sábado, 11 de julho de 2009

Como assim, óleo na cabeça e vestes limpas?

Vai, pois, come com alegria o teu pão e bebe gostosamente o teu vinho, pois Deus já de antemão se agrada das tuas obras. Em todo tempo sejam alvas as tuas vestes, e jamais falte o óleo sobre a tua cabeça . (Eclesiastes 9.7-8).

O autor do livro da sabedoria, por todo texto parece desenvolver uma espiritualidade muito encarnada, no sentido de incentivar a reflexão sobre coisas ligadas ao cotidiano comum: pão, vinho, óleo, relacionamentos, dentre outras.

Inclusive, falando mais especificamente do conteúdo expresso no capítulo 9, onde nos deteremos para o desenvolvimento da presente reflexão, o autor parece nos indicar um caminho onde, se consideramos as expectativas quanto à vida, não existe diferença entre “justo” e “ímpio”, todos interagem com o relativo, todos comungam da mesma vida, bebem no mesmo cálice. Exceto com relação à esperança em relação ao futuro. Ao ímpio não resta nada, ele/a não preserva esperança alguma, sobre nada – está ocupado/a revolvendo-se em si mesmo/a todo o tempo.

Na estrutura literária semita, de Quiasmo, podemos considerar os versículos 7 -10 como o centro desse capítulo, e a parte mais importante, ou que o autor queria enfatizar, do capítulo. E nessa parte “central”, o versículo que me chama especial atenção é o versículo 8 (observe acima no texto bíblico especificado).

Não raras às vezes, esse é um versículo usado para falar de pureza, e de santidade; dentre outros temas que vão nessa mesma direção. No entanto, a figura do “óleo sobre a cabeça”, aparece na Bíblia, com sentidos diferentes, o mesmo acontece com a figura das “vestes limpas”. Eu fiz alguns paralelos com outros textos bíblicos, e gostaria de sugerir uma possibilidade de interpretação para esse versículo 8.

Por exemplo, observemos os seguintes paralelos: No Salmo 23.5, o óleo é pedido sobre a cabeça, e o cálice transborda; já no Salmo 133.2, o óleo que está sobre a cabeça desce pela barba de Arão, escorre pela gola – ambas são imagens do “óleo sobre a cabeça” e que estão ligados diretamente, também, à limpeza das vestes. Nesses dois textos, o óleo é determinante para sabermos se a veste está limpa ou se alterada, pelo óleo em seu aspecto estético – e nesses dois, o óleo conseqüentemente alterará a cor da vestimenta, porque foi “derramado para fora”, fez-se escorrer.

O que poderia significar esses símbolos do livro de Eclesiastes, à luz desse capítulo 9 versículo 8? Não pode faltar óleo sobre a cabeça, e as vestes devem estar alvas.

A possibilidade de interpretação que eu sugiro, considerando que esse é um escrito de sabedoria, é que, o ser humano deve viver, cotidianamente, buscando o equilíbrio entre “a unção” (representado pelo óleo sobre a cabeça), e a santidade e retidão (representada nas vestes limpas), e esses símbolos aqui parecem ser apresentados, como que partes de uma mesma peça, isso sim, mas extremidades diferentes dela.

Óleo demais sobre a cabeça, extrapola, e altera o estado alvo das vestes, ou seja, essa unção pode “corromper” se não for buscada na medida certa. Mas também querer preservar as vestes alvas demais, exacerbadamente, isso pode significar contenção de óleo, ou mesmo a extinção dele sobre a cabeça, o que não é bom. Primordialmente, as vestes devem ser preservadas, mas nunca sem nos esquecermos que deve haver óleo, sob medida, em nossas cabeças. No entanto, não podemos perder de vista a perspectiva, também bíblica, de que às vezes, esse óleo vai transbordar, e saudavelmente a estética das vestes será alterada. Nesse equilíbrio consiste a sabedoria.

Somos ungidos/as, submissos/as ao Ungido (Cristo), e nessa perspectiva de unção, a que traz equilíbrio, devemos nos conscientizar, conforme o texto de 1Jo 2 nos alerta, que a unção nos faz pessoas públicas (com relação ao testemunho) e capacitadas a discernir.

