou histérica, estavam relacionados a sentimentos reprimidos com origem em experiências sexuais perturbadoras. Assim ele formulou a hipótese de que a ansiedade que se manifestava nos sintomas era conseqüência da energia (libido) ligada à sexualidade; a energia reprimida tinha expressão nos vários sintomas que serviam como um mecanismo de defesa psicológica. Essa força, o instinto sexual, não se apresentava consciente devido à "repressão" tornada também inconsciente; Revelação da "repressão" inconsciente era obtida pelo método da livre associação (inspirado nos atos falhados ou sintomáticos, em substituição à hipnose) e interpretação dos sonhos (conteúdo manifesto e conteúdo latente). O processo sintomático e terapêutico compreendia: experiência emocional - recalque e esquecimento - neurose - análise pela livre associação - recordação - transferência - descarga emocional - cura.

Estrutura tripartite da mente. Freud buscou inspiração na cultura Grega, pois a doutrina platônica com certeza o impressionou em seu curso de Filosofia. As partes da alma de Platão correspondem ao Id, o Superego e o Ego da sua teoria das partes ou órgãos da mente (1923 - "O Ego e o Id").

Id - Freud buscou funções físicas para as partes da mente. O Id, regido pelo "princípio do prazer", tinha a função de descarregar as tensões biológicas. Corresponde à alma concupiscente, do esquema platônico: é a reserva inconsciente dos desejos e impulsos de origem genética e voltados para a preservação e propagação da vida.

O "Ego" lida com a estimulação que vem tanto da própria mente como do mundo exterior. Racionaliza em favor do Id, mas é governado pelo "princípio de realidade". É a parte racional da alma, no esquema platônico. É parte perceptiva e a inteligência que devem, no adulto normal, conduzir todo o comportamento e satisfazer simultaneamente as exigências do Id e do Superego através de compromissos entre essas duas partes, sem que a pessoa se volte excessivamente para os prazeres e sem que, ao contrário, se imponha limitações exageradas à sua espontaneidade e gozo da vida.

O Ego ou o Eu é a consciência, pequena parte da vida psíquica, subtraída aos desejos do Id e à repressão do Superego. Obedece ao principio da realidade, ou seja, á necessidade de encontrar objetos que possam satisfazer ao Id sem transgredir as exigências do Superego.
É parte perceptiva e a inteligência que deve, no adulto normal, conduzir todo o comportamento e satisfazer simultaneamente as exigências do Id e do Superego através de compromissos entre essas duas partes, sem que a pessoa se volte excessivamente para os prazeres e sem que, ao contrário, se imponha limitações exageradas à sua espontaneidade e gozo da vida.

O Ego é pressionado pelos desejos insaciáveis do Id, a severidade repressiva do Superego e os perigos do mundo exterior. Se submete-se ao Id, torna-se imoral e destrutivo; se submete-se ao Superego, enlouquece de desespero, pois viverá numa insatisfação insuportável; se não se submeter á realidade do mundo, será destruído por ele. Por esse motivo, a forma fundamental da existência para o Ego é a angústia existencial. Estamos divididos entre o principio do prazer (que não conhece limites) e o principio de realidade (que nos impõe limites externos e internos). Tem a dupla função de, ao mesmo tempo, recalcar o Id, satisfazendo o Superego, e satisfazer o Id, limitando o poderio do Superego. No indivíduo normal, essa dupla função é cumprida a contento. Nos neuróticos e psicóticos o Ego sucumbe, seja porque o Id ou o Superego sao excessivamente fortes, seja porque o Ego é excessivamente fraco.

O terceiro agente é o "Superego", que é gradualmente formado no "Ego", e se comporta como um vigilante moral. Contem os valores morais e atua como juiz moral. É a parte irascível da alma, a que correspondem os "vigilantes", na teoria platônica.

