domingo, 25 de setembro de 2011

O Rock In Rio 2011 como uma expressão coletiva do mais variado nível de miséria do povo brasileiro

Não aos crentes, mas aos cristãos e às pessoas de bem do nosso Brasil – [1]
Uma vez que os próprios demônios crêem e tremem (Tg. 2.19b)

Por Pastor Antônio Luiz de Freitas Junior

"E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus" (Rm 12.2)

Como se não bastasse a tanta violência às quais somos submetidos/as no cotidiano, muitas delas televisionadas pro mundo; outras com as quais, infelizmente, surpreendidos, nos encontramos; agora mais essa: o Rio de Janeiro palco desse evento grotesco e maligno; completamente desprovido da Graça de Deus. Porque não dizer, um desrespeito, e uma afronta aos cidadãos de bem do Brasil!


Não me incomoda um monte de levianos, embriagados e atolados em seus muitos vazios, buscar refúgio nesses guetos, e cavernas; era de se esperar que a esses/as fosse destinado o lixo da humanidade, como uma pequena filial que levanta a bandeira da marca de grandes restaurantes requintados que servem hoje alguns de nossos políticos corruptos. No entanto, o que me preocupa é a busca crescente e desenfreada por esses tipos de excrementos, por pessoas que deveriam na verdade lutar contra esse atraso intelectual, cronicamente digressivo.

Deixamos-nos distrair por muito pouco! Sem querer generalizar ...

Enquanto há alunos/as e professores/as, mestres/as e discípulos/as, se privando um/a do/a outro/a, abrindo mão do processo de educar e de serem educados; pais e filhos se matam, pessoas se retaliam; a saúde é precária – o acesso à cultura limitado. A miséria, em suas mais variadas formas, está instalada em todas as instâncias sociais e políticas, e no coração de cada brasileiro/a lamentavelmente como algo comum e rotineiro: Em níveis variados, mas está! Muitos/as estavam lá, no show, diante do palco para esquecer – igual a muitos que “bebem”: para esquecer!

São homens e mulheres domesticados/as que preferem se calar; adolescentes, jovens e adultos que fazem a opção de não encarar os fatos; que se acovardam diante do levante do gigante, na Bíblia chamado de “Golias” (ver 1Sm 17.23), que nesse texto eu chamo de: realidade brasileira – o mesmo que “escravos em cativeiro egípcio” (ver Ex 2.23, 3.10). Enquanto isso, os/as universitários/as que poderiam liderar os progressos, preferem financiar e se abestalhar nas festinhas da faculdade, “apaziguam” seus neurônios em crise com um copo de cerveja e/ou baseado; os fones de ouvidos no volume máximo os faz cantarolar ... “eu sou brasileiro, não desisto nunca”; com os olhos vidrados na nudez de um/a colega de sala – e a vida vai se esvaindo paulatinamente literalmente pelos dedos. Somado a um IDEB (índice do desenvolvimento da educação básica) criado e mascarado pelo próprio governo, ou por entidades e/ou pessoas ligadas ao sistema; tudo parece contribuir para que eu compre os meus ingressos. Tudo é NORMAL, não tem nada a ver mesmo! O cenário está montado para que o show seja “um sucesso”.

Deixamo-nos distrair por muito pouco! Sem querer generalizar ...

Diante do futebol, do samba, do Big Brother, da cerveja, uma mulher ou um homem nu, do Rock in Rio, dentre outros; muitos/as de nós se prostram em sinal de respeito e/ou devoção - reverência. Literalmente paramos nossas vidas quando compramos “os ingressos para esse estilo de vida”, estacionamos e deixamos de progredir, embasbacados/as com a grandeza de uma estrutura favorecedora de morte. É por isso que “assistimos”, com os olhos bem abertos, as constantes falências múltiplas no corpo humano, em nível pessoal e consequenetemente coletivo, ou vice-versa: do pudor, do respeito, da moral e da ética, dos bons costumes, da comunhão. Coisas pequenas diante do sepultamento das famílias, do ensino de qualidade nas Escolas, o declínio constante da Igreja, e a ascensão das mídias áudio-visuais como uma tremenda ferramenta de manutenção desse sistema iníquo; que faz tudo parecer “inerente ao ser sujeito homem ou mulher”, tudo parece ser normal.

