domingo, 10 de maio de 2009

ATAFONA [Parte II]

Quando eu cheguei em Atafona/RJ fiquei fascinado com o fenômeno que é vivo nesse bairro de São João da Barra/RJ. O mar está “invadindo” Atafona: prédios, casas, ruas asfaltadas - tudo está sendo conquistado [depois explico o porquê desse termo] pelo mar.

Em Atafona, as dunas se levantam às alturas dos muros das casas, algumas realmente altas – é muita areia, por toda parte – em franco processo de desertificação [não no sentido literal do termo, mas quando o termo configura um solo que não pode produzir mais nada, uma areia que vem engolindo; além de considerarmos também aqui, especialmente a estética de deserto – talvez por isso, somado à realidade litorânea – é típico - a maior atividade econômica se desenvolve na área da pesca]: um cenário que nos envolve com seus ares escatológico-apocalípticos.

É realmente fantástico [pelo menos para mim – é importante considerarmos também as opiniões de quem mora lá, embora aqui eu não tenha, por enquanto, condições de fazer esse tipo de levantamento qualitativamente e quantitativamente de forma competente] o que acontece. Mas, como registrado anteriormente, não quero falar sobre o que acontece enquanto fenômeno, nem muito menos buscar os porquês que são divisores complexos de opiniões, mas sim fazer uma síntese sobre como esse fenômeno influencia a vida e o imaginário dos moradores desse bairro, turistas, etc.

Na entrada do bairro, uma placa diz algo que significa – sobre o imaginário imperativo – vamos privilegiar o religioso - É mais ou menos assim: “Atafona. A luta entre o Homem, o Rio e o Mar”. Numa outra placa, de uma determinada Igreja, essa mais ao centro do bairro – registra a seguinte frase, mais ou menos assim: “Atafona, o lugar onde o Homem, o rio e a fé se encontram”. Se é marketing fetichizador para atrair turistas, isso não nos importa agora, fato é que, ambas as frases estão carregadas de sentido teológico-religioso.

Considerando a primeira placa [a concepção da prefeitura], existe uma luta acontecendo ali, luta essa que, possivelmente, “o mar” está vencendo. Por isso eu usei o termo “sendo conquistado pelo mar” no início desse texto. Já na segunda placa [uma concepção religiosa], o que acontece é “um encontro”: da natureza com o homem que tem fé - e isso não exclui a possibilidade de que exista uma tensão instalada. Foi muito interessante olhar à beira-praia, onde muitas casas se acumulam em entulhos, e perceber em meio aos “escombros”, uma Igreja pentecostal ativa na comunidade, com suas estruturas preservadas, mas já não tão longe das águas do mar - aparentemente é uma Igreja expressiva.

Como minha passagem pelo bairro muito rápida, o que eu pude fazer foi imaginar muita coisa, aí eu fiquei olhando para essa Igreja pentecostal, imaginando o conteúdo do sermão do domingo à noite dos pregadores dessa Igreja. Qual seria o conteúdo teológico? Subordinado à qual imaginário religioso? Quais os textos bíblicos mais citados, qual livro é o referencial aqui? Não pude deixar de perceber que os textos bíblicos que relatam a volta de Cristo, fim dos tempos, juízo final, pecado e arrependimento, estão literalmente pichados por toda parte onde se percebe o caos da destruição causada pelo mar - escombros.

Isso é muito significativo para pastores/as-teólogos/as e teólogos/as, e/ou simpatizantes, só reforça a tese de que o cotidiano, o contexto forja a teologia, o contexto fornece o texto. O imaginário religioso em Atafona é visivelmente escatológico para alguns e predominantemente apocalíptico para outros. Lembra-nos o valor de estudarmos a teologia a partir da vida, da experiência: as experiências sempre transcendem às teorias.