quarta-feira, 16 de setembro de 2009

NO OLHO DO FURACÃO


“O Senhor tem o seu caminho na tormenta
e na tempestade” (Naum 1.3)


Hecatombes, desastres, revoluções, perseguições, pandemias, dívidas, doenças diagnosticadas, família incorrigivelmente desestruturada... como viver a fé em meio ao caos? Como estar em paz quando nos encontramos no olho do furacão? Essas coisas desestabilizam, sacodem, desequilibram, tiram o chão.

Basta um pequeno aneurisma no cérebro, basta o surgimento de um nódulo no seio, ou a comprovação de uma traição, para que de repente sejamos jogados no olho do furacão.

Faz parte do ser humano buscar a segurança e a previsibilidade, e é comum imaginar que vida boa é vida sem sobressaltos, e livre de más notícias. Mas creio que pode haver um elemento de transformação do ser que somente é despertado em meio à borrasca. Uma mudança de perspectiva e de postura pode surgir em meio ao turbilhão. Quem pode afirmar que ali não se iniciará uma caminhada de volta ao Pai? Uma mudança de olhos daquilo que é temporal e efêmero para o que é eterno? O Senhor tem o seu caminho na tormenta e na tempestade (Naum 1.3)!

Estar no olho do furacão nos faz repensar a vida. Há um aprendizado em curso. Quem já passou pelo vale da sombra da morte, com um diagnóstico “irreversível” num hospital, aprenderá agradecer a Deus fervorosamente cada manhã vivida. Quem um dia perdeu tudo, foi humilhado, e sentiu-se sozinho, saberá valorizar a amizade, o companheirismo e a solidariedade. Aquele que um dia passou necessidade extrema reconhecerá o valor que há em comer um simples pedaço de pão.

Há algo de paradoxal nos acontecimentos da vida. Davi admitiu que foi “bom ter passado pela aflição” (Sl 119.71), ou em outras palavras, ter estado no olho do furacão, para que ele compreendesse coisas que antes não compreendia.

A consciência da iminência da morte faz o homem relembrar a sua finitude e temporalidade. A solidão, o medo, o vazio, possuem o bendito valor terapêutico de resgatar sentimentos que até então encontravam-se adormecidos dentro da alma.

Acho de uma beleza comovente quando Davi se refugia numa caverna, a caverna de Adulão, fugindo de um ensandecido Saul, que desejava matá-lo. Seus irmãos e toda a casa de seu pai souberam, e foram para a caverna para estar com ele. E o mais surpreendente: ajuntaram-se a Davi todos os homens que “se achavam em aperto, endividados, e todos os amargurados de espírito”, e Davi se fez chefe deles (1Sm 22.1-2). Quem está no olho do furacão não está só.

Desdenho a “fé” dos falastrões da TV, mas me comovo com a fé daquelas mães que levam seus filhos todos os dias para tratamento na AACD. Não me comovo com testemunhos patéticos de “prosperidade”, mas me emociono vendo filhos cuidando de seus velhos com o mal de Parkinson ou Alzheimer, que nem os reconhecem mais. Acho que agora compreendo quando o Pregador diz que “melhor é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há banquete, pois naquela se vê o fim de todos os homens” (Ecl 7.2). Sim, precisamos conhecer o fim para saber viver o meio.

Hoje não nos reunimos mais em uma caverna em torno de um homem – seja ele sacerdote, pastor ou apóstolo – mas em torno Daquele que compreende o que é sofrer, pois passou por esse caminho antes de nós. Jesus, o Filho de Davi está preparado para receber as almas angustiadas que se unirão à Sua volta, obedecendo à sua vontade. Ele recebe a todos, por mais miseráveis que sejam.

Nossas reuniões não são para os felizes, nem para os sãos, e nem para os que bastam a si mesmos, mas para quem tem algo difícil de suportar, e vem até a Cruz para chorar, pedir, suplicar. Venha se unir em torno de Cristo.

Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br