O câncer não está só nos detentores do poder do Império que ainda não foi derribado – e nem é uma metástase que começou com esses. Está também no povo simples, e através dele também se propaga; que não faz nada a respeito, não se incomoda mais com os sinais de morte que fadiga e retalia nosso corpo comum, que se alimenta de nós. Prostituimos nossa fé, devemos admitir que ela está abalada e que à colocamos à venda. Adulteramos a ordem original dada por Deus; nos aliançamos com a imoralidade nos muitos motéis da vida, nos “postos de parada, para dar uma relaxada”, abertos com as quinas da modernidade. Na cama e na hidromassagem extasiados, alimentando nossa luxúria e ânsia de consumo, impulsivos, compulsivos, ingênuos/as, contamos nossos segredos à Dalila que nos entregou ao nosso maior inimigo (ver Jz 16.19): o Caos.

Não me desvio do fato já qualificado para todos/as, que muitos que se dizem cristãos, não só buscam esses espaços de presença decaída como fuga de suas frustrações pessoais, e aos shows, e as drogas, como um meio de resignificar suas vidas; mas também a imoralidade como compensação da crise moderna introjetada e assimilada: de angústia, depressão, corrupção, violência, valores empobrecidos, simplismo, anarquismo, individualismo; e o capitalismo com sua lógica de lucro e acúmulo; dentre outros. Os fatores que movem cada pessoa são variados, os motivos nem se fala; mas o palco é sempre o mesmo, e o nome do espetáculo também: assistindo a morte dançar!

Embora nossa história não possa ser descrita e/ou pintada linearmente, pois acontece em processos paralelos, tudo isso que nós vivemos hoje está ligado a um único fio condutor: O afastamento opcional do ser humano de Deus; muitos/as perderam o referencial e decaíram na ordem natural do próprio Criador: “fomos criados à imagem e semelhança de Deus” (Cf.: Gn 1.27; e ver seguintes textos - Rm 1; Gl 5.4; ). Já não é mais “o encantador” que, com uma flauta, domina a serpente do balaio de palha numa feira livre - para chamar a atenção de um grupo de curiosos/as distraídos/as. Entramos no balaio e estamos em transe bem no meio da feira, encantados/as; o animal vem dominando. Somos fregueses da cobra que nos põe para dançar, sermos empurrados pela vida - O bicho sobrepuja o racional, o instinto assassina qualquer capacidade de estabelecermos com um mínimo de coerência o que devemos aceitar e/ou o que devemos rejeitar.

Deixamo-nos distrair pelo Rock In Rio? Sem querer generalizar ...

No primeiro dia [imagine os seguintes com os ânimos alterados], com aproximadamente 100.000 (cem mil) pessoas, enquanto a platéia pedia delirantemente sua anestesia contra a realidade, no palco do Rock In Rio duas mulheres se beijam na boca, para o mundo; outra, com todos os requintes de “mais uma atração internacional”, diga-se lixo importado, se esfrega no “homem-fã” que já está sem camisa; no palco ou na platéia, todos/as se drogando! Quando não com drogas lícitas e/ou ilícitas, com a substância cerebral liberada quando estamos diante do proibido; com adrenalina liberada pelo cérebro despertado pelo poder fascinante do “estou no espetáculo”. Só que esse é a exaltação do banal e do ridículo, acabamos dependentes disso. Depois da ressaca, a chegada do boleto do cartão de crédito, ou quando nos damos conta o quanto gastamos do nosso salário, das perdas na saúde e/ou na família, danos pessoais e/ou coletivos, não é difícil perceber como foi tolo optar por participar de tais ambientes.

