quinta-feira, 21 de maio de 2009

NÃO É SÓ O DESTINO, É A JORNADA

Não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a que há de vir” (Hb 13.14).

Harley-Davidson é uma motocicleta que evoca sensação de liberdade e prazer aos seus possuidores. Não é incomum vê-los reunidos andando tranquilamente pelas estradas, apreciando a paisagem, parando para descansar, e retomando a viagem, sem pressa. Qual o destino? Não importa, desde que a jornada seja bem aproveitada. Talvez por isso, uma das frases publicitárias mais famosas cunhadas para a marca foi: “Não é o destino, é a jornada”.

Ao contrário dos motociclistas das Harley, o cristão tem um destino. Ele sabe para onde está indo, e um dia deseja lá chegar e reunir-se com todos os que estão a caminho, pois “não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a que há de vir” (Hb 13.14).

Por que a existência de um destino é importante? Porque foi Deus quem pôs a eternidade no coração do homem (Ec 3.11). Na vida, é preciso saber o destino, para onde estou indo, qual é a minha “preocupação última”, pois é ela que determinará as minhas escolhas e minha forma de vida (Paul Tillich).

Entretanto, constato um problema em relação ao cristão: um “harleydavidiano” é um sem-destino que goza tremendamente da jornada, e um cristão é alguém que embora tenha um destino, frequentemente “despreza” a jornada.

Lembro-me da história da mulher que viajava num trem por um deserto árido, e regularmente pegava algumas sementes de um saco e jogava pela janela. Intrigado, um viajante perguntou-lhe o que ela estava fazendo. E ela respondeu: - “essa é uma viagem muito cansativa e a paisagem desoladora; estou jogando sementes de flores e girassóis para que outros, quando aqui passarem possam se alegrar com o a beleza das flores que nascerão”.

Seria muito bom se os cristãos associassem a importância que há em ter um destino, com uma vida que faça a diferença enquanto aqui estiver. Então, para ele, “não seria (somente) o destino, mas também a jornada”. Não é só em Quem eu creio que conta, mas o que eu estou fazendo de minha vida depois que cri.

Constato que muitos que têm como destino o céu se perderam na jornada. Tornaram-se figuras caricatas, entraram em disputas religiosas, perderam o humor, e embora digam que o seu tesouro esteja no céu, vivem para entesourar para “esta” vida. Não parece que estejam andando prazerosamente numa Harley, mas galopando um potro selvagem, tais são suas obsessões e desejos. Sempre absortos demais em si mesmos para prestar atenção em alguém. Preocupados demais com a chegada, tornaram-se egoístas. Exclusivistas, escolhem os companheiros de viagem, e recusam a companhia de quem não possui o mesmo “bilhete” que o seu.

Salvação não é um “bilhete” de chegada, mas é um ponto de partida. Salvação é a oportunidade que Deus me dá de recomeçar a minha existência em novas bases, rever meus conceitos e viver uma nova vida. É o início da renovação do meu ser, até que Cristo seja formado inteiramente em mim.

Francamente falando, nada sei sobre o céu, falo pouco sobre ele, mas a culpa não é minha. A única fonte confiável sobre o assunto é a Bíblia, e Aquele que poderia desvelar os segredos das habitações celestiais preferiu os temas relativos à Terra, como os pássaros, lírios, banquete, criança, amizade, trabalho, perdão, sementes, frutos... e sobre o céu, mesmo, Ele nos deixou apenas sussurros.

O destino pode até ser um lugar geográfico, mas pensa-lo apenas como um "local" pode não ser a melhor definição. Esqueça a visão de um lugar onde você tocará harpas, andando em ruas de ouro e pulando de nuvem em nuvem... mas será a plenitude de Cristo preenchendo o nosso ser, onde Ele será tudo em todos, e o nosso corpo de humilhação será transformado, as lágrimas enxugadas, e o que se partiu unido e restaurado. Não haverá ócio, pois continuaremos a servir a Deus (Ap 22.3).

Mas eu desconfio que quem não soube se portar na jornada vai se decepcionar na chegada.

Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br

terça-feira, 19 de maio de 2009

VAI-TE E NÃO PEQUES MAIS

Reflexão sobre o texto de João 8.1-11
Por Hugo Gonçalves de Freitas*


Que grande pérola de ensinamentos sapienciais Jesus nos deixou nesta narrativa. Aqui estamos longe de abordar todas as perspectivas. Apenas gostaria de observar alguns pontos que me saltaram aos olhos quando tive a alegria de estudar esta passagem das Escrituras Sagradas.