O Superego, também inconsciente, faz a censura dos impulsos que a sociedade e a cultura proíbem ao Id, impedindo o indivíduo de satisfazer plenamente seus instintos e desejos. É o órgão da repressão, particularmente a repressão sexual. Manifesta-se á consciência indiretamente, sob a forma da moral, como um conjunto de interdições e de deveres, e por meio da educação, pela produção da imagem do "Eu ideal", isto é, da pessoa moral, boa e virtuosa. O Superego ou censura desenvolve-se em um período que Freud designa como período de latência, situado entre os 6 ou 7 anos e o inicio da puberdade ou adolescência. Nesse período, forma-se nossa personalidade moral e social (1923 "O Ego e o Id").

O inconsciente, diz Freud, não é o subconsciente. Este é aquele grau da consciência como consciência passiva e consciência vivida não-reflexiva, podendo tomar-se plenamente consciente. O inconsciente, ao contrário, jamais será consciente diretamente, podendo ser captado apenas indiretamente e por meio de técnicas especiais de interpretação desenvolvidas pela psicanálise.
Atos falhos ou sintomáticos. Os chamados Atos sintomáticos são para Freud evidência da força e individualismo do inconsciente: e sua manifestação é comum nas pessoas sadias. Mostram a luta do consciente com o subconsciente (conteúdo evocável) e o inconsciente (conteúdo não evocável). São os lapsus linguae, popularmente ditos "traição da memória", ou mesmo convicções enganosas e erros que podem ter conseqüências graves.

Motivação. Para explicar o comportamento Freud desenvolve a teoria da motivação sexual (sobrevivência da espécie) e do instinto de conservação (sobrevivência individual). Mas todas as suas colocações giram em torno do sexo. A força que orienta o comportamento estaria no inconsciente e era o instinto sexual;Contribui com uma teoria das fases do desenvolvimento do indivíduo. A pessoa passa por quatro sucessivos tipos de caráter: oral, anal e genital, com regressão e fixação.

Fases do desenvolvimento sexual. Freud descobriu três fases da sexualidade humana que se diferenciam pelos órgãos que sentira prazer e pelos objetos ou seres que dão prazer. Essas fases se desenvolvera entre os primeiros meses de vida e os 5 ou 6 anos, ligadas ao desenvolvimento do Id:

(1) a fase oral, ou fase da libido oral, ou hedonismo bucal, quando o desejo e o prazer localizam-se primordialmente na boca e na ingestão de alimentos e o seio materno, a mamadeira, a chupeta, os dedos são objetos do prazer;

(2) a fase anal, ou fase da libido ou hedonismo anal, quando o desejo e o prazer localizara-se primordialmente nas exercesse e as fezes, brincar com massas e com tintas, amassar barro ou argila, comer coisas cremosas, sujar-se são os objetos do prazer;

(3) e a fase genital ou fase fálica, ou fase da libido ou hedonismo genital: quando o desejo e o prazer localizara-se primordialmente nos órgãos genitais e nas partes do corpo que excitam tais órgãos. Nessa fase, para os meninos, a mae é o objeto do desejo e do prazer; para as meninas, o pai.

Tipos de personalidade. O tipo genital é a pessoa plenamente desenvolvida e equilibrada.
Aqueles que por algum motivo se detém em seu desenvolvimento emocional, se fixam em qualquer uma das três fases transitórias (Freud. 1908), resultando tipos e subtipos de personalidade correspondentes.

O tipo oral: (1) Oral receptivo: pessoa dependente, espera que tudo lhe seja dado, sem qualquer reciprocidade; (2) Oral sadístico, não espera que alguém lhe dê voluntariamente qualquer coisa. Decide-se a empregar a força e a astúcia para conseguir o que deseja. Explorador e agressivo.
Anal sadístico: impulsivamente avaro, sua segurança reside no isolamento. Ordenadas e metódicas, parcimoniosas e obstinadas.

Perversão. Porém, assim como a loucura é a impossibilidade do Ego para realizar sua dupla função, também a sublimação pode não ser alcançada e, era seu lugar, surgir uma perversão social ou coletiva, urna loucura social ou coletiva. O nazismo é um exemplo de perversão, era vez de sublimação. A propaganda, que induz em nós falsos desejos sexuais pela multiplicação das imagens de prazer, é outro exemplo de perversão ou de incapacidade para a sublimação.

