“Será, porém, que, se não deres ouvidos à voz do SENHOR,
teu Deus.... O SENHOR te ferirá com loucura, com cegueira
e com perturbação do espírito. Apalparás ao meio-dia,
como o cego apalpa nas trevas, e não prosperarás
nos teus caminhos” (Dt 28.28-29).
teu Deus.... O SENHOR te ferirá com loucura, com cegueira
e com perturbação do espírito. Apalparás ao meio-dia,
como o cego apalpa nas trevas, e não prosperarás
nos teus caminhos” (Dt 28.28-29).
José Saramago escreveu o livro e Fernando Meirelles filmou “Ensaio sobre a Cegueira”. É um filme denso, pesaroso, apocalíptico. Narra a história dos habitantes de uma cidade que desenvolvem uma forma de cegueira contagiosa; eles são, então, confinados numa espécie de campo de concentração para não passarem a doença para o restante da população. Logo, porém, todos perdem a visão, menos a personagem principal.
Instintos primitivos começam então a se manifestar nessa situação extrema: violência, mesquinhez, luxúria, dominação e estupro. Porém, nesse cenário de “juízo final” aflora também o lado humano, solidário e piedoso de alguns.
São as situações limites da vida que mostrarão quem de fato nós somos e quem são aqueles nos rodeiam. Não, não é na missa, no culto, nas festas ou durante os cânticos da igreja que nos é dado a conhecer o irmão e companheiro, mas quando os fundamentos do mundo são implacavelmente sacudidos: máscaras caem, largueza de gestos desaparece, palavras carinhosas tornam-se duras e o sorriso dá lugar a rostos crispados.
É normal desejarmos conviver em meio a uma comunidade onde todos sejam amáveis, solícitos, e prontos a compreender nossas necessidades, mas desconfio seriamente que às vezes Deus nos envia de encontro aos intolerantes, agressivos e estreitos de espírito só para ver como reagimos. Não que o Eterno não saiba o que vai dentro de nós, mas nós não sabemos.
É para o desamparo e solidão que às vezes Deus envia seus filhos queridos, que precisam conhecer o que vai dentro de si. Ezequias era um grande rei, mas não correspondeu aos benefícios que lhe foram feitos e o seu coração se exaltou. Tinha ele riquezas e glória em abundância: “prata, ouro, e toda sorte de objetos desejáveis” (2Cr 32.27). Mas então, quando tudo parecia bem, “Deus o desamparou, para prová-lo e fazê-lo conhecer tudo o que lhe estava no coração” (2Cr 32.31).
No filme, não é o passado das pessoas que conta – o que fizeram, ou a história de cada um – mas o que elas fazem de suas vidas a partir do “Juízo” que se abate sobre elas. De igual modo, o nascimento de Cristo inaugurou o início dos últimos dias, e desde então Sua mensagem continua questionando: - “E agora, o que você vai fazer de sua vida”?
Observe como a maioria das pessoas à sua volta reagem diante do drama da vida humana da qual todos nós somos personagens: continuam presas às futilidades, brigando por bobagens? Ou expressando tolerância, gratidão e bondade?
Diante de acontecimentos últimos, tais como a morte, a tragédia ou guerra, alguns encontram dentro de si uma simplicidade, um amor, e uma grandeza, que agradecemos a Deus por conhecer pessoas assim. Outros, por sua vez, exacerbam e potencializam o mal que habita dentro de si, e é por isso que nas guerras, homens até então pacatos se transformam em impiedosos carniceiros que perderam toda humanidade.
A cegueira está presente por toda a bíblia como uma metáfora da condição humana. Paulo afirma que o deus deste século “cegou” o entendimento dos incrédulos (2Co 4.4). Não por acaso Jesus chama os dirigentes religiosos de sua época de “guias cegos”. É verdade que há uma severa advertência para o líder cego: “ai daquele que fizer tropeçar a um destes meus pequeninos” (Mt 18.6), mas não é menos verdade que nem todos pequeninos são tão inocentes assim. Na vida espiritual não dá para jogar a responsabilidade para outrem: Deus nos concede os instrumentos necessários para discernir e conferir coisas espirituais com espirituais, pondo à prova mensagens, doutrinas e ensinamentos com a Palavra, conferindo supostas revelações e profecias com o discernimento que o Espírito nos confere no íntimo. E toda ovelha está aparelhada para distinguir o lobo do pastor.
São inúmeros os textos que mostram Jesus curando alguns portadores de cegueira. O que há de especial nestes? São cegos que reconheceram sua condição de miséria. Eles não pretendem saber alguma coisa, eles não pretendem guiar a ninguém, sofrem com a escuridão, e desejam abandonar essa situação. Comumente dizemos que o pior cego é aquele que não quer ver. Entretanto há um tipo ainda pior e perigoso: é o cego que pensa ver.