Vemos neste texto Jesus mostrando mais uma vez uma sabedoria sobre-humana, mostrando um plano de vida acima de toda perspectiva. Jesus valoriza a vida sem ofender a lei. Diante de uma mulher acusada pelo seu passado, sentindo todo peso e vergonha da culpa, Jesus mostra o precioso valor da graça.

E como pesa sobre os ombros do homem pecador a culpa de algo feito no passado, seja ele recente ou longínquo. Um homem culpado se torna obcecado pelo seu erro. Nada o faz tirar de sua memória a dolorosa dor que a culpa traz.

E esta mulher não apenas estava sendo culpada pelo seus erros como também já estava julgada e a condenação já lhe era conhecida: morte. Foi aí que me perguntei sobre a real intenção dos escribas e fariseus naquele momento. Se a intenção fosse a de cumprir realmente a lei, esta mulher já estaria morta. Então compreendi que seu real intento era, primeiro, humilhá-la. E hoje em nossos dias podemos também observar que satanás não deseja cumprir a lei. Sua intenção é envergonhar e humilhar àqueles que estão sob o peso da culpa.

Em segundo plano, o objetivo dos acusadores era colocar a graça de Jesus à prova. O que imagino eu deve ter ofendido bastante O Mestre que com toda simplicidade dá às costas para as acusações e como um menino começa a escrever na areia. Depois de haverem insistido é que Jesus se volta para eles e sabiamente desafia-os: “Aquele que dentre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela”. Me maravilho ao perceber que Jesus, em momento algum, nega o pecado da mulher. O Mestre não permite que sua graça seja colocada “em check”. Imagino que se a Igreja de Cristo hoje (eu e você) estivesse no lugar de Jesus a resposta poderia ser diferente. Talvez tentaríamos sonegar a situação de pecado em que a mulher se encontrava. Penso que precisamos aprender com Jesus que a graça de Deus lava o pecado do homem e não esconde o pecado no homem. Não podemos pensar numa graça que esconde, maquia ou disfarça o pecado. A graça livra, liberta, lava e regenera o homem.

Para encerrarmos Jesus não veio condenar o mundo. “Porque Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para que julgasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele.” Jo 3.17. Cristo vem oferecer redenção. Se os representantes da lei, por imperfeitos que eram, não podiam condenar esta mulher, Jesus não o faria por amor.

De forma desafiadora Jesus diz para mulher: Vai-te e não peques mais. Fazendo-a sentir a leveza do fardo de Cristo ao invés do pesado jugo da culpa. Fazendo-a entender que nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus.

E hoje este desafio ainda permanece vivo para mim e para ti: “Nem eu também te condeno; vai-te e não peques mais” .
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Hugo Gonçalves de Freitas é membro da Igreja Metodista em Ponte Alta; Volta Redonda/RJ.

sábado, 16 de maio de 2009

Ananias e Safira: recontando a história, de um jeito diferente !!

Em atos dos apóstolos, capítulo 4.36-5.1-11 [temos uma perícope]. Muito se ouve sobre a história de Ananias e Safira - e mais, sobre a morte certa para quem mente diante do altar de Deus, ou por mentir ao sacerdote [líder], e coisas assim. Confesso que sempre me preocuou determinadas interpretações bíblicas - certas hermenêuticas fatalistas, de uma violência divina que legitima os poderes; que fomenta a morte trazida por Deus como sendo essa juízo e castigo eterno para quem desobedece. A morte é apregoada como sendo em boa hora - do tipo: "Já era tempo!!! Agora sim Deus agiu - bem que eu avisei!!" - e a morte é um fim espetacular em si mesma, passa a ter um enorme proveito - obetivo - "ato castigador de Deus", e só !!

Não devemos perder de vista que "Deus recolhe com prazer os seus santos", mas que em contrapartida, recupera os que estão caminhando em direção à morte existencial, os que buscam com as próprias mãos o vazio. O livro dos Atos fala da tentativa e esforço de Deus: para recuperar; especialmente esse texto que aborda a breve história de Ananias e Safira.