Complexos de Édipo. No centro do "Id", determinando toda a vida psíquica, encontra-se o que Freud denominou de complexo de Édipo, isto é, o desejo incestuoso pela mãe, e uma rivalidade com o pai. É esse o desejo fundamental que organiza a totalidade da vida psíquica e determina o sentido de nossas vidas. Freud introduziu o conceito no seu Interpretação dos Sonos (1899). O termo deriva do herói grego Édipo, que, sem saber, matou seu pai e se casou com sua mãe.


Freud atribui o complexo de Édipo as crianças de idade entre 3 e 6 anos. Ele disse que o estágio geralmente terminava quando a criança se identificava com o parente do mesmo sexo e reprimia seus instintos sexuais. Se o relacionamento prévio com os pais fossem relativamente amáveis e não traumáticos, e se a atitude parental não fosse excessivamente proibitiva nem excessivamente estimulante, o estagio seria ultrapassado harmoniosamente. Em presença do trauma, no entanto, ocorre uma neurose infantil que é um importante precursor de reações similares a vida adulta. O Superego, o fator moral que domina a mente consciente do adulto também tem sua parte no processo de gerar o complexo de Édipo.

Freud considerou a reação contra o complexo de Édito o mais importante conquista social da mente humana. Psicanalistas posteriores consideram a descrição de Freud imprecisa, apesar de conter algumas verdades parciais.

Complexo de Eletra. O equivalente feminino do Complexo de Édipo é o Complexo de Eletra, cuja lenda fundamental é a de Electra e seu irmão Orestes, filhos de Agamemnon e Clytemnestra. Eletra ajudou o irmão a matar sua mãe e o amante dela, um tema da tragédia grega abordado, como pequenas variações, por Sófocles, Eurípedes e Esquilo.

Narcisismo. narcisismo, isto é, a bela imagem que possuíamos de n(5s mesmos como seres conscientes racionais e com a qual, durante Séculos, estivemos encantados.

Conta O mito que O jovem Narciso, belíssimo, nunca tinha visto sua própria imagem. Um dia, passeando por um bosque, encontrou um lago. Aproximou-se e viu nas águas um jovem de extraordinária beleza e pelo qual apaixonou-se perdidamente. Desejava que o noutro saísse das águas e viesse ao seu encontro, mas como o outro parecia recusar-se a sair do lago, Narciso mergulhou nas águas, foi ás profundezas á procura do outro que fugia, morrendo afogado.


Narciso morrera de amor por si mesmo, ou melhor, de amor por sua própria imagem ou pela auto-imagem. O narcisismo é o encantamento e a paixão que sentimos por nossa própria imagem ou por nós mesmos, porque não conseguimos diferenciar um do outro.

Mecanismos de defesa são processos subconscientes que permitem a mente encontrar uma solução para conflitos não resolvidos ao nível da consciência. A psicanálise supõe a existência de forças mentais que se opõem umas às outras e que batalham entre si. Freud utilizou a expressão pela primeira vez no seu "As neuroses e psicoses de defesa", de 1894.

Os mecanismos de defesa mais importante são:

Repressão, que é afastar ou recalcar da consciência um afeto, uma idéia ou apelo do instinto. Um acontecimento que por algum motivo envergonha uma pessoa pode ser completamente esquecido e se tornar não evocável.

Defesa de reação. Consiste em ostentar um procedimento e externar sentimentos opostos aos impulsos verdadeiros, quando estes são inconfessáveis. Um pai que é pouco amado, recebe do filho uma atenção por vezes exagerada para que este se convenção de que é um bom filho.
Projeção, consiste em atribuir a outro um desejo próprio, ou atribuir ao outro algo que justifique a própria ação. O estudante cria o hábito de colar nas provas dizendo para se justificar que os outros colam ainda mais que ele.

Regressão é o retorno a atitudes passadas que provaram ser seguras e gratificantes, e às quais a pessoa busca voltar para fugir de um presente angustiante. Devaneios e memórias que se tornam recorrentes, repetitivas.