Cegueira é a condição natural da humanidade. Aquilo que meus olhos vêem carrega as deformações das sombras e da penumbra. Somente “na Tua luz veremos a luz” (Sl 36.9).
Faço a Deus minha oração nestas horas crepusculares: “Abre os meus olhos para ver, e mesmo diante do inevitável, da injustiça e das trevas que querem me seduzir, que eu seja bom, solidário, afável e profundamente humano. E quando acordar desta vida, eu me satisfarei com a tua semelhança”.
Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br
Instintos primitivos começam então a se manifestar nessa situação extrema: violência, mesquinhez, luxúria, dominação e estupro. Porém, nesse cenário de “juízo final” aflora também o lado humano, solidário e piedoso de alguns.
São as situações limites da vida que mostrarão quem de fato nós somos e quem são aqueles nos rodeiam. Não, não é na missa, no culto, nas festas ou durante os cânticos da igreja que nos é dado a conhecer o irmão e companheiro, mas quando os fundamentos do mundo são implacavelmente sacudidos: máscaras caem, largueza de gestos desaparece, palavras carinhosas tornam-se duras e o sorriso dá lugar a rostos crispados.
É normal desejarmos conviver em meio a uma comunidade onde todos sejam amáveis, solícitos, e prontos a compreender nossas necessidades, mas desconfio seriamente que às vezes Deus nos envia de encontro aos intolerantes, agressivos e estreitos de espírito só para ver como reagimos. Não que o Eterno não saiba o que vai dentro de nós, mas nós não sabemos.
É para o desamparo e solidão que às vezes Deus envia seus filhos queridos, que precisam conhecer o que vai dentro de si. Ezequias era um grande rei, mas não correspondeu aos benefícios que lhe foram feitos e o seu coração se exaltou. Tinha ele riquezas e glória em abundância: “prata, ouro, e toda sorte de objetos desejáveis” (2Cr 32.27). Mas então, quando tudo parecia bem, “Deus o desamparou, para prová-lo e fazê-lo conhecer tudo o que lhe estava no coração” (2Cr 32.31).
No filme, não é o passado das pessoas que conta – o que fizeram, ou a história de cada um – mas o que elas fazem de suas vidas a partir do “Juízo” que se abate sobre elas. De igual modo, o nascimento de Cristo inaugurou o início dos últimos dias, e desde então Sua mensagem continua questionando: - “E agora, o que você vai fazer de sua vida”?
Observe como a maioria das pessoas à sua volta reagem diante do drama da vida humana da qual todos nós somos personagens: continuam presas às futilidades, brigando por bobagens? Ou expressando tolerância, gratidão e bondade?
Diante de acontecimentos últimos, tais como a morte, a tragédia ou guerra, alguns encontram dentro de si uma simplicidade, um amor, e uma grandeza, que agradecemos a Deus por conhecer pessoas assim. Outros, por sua vez, exacerbam e potencializam o mal que habita dentro de si, e é por isso que nas guerras, homens até então pacatos se transformam em impiedosos carniceiros que perderam toda humanidade.
A cegueira está presente por toda a bíblia como uma metáfora da condição humana. Paulo afirma que o deus deste século “cegou” o entendimento dos incrédulos (2Co 4.4). Não por acaso Jesus chama os dirigentes religiosos de sua época de “guias cegos”. É verdade que há uma severa advertência para o líder cego: “ai daquele que fizer tropeçar a um destes meus pequeninos” (Mt 18.6), mas não é menos verdade que nem todos pequeninos são tão inocentes assim. Na vida espiritual não dá para jogar a responsabilidade para outrem: Deus nos concede os instrumentos necessários para discernir e conferir coisas espirituais com espirituais, pondo à prova mensagens, doutrinas e ensinamentos com a Palavra, conferindo supostas revelações e profecias com o discernimento que o Espírito nos confere no íntimo. E toda ovelha está aparelhada para distinguir o lobo do pastor.
São inúmeros os textos que mostram Jesus curando alguns portadores de cegueira. O que há de especial nestes? São cegos que reconheceram sua condição de miséria. Eles não pretendem saber alguma coisa, eles não pretendem guiar a ninguém, sofrem com a escuridão, e desejam abandonar essa situação. Comumente dizemos que o pior cego é aquele que não quer ver. Entretanto há um tipo ainda pior e perigoso: é o cego que pensa ver.
Cegueira é a condição natural da humanidade. Aquilo que meus olhos vêem carrega as deformações das sombras e da penumbra. Somente “na Tua luz veremos a luz” (Sl 36.9).
Faço a Deus minha oração nestas horas crepusculares: “Abre os meus olhos para ver, e mesmo diante do inevitável, da injustiça e das trevas que querem me seduzir, que eu seja bom, solidário, afável e profundamente humano. E quando acordar desta vida, eu me satisfarei com a tua semelhança”.
Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br