Um olhar exegético mais atento nos faz perceber a intenção dessa perícope que nos conta a história de Ananias e Safira. O livro dos Atos dos Apóstolos fala-nos de uma comunhão restauradora - onde esxiste a partilha, ninguém tem falta de nada. Onde existe a partilha, quando acontece a "reunião de oração", os alicerces da casa se abalam. Porém, quando alguém escolhe sair da comunhão, e mente escondendo o que tem com intenção de acumular, a morte é certa. Sobre isso, o texto nos alerta hoje: contra o egoísmo, a mentira, o acúmulo e a falta de comunhão.

Especialmente, em tempos onde estimula-se o narcisismo, o egocentrismo, e o "reter" para "ser" e parecer (poder dos simulacros), a história bíblica de Ananias e Safira nos faz uma dura crítica. Quando nos dispomos ao isolamento, quando nos posicionamos contrários à comunhão do grupo, estamos buscando, com nossas próprias atitudes a morte diante do altar. Quebra-se a comunhão com o grupo, rompe-se a comunhão de Deus com você e de você com Deus.

Precisamos estar preparados para respondermos diante do altar do Senhor, pois estar diante do altar deve necessariamente significar que estamos em comunhão com o grupo - são coisas indissociáveis.

Abração.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

A MENSAGEM QUE DEVEMOS PREGAR


Por Rev. Antônio Luiz de Freitas*

“Por esta razão, importa que nos apeguemos, com mais firmeza, às verdades ouvidas, para que delas jamais nos desviemos. Se, pois, se tornou firme a palavra falada por meio de anjos, e toda transgressão ou desobediência recebeu justo castigo, como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação? A qual, tendo sido anunciada inicialmente pelo Senhor, foi-nos depois confirmada pelos que a ouviram; dando Deus testemunho juntamente com eles, por sinais, prodígios e vários milagres e por distribuições do Espírito Santo, segundo a sua vontade” (Hebreus 2. 1-4).

Ao ler este texto, ocorre-me a razão pela qual temos encontrado tantos “crentes” fora do foco do genuíno evangelho de Jesus. Creio que jamais, como em nossos dias, tantas coisas têm-se propagado como “verdades”, enquanto a “lei da relatividade” eclipsa aquelas, às quais, deveríamos nos apegar de fato.

A tarefa principal da Igreja é anunciar o Plano de Salvação de Deus, para os seres humanos, através do sacrifício vicário de Jesus Cristo, como único e suficiente, consumado na cruz do Calvário, porém, com o passar do tempo, parece que a Igreja tem “perdido a mira” deste alvo!”. A “velha história” deixou de ser pregada, dando lugar às “estratégias”, que muitas vezes tornam-se em objeto da fé de muitos.

Temos presenciado a pregação de um “evangelho” sem compromisso. É uma enxurrada de pessoas do meio artístico se rotulando de “crentes” mas longe de apresentar os frutos da conversão e do arrependimento, continuando em suas práticas pecaminosas. Ardiloso engano! Não se apegaram com firmeza às verdades do verdadeiro Evangelho que salva e que transforma porque delas nada ouviram. Faltam, em nossas igrejas, crentes como aqueles de Beréia que “mergulhavam” na Palavra, pois hoje, a moda, é “surfar” sobre ela.

Quando abandonamos a essência e focamos mais a aparência, cometemos muitos erros, como, por exemplo, os desvios de doutrina que têm conduzido as pessoas às práticas pagãs; os modismos – ou ondas - que têm “fabricado” os “supercrentes” e a banalização da graça de Deus que tem gerado crentes sem compromisso. Tais práticas nos remetem à tempos que não vão tão longe, cujas práticas que levaram à deflagrar a Reforma Protestantes se identificam com as que têm assediado nossos contemporâneos.

A principal causa da Reforma Protestante foi a venda de indulgências, mas de maneira muito sutil ela ainda está sendo vendida no meio de muitas igrejas que se proclamam evangélicas, sob novas fórmulas: água do Rio Jordão; azeite do Monte das Oliveiras; pedrinhas do Rio Jordão; farinha da prosperidade; rosa do amor; sal do descarrego, etc.

O verdadeiro Evangelho é aquele que confronta o ser humano com o seu pecado em amor, e apresenta Jesus como a única solução. Não há outra maneira nem outras alternativas!
A Igreja do Senhor Jesus não pode ser uma empresa ou mercado onde se negocia com a boa fé das pessoas visando lucros e status aos “ministros do evangelho”. Paulo estava prisioneiro quando escreveu a Timóteo em II Tm 1.8: “Não te envergonhes, ... do seu encarcerado que sou eu”.