Substituição. O inconsciente, em suas duas formas, está impedido de manifestar-se diretamente à consciência, mas consegue faze-lo indiretamente. A maneira mais eficaz para essa manifestação é a substituição, isto é, o inconsciente oferece a consciência um substituto aceitável por ela e por meio do qual ela pode satisfazer o Id ou o Superego. Os substitutos são imagens (isto é, representações analógicas dos objetos do desejo) e formam o imaginário psíquico, que, ao ocultar e dissimular o verdadeiro desejo, o satisfaz indiretamente por meio de objetos substitutos (a chupeta e o dedo, para o seio materno; tintas e pintura ou argila e escultura para as fezes, uma pessoa amada no lugar do pai ou da mãe). Além dos substitutos reais (chupeta, argila, pessoa amada), o imaginário inconsciente também oferece outros substitutos, os mais freqüentes sendo os sonhos, os lapsos e os atos falhos. Neles, realizamos desejos inconscientes, de natureza sexual. São a satisfação imaginária do desejo.

Alguém sonha, por exemplo, que sobe uma escada, está num naufrágio ou num incêndio. Na realidade, sonhou com uma relação sexual proibida. Alguém quer dizer uma palavra, esquece-a ou se engana, comete um lapso e diz uma outra que nos surpreende, pois nada terá a ver com aquela que se queria dizer: realizou um desejo proibido. Alguém vai andando por uma rua e, sem querer, torce o pé e quebra o objeto que estava carregando: realizou um desejo proibido.

Sublimação, consistindo em adotar um comportamento ou um interesse que possa enobrecer comportamentos instintivos de raiz Ética é renunciar às gratificações puramente instintuais por outras em conformidade com os valores sociais, como um homem pode encontrar uma válvula para seus impulsos agressivos tornando-se disputador de um prêmio, um jogador de football ou mesmo um cirurgião. Para Freud as obras de arte, as ciências, a religião, a Filosofia, as técnicas e as invenções, as instituições sociais e as ações políticas, a literatura e as obras teatrais (e se ele vivesse hoje diria que também as páginas na Internet) são sublimações, ou modos para a substituição do desejo sexual de seus autores e esta é a razão de existirem os artistas, os místicos, os pensadores, os escritores, cientistas, os líderes políticos, etc.

Esses mecanismos são aprendidos na família ou no meio social externo a que a criança e o adolescente estão expostos. Quando os mecanismos de defesa conseguem controlar as tensões, nenhum sintoma se desenvolve, apesar de que o efeito possa ser limitador das potencialidades do Ego, e empobrecedor da vida instintual. Se o mecanismo falha em eliminar as tensões e se o material reprimido retorna à consciência, o Ego é forçado a multiplicar e intensificar seu esforço defensivo e exagerar o uso dos vários mecanismos. É nestes casos que a loucura, os sintomas neuróticos, são formados. Para a psicanálise, as psicoses significam um severa falência do sistema defensivo, caracterizada também por uma preponderância de mecanismos primitivos. A diferença entre o estado neurótico e o psicótico seria, portanto, quantitativa, e não qualitativa.

Transferência. Freud afirmou que a ligação emocional que o paciente desenvolvia em relação ao analista representava a transferência do relacionamento que o paciente havia tido com seus pais e que o paciente inconscientemente projetava no analista. O impasse que existiu nessa relação infantil criava impasses na terapia, de modo que Freud considerou a solução da transferência o ponto chave para o sucesso do método terapêutico. Embora Freud demorasse a considerar a questão inversa, a da atratividade do paciente sobre o terapeuta, esse problema se manifestou tão cedo quanto ainda ao tempo das experiência de Breuer, que teria se deixado afetar sentimentalmente por sua principal paciente, Bertha Pappenheim.

Os sonhos: conteúdo manifesto e conteúdo latente. (Significados conscientes e subconscientes). A vida psíquica dá sentido e coloração afetivo-sexual a todos os objetos e a todas pessoas que nos rodeiam e entre os quais vivemos. Por isso, sem que saibamos por que desejamos e amamos certas coisas e pessoas odiamos e tememos outras. As coisas e os outros são investidos por nosso inconsciente com cargas afetivas de libido.