Estamos viciados/as, frustrados/as sim, mas querendo saber quando e onde vai acontecer o próximo – descontrolados/as, queremos sempre mais. Não é esse o mesmo comportamento inerente a um bando de cães, alguns bem cuidados outros maltrapilhos, quando sentem de longe que uma cadela entrou no cio? (ver Provérbios 26.11). Ao meu ver, alcançamos nossos limites, para cima e para baixo, só nos resta agora “voltar” dessa overdose, acordar desse sono, e nos orientar para A Luz; porque na Luz não há tropeços (Jo 11.9).

Nós cristãos principalmente, precisamos resgatar o amor por contagiar pessoas pelo bom testemunho, enquanto despenseiros da multiforme graça de Deus (Cf.: 1 Pe 4.10). Especialmente, nesse contexto, entender que há coisas que não convém aos/às filhos/as de Deus (leiam Mt 18.7; 1Co 10.23). Precisamos dar vazão ao Espírito Santo, para que flua em nós e através de nós o genuíno amor de Deus; aí poderemos impactar a vida de pessoas que estão ao nosso redor com as marcas de Cristo (Cf.: Gl 6.17). Precisamos cuidar para que as marcas em nós sejam verdadeiramente conforme as do ministério de Paulo; um missionário plantador de Igrejas que deixou como exemplo as marcas de sujeição à Deus, e do serviço na edificação do Reino (Cf.: Rm 6.12; 1Co 6.20).

Precisamos fazer a diferença (Cf.: Mt 11.12 ): um protesto claro contra o Rock In Rio!

Muitos/as podem rotular o presente texto como “um compêndio de moralismo”, frágil e/ou apologético; ou até mesmo proselitista. Outros/as achá-lo descabido por se tratar de “efeitos” e não de “causas reais” que nos movem à uma diferença efetiva; “uma leitura pessoal pessimista, que surge de uma percepção isolada”; dentre outros.

Sem nenhuma intenção de vitimização, existe hoje, como já foi sinalizado por alguns/mas colegas, uma tendência de sermos contaminados por algumas fobias: “pastor-fobia”, “eclesio-fobia” (ou igreja-fobia), bíblia-fobia [me perdoe tantos neologismos]. O que leva muitos/as a desconsiderarem a razão e a coerência no discurso do Evangelho de Boas Novas apregoado por Jesus Cristo; a esperança possível n’Ele como Único e Eterno salvador de toda vida. O Caminho possível a ser tomado para que possamos anular de fato os sinais de morte, que hoje, e cada vez mais intensamente, afligem a Criação de Deus (ver Gn 1.2; Jo 14.6).

Gostaria de fazer um apelo aos cristãos, e às pessoas de bem. Que lutemos por resgatar a dignidade da vida humana do povo brasileiro. Precisamos deixar de ser contados como mero “ibope” nessas “programações mundanistas” (festas que não só não alimentam a carne, como degenera essa mesma); platéia inerte de uma vida que vai embora ao ritmo dos bumbos da mediocridade. Pode não resolver o todo da discussão em voga, mas é um começo, outras atitudes coerentes serão necessárias; no entanto, subindo um degrau de cada vez, creio que por meio de Jesus Cristo, através d’Ele, poderemos alcançar o topo na escalada.

Precisamos lutar pelo direito comum à vida plena; pela boa, perfeita e agradável vontade de Deus seja manifesta ao mundo. Só é possível quando não há conformação com a realidade, mediante a renovação da nossa mente (Cf.: Rm 12.2). Vamos fazer a diferença quando nos pronunciarmos e reagirmos efetivamente contra o sistema opressor; engajar-nos de fato numa luta favorável à vida abundante (Jo 10.10b), de equidade, para que a manifestação real do amor de Deus, bem como a salvação em Jesus Cristo, seja uma realidade a todos/as.


Pr. Antônio Luiz de Freitas Junior
Pastor da Congregação da Igreja Metodista
Alto Independência - Petrópolis/RJ