Não devemos perder de vista os principais elementos que motivaram a Reforma Protestante:

1- Somente a Graça (Ef 2. 8): A salvação não pode ser comprada. Não há indulgência ou perdão de pecados concedidos pela Igreja que possam abolir o pecado e garantir a salvação e a bênção de Deus, pois, estas são frutos da abundante graça de Deus. Não vêm de nós, é dom de Deus!

2- Somente a Fé: A salvação e as conseqüentes bênçãos de Deus não nos vêm por meio das nossas obras, mas pela fé nos méritos da paixão e morte de Jesus Cristo, através de quem nos tornamos filhos de Deus (Cf. Hb 10. 12-14).

3- Somente as Escrituras (Jo 5. 39): Este princípio, assim como os anteriores, foi muito enfatizado pelo apóstolo Paulo e por Lutero (Cf. II Tm 3. 15). Aprender a Bíblia e permanecer nela mantém nossa saúde espiritual!

QUE O SENHOR TENHA MISERICÓRDIA DE NÓS!
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* Pastor da Igreja Metodista em Santa Cruz. Cidade de Volta Redonda/RJ.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

"deus-água-com-açúcar" ...

Tem muita gente hoje servindo e divulgando um “deus” bricolado, fabricado a partir de uma colher que bate-pra-lá e prá-cá dentro de um copo com água e açúcar. Um "deus" culinariamente produzido - liquidificado. Ele é apático – ausente, e pior: um “deus” que desconhece o pecado humano, que não exorta - portanto não recupera ninguém – tudo está bom como está – e é sempre assim - basta estar como sempre estivemos. Pessoas que se escondem atrás de uma mentira, enganam-se dizendo que só precisam amar – mas é um amor cego e de via única - que não contempla exortação [logicamente entendo exortação como um processo de trazer para perto e não um passe de mágicas, onde alguém que pensa ter razão fere a outra parte], um amor que não contempla o verdadeiro pastoreio.

Não sou favorável ao abuso de poder; não sou favorável ao pastoreio repressor; à conversão imposta mediante técnicas que levam as pessoas ao medo do inferno, ou da punição. Não gosto da imagem do "deus-guerreiro" que derruba os meus inimigos. Não gosto do clima da “Guerra espiritual” dentro da Igreja, aquela "teoria da conspiração", mas a verdade e em contrapartida - é que, hoje, em muitas áreas de nossa vida em comunidade de fé estamos estacionados, estagnados, prostrados diante do “deus-água-com-açúcar”, cantando sempre na mesma cartilha, o mesmo refrão. A mesma dificuldade de liberar perdão, as mesmas ladainhas, as mesmas reclamações diante do Altar. Acho que precisamos guerrear mais contra nossas prostrações, sermos mais loucos e ousados diante dos desafios e demandas que a modernidade nos apresenta [isso é diferente de sermos dementes].

Não podemos subordinar a justiça de Deus ao amor, ambos são atributos inquestionáveis, como desculpa para não ensinar. Não podemos dizer para todos, em todo momento: “tudo está bom assim”. Precisamos confrontar o erro!! Inclusive enfrentarmos os nossos. Os efeitos da teologia do “deus-água-com-açúcar” são calamitosos, pareço ouvir aquele hino, a melodia e a harmonia são as mesmas, mas a letra completamente diferente: “eu venho como estou ... (2x), eu fico como eu vim, eu morro como eu sempre fui ...”. Pastores e pastoras que colocam-se à disposição mordômica desse “deus-modernoso”, acabam não falando mais sobre a necessidade da conversão à Jesus Cristo, sobre a necessidade de mudança de hábitos, sobre os danos que o pecado gera à alma humana. Os sermões não falam mais da necessidade de se voltar para Deus, e assim por diante ..... Tudo parece ser natural demais ... tudo parece ser normal demais.

Parece que nossa mente está sendo cauterizada por tantos modismos, eis mais um, bem diante de nós, visíveis à olho nu: a do “deus-água-com-açúcar”. Precisamos acordar para essa realidade. Isso se queremos ser filhos/as e gerar filhos/as, ou seremos bastardos? geraremos bastardos? [sem correção]. O Amor de Deus [Ágape] admite essa tensão da correção – da prática da justiça - a tensão gerada pela justiça recuperativa de Deus [Tsedaká].