É por esse motivo que certas coisas, certos sons, certas cores, certos animais, certas situações nos enchem de pavor, enquanto outras nos enchem de bem-estar, sem que o possamos explicar. A origem das simpatias e antipatias, amores e ódios, medos e prazeres desde a nossa mais tenra infância, era geral nos primeiros meses e anos de nossa vida, quando se formara as relações afetivas fundamenta e o complexo de Édipo.

Essa dimensão imaginária de nossa vida psíquica - substituições, sonhos, lapsos, atos falhos, prazer e desprazer com objetos e pessoas, medo ou bem-estar com objetos ou pessoas indica que os recursos inconscientes para surgir indiretamente á consciência possuem dois níveis: o nível do conteúdo manifesto (escada, mar e incêndio, no sonho; a palavra esquecida e a pronunciada, no lapso; pé torcido ou objeto partido, no ato falho) e o nível do conteúdo latente, que é o conteúdo inconsciente real e oculto (os desejos sexuais).

Nossa vida normal se passa no plano de conteúdos manifestos e, portanto, no imaginário. Somente uma análise psíquica e psicológica desses conteúdos, por meio de técnicas especiais (trazidas pela psicanálise), nos permite decifrar o conteúdo latente que se dissimula sob o conteúdo manifesto.

A psicanálise e a psicologia de Schopenhauer, Brentano e Hartmann

Alguns críticos de Freud dizem que ele não fez muito mais que desenvolver na Psicanálise as idéias que Arthur Schopenhauer colocou em seu livro "O mundo como vontade e representação", como o poder dos complexos com origem na inibição sexual, incesto, fixação materna e complexo de Édipo., a começar pela sua teoria dos instintos, os quais correspondem perfeitamente, na psicologia de Schopenhauer, à Vontade opressora que dirige as ações do homem, e o faz de modo total, não apenas no instinto sexual (Eros) como também no instinto de morte (Tanatus) uma manifestação da mesma Vontade condutora da natureza. O pensamento de Schopenhauer contem aspectos do que Freud desenvolveria mais tarde na Psicanálise: o poder dos complexos com origem na inibição sexual, incesto, fixação materna e complexo de Édipo e inclusive o que veio a ser a teoria fundamental do método da livre associação de idéias utilizado por Freud. O que Schopenhauer escreveu sobre a loucura antecipou a teoria da repressão e a concepção da etiologia das neuroses na teoria da Psicanálise de Freud. E o mais importante, Schopenhauer articula a maior parte da teoria freudiana da sexualidade.

E o mais importante, Schopenhauer articula a maior parte da teoria freudiana da sexualidade O conceito de "Vontade" de Schopenhauer contem também os fundamentos do que viria a ser os conceitos de "inconsciente" e "Id" da doutrina freudiana. A Vontade como coisa absoluta e auto-suficiente, tem ela própria "desejos". Quando se manifesta na forma de uma criatura ela busca se perpetuar por via dos meios de reprodução dessa criatura. Por isso o sexo é básico para a Vontade perpetuar a si própria. Resulta que o impulso sexual é o mais veemente de todos os apetites, o desejo dos desejos, a concentração de toda nossa vontade.

Os críticos consideram impressionante o quanto possivelmente Brentano influenciou a Freud. Este assistiu suas aulas por pelo menos dois anos, e exatamente na época que Brentano publicou seu famoso livro de 1874, no qual seu equacionamento entre o físico e o psíquico, o psicossomático, é mais salientado. O quanto Freud retirou de Schopenhauer foi provavelmente através de Brentano, citado inúmeras vezes no referido livro, no qual Brentano também discute amplamente Karl von Hartman, filósofo alemão, chamado "o filósofo do inconsciente", autor de "A filosofia do inconsciente", de 1983, e o faz precisamente na questão dos estados mentais inconscientes. Brentano gozava de grande popularidade entre os estudantes, entre os quais estavam, além de Sigmund Freud, o psicólogo Carl Stumpf, e o filósofo Edmund Husserl.


