Diariamente somos surpreendidos com inúmeros encontros. Alguns são fortuitos, efêmeros e passageiros. Estes são logo esquecidos, pois nada têm a nos acrescentar. Todavia, há aqueles que deixam marcas indeléveis na alma e podem afetar de maneira permanente a nossa existência.
Esta é a geração dos encontros parciais e da satisfação momentânea: não é a pessoa inteira que é buscada, gosta-se de um aspecto, de um “pedaço” dela. Não é sem motivo que se enfastia tão rapidamente do outro.
De igual modo muitos passaram por Cristo, tocaram-no, ouviram-no, mas poucos de fato O encontraram. Creio que foi Agostinho quem disse: “Procurei a Deus e não o encontrei, busquei o meu irmão e nós três nos encontramos”. Não é interessante que Jesus ensina aos que desejam a Sua presença, para que reunam “dois ou três” para invocar o Seu nome, e ali Ele estará? (Mt 18.20).
Espiritualidade solitária é a maior falácia que o Diabo colocou na vida do cristão. Diz ele: “separe-se para buscar a Deus”, ou então: “estes irmãos são inadequados para você”.
Não é incomum encontrar pessoas ou grupos cristãos que se tornaram herméticos. Fechar-se é uma maneira de exprimir o medo, pois para haver encontro é preciso abrir, estar pronto a receber, a dar, a ser “modificável”, a influenciar e ser influenciado. Os outros são espelhos em quem refletimos. Deus os colocou em nossas vidas para nos ajudar a entender “quem” somos e “como” somos.
Gostemos ou não a vida, também traz os seus desencontros, pois não somos um rio tranqüilo a correr em seu leito, mas o resultado de forças interiores em constante conflito e atualização. Os que buscam o crescimento deveriam portar um aviso: “Tenham paciência comigo: estou em reforma”.
Na verdade, o desencontro sinaliza que havia um desequilíbrio latente, que não foi observado ou cuidado. Trata-se de uma oportunidade para reorganizar o interior. É por isso que todo re-encontro precisa ser em novas bases, para não incorrer nos mesmos erros do passado.
A Palavra está repleta de encontros e desencontros. Desde cedo ficou clara as incompatibilidades entre Esaú e Jacó, ao ponto de Esaú ter prometido matar o irmão “embrulhão”, que precisou fugir. Entretanto, é um momento muito sublime o reencontro entre eles, quando tudo apontava para um desfecho trágico. Ao avistar Jacó ao longe, ao invés de matá-lo, “Esaú correu-lhe ao encontro e o abraçou: arrojou-se-lhe ao pescoço e o beijou; e choraram” (Gn 33.4).
O casamento de Davi com Mical, por exemplo, foi um constante desencontro – embora privassem do mesmo leito – o que indica que a intimidade física pode ser um dos componentes de um encontro autêntico, mas sozinha não o sustenta (havia claramente um “desencontro” espiritual entre eles).
A fé e a submissão a Cristo que Paulo e Pedro possuíam não foi suficiente para impedir os desencontros na vida dos apóstolos mais importantes do início da Igreja. Embora depois tivessem se apartado, tudo indica que se acertaram, por serem homens movidos pelo Espírito e não pelo ressentimento.
Talvez o desencontro mais exemplar que encontramos no Novo Testamento seja entre Paulo e o jovem João Marcos. Numa viagem missionária este abandonara a missão pela metade, comprometendo o trabalho. Tempos depois Paulo prepara uma segunda viagem. Barnabé chama João Marcos para ir, mas Paulo diz: “não vai não” (At 15.38). Houve, então, uma “tal desavença que vieram a separar-se” (At 15.39). E Paulo parte levando Silas consigo.
Muitos podem imaginar que o posicionamento do apóstolo pudesse levar a um desencontro por toda a vida. Onde encontraremos menção daquele jovem novamente? Cerca de vinte anos depois, ao lado de Paulo, quando, prisioneiro e abandonado por todos, pede para Timóteo lhe trazer João Marcos, “porque me é muito útil para o ministério” (2Tm 4.11). Nenhum desencontro precisa ficar exposto por toda a vida.
A fé em Cristo nos leva ao encontro, entre os diferentes e não apenas entre os iguais, pois em Cristo já não faz mais sentido haver separação entre gregos e judeus, homem e mulher, escravo ou livre, ou qualquer outra forma de distinção.
Mas uma advertência se faz necessária: um encontro genuíno só pode ocorrer entre corações abertos e transparentes como demonstrou o rei Jeú para Jonadabe: “Tens tu sincero o coração para comigo, como o meu o é para contigo? Respondeu Jonadabe: Tenho. Então, se tens, dá-me a mão. Jonadabe deu-lhe a mão; e Jeú fê-lo subir consigo ao carro” (2Rs 10.15).
Possuis o coração sincero e mansidão no olhar? Então venha, e caminhemos juntos.... há muito por fazer.
Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br