Uma coisa que deve ficar registrado é isso, nossa correção, ou nosso sermão sobre a justiça de Deus, deve ter o intuito de recuperar, sempre!! Isso é o Evangelho das Boas Novas. Deixo aqui o convite: abandonemos o "deus-da-moda", voltemos ao primeiro amor [isso não é regressão] com aquele que nos chamou e nos libertou da escravidão de nossos maus hábitos.

Abraço.

domingo, 10 de maio de 2009

ATAFONA [Parte II]

Quando eu cheguei em Atafona/RJ fiquei fascinado com o fenômeno que é vivo nesse bairro de São João da Barra/RJ. O mar está “invadindo” Atafona: prédios, casas, ruas asfaltadas - tudo está sendo conquistado [depois explico o porquê desse termo] pelo mar.

Em Atafona, as dunas se levantam às alturas dos muros das casas, algumas realmente altas – é muita areia, por toda parte – em franco processo de desertificação [não no sentido literal do termo, mas quando o termo configura um solo que não pode produzir mais nada, uma areia que vem engolindo; além de considerarmos também aqui, especialmente a estética de deserto – talvez por isso, somado à realidade litorânea – é típico - a maior atividade econômica se desenvolve na área da pesca]: um cenário que nos envolve com seus ares escatológico-apocalípticos.

É realmente fantástico [pelo menos para mim – é importante considerarmos também as opiniões de quem mora lá, embora aqui eu não tenha, por enquanto, condições de fazer esse tipo de levantamento qualitativamente e quantitativamente de forma competente] o que acontece. Mas, como registrado anteriormente, não quero falar sobre o que acontece enquanto fenômeno, nem muito menos buscar os porquês que são divisores complexos de opiniões, mas sim fazer uma síntese sobre como esse fenômeno influencia a vida e o imaginário dos moradores desse bairro, turistas, etc.

Na entrada do bairro, uma placa diz algo que significa – sobre o imaginário imperativo – vamos privilegiar o religioso - É mais ou menos assim: “Atafona. A luta entre o Homem, o Rio e o Mar”. Numa outra placa, de uma determinada Igreja, essa mais ao centro do bairro – registra a seguinte frase, mais ou menos assim: “Atafona, o lugar onde o Homem, o rio e a fé se encontram”. Se é marketing fetichizador para atrair turistas, isso não nos importa agora, fato é que, ambas as frases estão carregadas de sentido teológico-religioso.

Considerando a primeira placa [a concepção da prefeitura], existe uma luta acontecendo ali, luta essa que, possivelmente, “o mar” está vencendo. Por isso eu usei o termo “sendo conquistado pelo mar” no início desse texto. Já na segunda placa [uma concepção religiosa], o que acontece é “um encontro”: da natureza com o homem que tem fé - e isso não exclui a possibilidade de que exista uma tensão instalada. Foi muito interessante olhar à beira-praia, onde muitas casas se acumulam em entulhos, e perceber em meio aos “escombros”, uma Igreja pentecostal ativa na comunidade, com suas estruturas preservadas, mas já não tão longe das águas do mar - aparentemente é uma Igreja expressiva.

Como minha passagem pelo bairro muito rápida, o que eu pude fazer foi imaginar muita coisa, aí eu fiquei olhando para essa Igreja pentecostal, imaginando o conteúdo do sermão do domingo à noite dos pregadores dessa Igreja. Qual seria o conteúdo teológico? Subordinado à qual imaginário religioso? Quais os textos bíblicos mais citados, qual livro é o referencial aqui? Não pude deixar de perceber que os textos bíblicos que relatam a volta de Cristo, fim dos tempos, juízo final, pecado e arrependimento, estão literalmente pichados por toda parte onde se percebe o caos da destruição causada pelo mar - escombros.

Isso é muito significativo para pastores/as-teólogos/as e teólogos/as, e/ou simpatizantes, só reforça a tese de que o cotidiano, o contexto forja a teologia, o contexto fornece o texto. O imaginário religioso em Atafona é visivelmente escatológico para alguns e predominantemente apocalíptico para outros. Lembra-nos o valor de estudarmos a teologia a partir da vida, da experiência: as experiências sempre transcendem às teorias.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

A revache dos "Três Porquinhos"


Recebi de um amigo por e-mail, a gravura não é de minha autoria - não sei qum é o/a autor/a.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

EM BUSCA DO EQUILÍBRIO PERDIDO

"Seja a vossa moderação conhecida
de todos os homens” (Fp 4.5)

Excesso de comodismo físico. Excesso de cuidado e prevenção. Excesso de preocupação com a vida e com o futuro. Dor excessiva, tristeza excessiva. Dorme-se demais, assiste-se TV demais, come-se demais.