Texto na íntegra de: Rubem Queiroz Cobra [Doutor em Geologia e bacharel em Filosofia].
Citação bibliográfica: Cobra, Rubem Q. - A Psicanálise. COBRA PAGES: www.cobra.pages. nom.br, Internet, Brasília, 2003. ("Geocities.com/cobra_pages" é "Mirror Site" de COBRA.PAGES). Disponívem em: <http://www.cobra.pages.nom.br/ecp-psicanalise.html>, acesso dia: 14 de outubro de 2008.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

DEUS: o transcendente em parte revelado



Fico olhando ao meu redor, e encantado, percebendo duas coisas essenciais: a sutileza de cada uma das coisas que carregam as mais singelas expressões de Deus e a transitoriedade da vida.

Não compactuo com as teses panteístas, [panenteístas?] não é sobre isso que eu gostaria de falar. O que eu quero é utilizar-me daquilo que os seres humanos dizem ser Deus, como são frágeis e quase que contraditórias as características sob as quais de alguma forma bricolamos para constituir a "face de Deus". A tentativa de imagetizar é o esforço para a “visualização” do que seria "o verdadeiro Deus". Acho que o denominacionalismo presente hoje caricaturiza bem isso que eu quero dizer. Triste é que Deus fica refém dos pincéis de cada uma das denominações. Cada um(a) pinta Deus nas telas da vida eclesiástica, o que influencia diretamente o cotidiano, de acordo com sua cosmologia por exemplo, contexto ... etc. São tantos os detalhes que tentam aprisionar de alguma maneira a verdadeira fisionomia de Deus ... e Deus vai ficando refém (ou pelo menos pensamos que sim) ... também do humor das pessoas, das filosofias, ideologias pessoais, e coisas assim. Um Deus muito particularizado e personalizado, adequado aos dogmas (desejos) de cada pessoa-instituição.

Em contrapartida, vejo os seres humanos constantemente se surpreendendo emuitos se furstrando. A cada dia que se passa descobrem uma outra característica de Deus, e que quase sempre rompe com a antiga “fisionomia divinizada do Deus pintado” – Deus nos dá a oportunidade, o privilégio, da surpresa. A cada dia Ele mesmo nos mostra o quanto somos pequenos diante de sua criação, diante de sua majestade.

Uns dizem: Deus não existe !! Outros dizem: agora descobrimos Deus !! E outros ainda se denominam: "caçadores de Deus”, e outros mais absolutistas disem que: “Deus é!”, como se já tivessem conquistado "o Deus caçado [dos caçadores de Deus]". Sinceramente não sei mensurar o tamanho do vazio presente em cada uma dessas afirmações. Prefiro ficar com as afirmações de fé da Bíblia: “em parte conhecemos ....”. O Deus que nos surpreende é belo, não se deixa capturar, o Jó da Bíblia aprendeu isso dialogando com Ele, com o transcendente.

Que tal se hoje parássemos para refletir sobre como são frágeis as nossas afirmações, aquelas que absolutizadas acabam por reprimir e construir estruturas tão transitórias e portanto frustrantes - geradoras de esquizofrenia. Talvez refletindo possamos nos tornar mais humanos, responsáveis pelos nossos próprios atos, mais humildes em reconhecer nossas faltas. Erramos tanto quanto qualquer um outro ser humano erra. Deveríamos idolatrar menos “a imagem” do Deus que os humanos criaram em seus processos institucionalizadores, imaginário, nisso consiste o grande pecado. Deveríamos estar abertos ao Deus que é amor e nos chama ao compromisso com a nossa humanidade, ao cuidado com a vida.

Fico pensando o quanto ainda iremos nos surpreender, e outros se frustrar. Que no fim de tudo, ou pelo menos quando ele chegar para cada um de nós (o fim), tenhamos a oportunidade de descansar em paz nos braços desse Deus: infinito e transcendente, ainda em parte revelado, que nos convida à vida eterna, à plenitude dos tempos.

Esse é o meu desejo, mas também não saberia quantificar o tamanho do vazio presente nesse texto, então, o que me resta senão viver. Uns dizem ele se vitimiza e se utiliza da dialética (criada pelo demômio) para as relativizações .. eu diria que não .. eu diria que eu penso sobre cada detalhe, eu vivo os detalhes.

O que me resta? Olhar para trás para viver bem o presente, e lançar-me ao futuro esperançoso de que dias melhores virão ... porque "O que era" (em parte) será plenamente revelado.

Abraços amigos.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008