Falta equilíbrio, falta moderação, e sobra instabilidade. A somatória dos excessos fatalmente leva a um desequilíbrio emocional, à neurose, ao cansaço, ao esgotamento espiritual.

“ - Ó Deus, dai-me estabilidade mental e emocional!”.

Esta oração deveria estar presente nos lábios de cada cristão. Entretanto, raramente ouvimos alguém reconhecer que lhe falta comedimento ou que esteja vivendo alguma instabilidade interior. Mas basta lançar um breve olhar para descobrir que uma destemperança latente habita a alma. Vejamos:

A bíblia orienta para que a nossa “palavra seja sempre agradável, temperada com sal” (Cl 4.6), mas é raro encontrar temperança no que diz respeito à forma e conteúdo de se falar ao outro. Reações desproporcionais e tempestades em copo d’água fazem parte do cotidiano.

“Longe de vós toda ira, gritaria, blasfêmias” (Ef 4.31), ensina o apóstolo Paulo, mas o desregramento e explosões de ira têm sido marca deste tempo.

Jesus veio para salvar o homem do pecado e da morte, e também de seus desequilíbrios. Andas muito preocupado com o dia de amanhã? Olhai os lírios do campo. Estás ansioso com o que haveis de comer e vestir? Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros.

Foi Jesus que vendo os discípulos cansados da missão e sem comer, chamou-os para repousar à parte num lugar deserto (Mc 6.31). Foi Ele que observando a excessiva tristeza de dois de seus pupilos no caminho de Emaús, perguntou-lhes: “que é isto que vos preocupas (Lc 24.17)? Foi Jesus que ordenou a Pedro guardar a espada na bainha, pela reação destemperada que teve diante dos soldados.

Saia dos extremos, abandone os destemperos, e venha para onde Deus quer que você esteja: uma vida centrada em Cristo. É ele que aponta onde exageramos. Não faça nada com raiva. Não tome nenhuma decisão em estado alterado: seja sempre a paz de Cristo o árbitro em vosso coração.

É importante ressalvar que vida cristã saudável e equilibrada nada tem a ver com a eliminação do desejo, como se este, fosse o problema. Não é o modo de vida “zen” do budismo que buscamos. Não é a filosofia do “yin-yang” do Tao que pregamos. Nosso equilíbrio não vem das emanações dos cristais, das propriedades dos florais ou do odor acre dos incensos.

Buscamos uma vida diferente centrada em Cristo, e dominada pelo Espírito Santo. Na fé cristã equilíbrio tem a ver com o “domínio próprio”, resultado do fruto do Espírito Santo agindo em nós. Equilíbrio é não deixar-se dominar pelas reações exageradas, pelos sentimentos explosivos ou de raiva, que todos nós estamos sujeitos. E isso tem a ver com a moderação em relação aos desejos e apetites (e não a supressão que acaba gerando cristãos doentes), tem a ver com a capacidade que o Espírito dá de controlar as paixões.

Há perigo também na falta de equilíbrio na espiritualidade. O desequilíbrio tem afetado o nosso culto a Deus. É quase certo que aquele que não encontrou seu centro emocional, e padece de ausência de comedimento nos relacionamentos, apresentará desequilíbrio espiritual, mesmo porque “vida espiritual” jamais está alienada dos outros aspectos da vivência, como se fosse uma categoria à parte. É triste ver pastores e líderes desfilando seus histrionismos e passando a visão aos seus liderados de que o exagero é normal e que verborragia é obra do Espírito.

Todas as manifestações da vida precisam experimentar uma dose de equilíbrio. Até mesmo aquilo que é virtuoso. Por exemplo: “não sejas demasiadamente justo” (Ec 7.16). E por que? Para que por trás de tua justiça não se esconda perversidade contra o próximo. Não sejas demasiadamente “espiritual” em sua visão de mundo, onde tudo é reduzido a demônios, encostos e potestades. Esta é uma visão deturpada do mundo que Deus criou.

Encontrar o centro significa ouvir a voz de Cristo dentro de si. Quando encontramos Jesus e o ouvimos suavemente falando em nosso coração, encontramos a nós mesmos, e sossegamos o nosso ser cansado. Chega de extremos!

Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br