Abraços.












quarta-feira, 8 de julho de 2009

A balada de José









O culto acabou,

a luz apagou,

a igreja fechou,

o povo se foi,

a noite esfriou.

E agora, José?

E agora, você?

Você que dizima,

não falta às campanhas,

unge com óleo,

e toma da água

que o apóstolo orou.

A noite esfriou,

e a bênção não veio,

mas o bispo pregou

que a culpa é só sua:

“você não tem fé”.

E agora, José?

Está sem recursos,

está sem amigos,

e acabou o carinho

daqueles irmãos

do errante caminho.

Perdeu a esperança

porque confiou

em palavra de homem

que só se interessa

em ovelha tosar,

enganar os mais simples,

e passar um sermão

em quem duvidar.

E agora, José?

Se você cantasse,

se você orasse,

se você louvasse...

Mas você já não crê,

e prefere morrer

a ser iludido mais uma vez

com tantas promessas

de espertos profetas

que cobram pedágio

pra se alcançar

as bênçãos do céu.

A noite esfriou,

as lágrimas rolaram.

E agora, José?

Sozinho no escuro

qual bicho-do-mato,

José abre a Bíblia.

E como milagre

caíram-lhe escamas

que impediam seus olhos

de enxergar a Verdade.

A partir desse dia

o Evangelho reinou

dando-lhe Paz

e indizível alegria.

E agora, José?

Agora que eu vejo,

não tem mais conversa:

deixei as mandingas,

os fetiches e crenças.

Posso dizer que

mudou minha história:

Desde então,

é somente a Palavra,

somente a Graça,

apenas a Fé

no Filho do Homem,

e a Deus, somente a Deus,

eu dou toda a glória.

Pr. Daniel Rocha

dadaro@uol.com.br

[Obs. : Esse texto foi escrito após uma pessoa ter buscado minha orientação pastoral. Sua irmã, uma mulher com mais de 50 anos, fez um acordo trabalhista de 12 anos de empresa para levantar um dinheiro e “entregar pra Jesus”. Foi prometido que esse desafio seria abençoado por Deus até “10 vezes mais”. Trata-se de mais um caso de abuso espiritual praticado por estelionatários da fé cujo “deus” é um cara obcecado por dinheiro que fica repetindo Money.... Money... Money....]

quarta-feira, 1 de julho de 2009

QUEM É MESMO VOCÊ?


Há um desejo natural dentro de cada pessoa, em ser notada, bem quista, e que olhem para ela e gostem. Faz parte do ente humano desejar que ouçam o que ele tem a dizer e aceitem sua contribuição ao mundo. Não aspirar tais coisas é viver na apatia e indiferença, sinais de uma alma adoecida.

Entretanto, ser reconhecido pelo próximo pode evoluir para um secreto desejo de impressionar, não com o que somos, mas com o que queremos que pensem que somos. Ou seja, a questão não é apenas o que eu faço, mas o que sou. Algumas pessoas, por força do talento ou vocação, estão expostas como uma vitrine, e o perigo de haver um abismo entre a “aparência” e o “ser” se torna ainda maior.

Sacerdotes, pastores, músicos, e até mesmo o fiel em suas atividades paroquiais são sérios candidatos a uma perigosa cisão da personalidade. Assim como os artistas, eles também estão diante de um público que aprecia quem tem poder e carisma. Mas estes também voltam para casa, pois há uma existência a ser vivida longe dos holofotes e do olhar admirador dos que o cercam.

O espelho mostra quem somos, e é nele que vemos refletido nossa dor e o cansaço do ser. Por mais que disfarcemos, estão lá. É inevitável: o ator, o cantor, o palhaço quando deixam o palco, depois de encantarem multidões, terão reencontrar-se consigo mesmos, longe de todos que o aclamam. E à medida que o personagem sai de cena, começa a aparecer o ser.

Foi uma grata surpresa ouvir recentemente uma música gospel com conteúdo, coisa rara de se ver ultimamente. Fugindo dos chavões característicos, ela me golpeou com uma pergunta fatal:

Depois de pregar seu lindo sermão
E de cantar a última canção
Quando você volta pra casa
E ninguém mais que você
Precisa impressionar está por perto
Quem é você?
Quem é você quando ninguém vê?
Quem é você?

Não é possível fugir a essas questões, a menos que nos acovardemos e queiramos passar o resto de nossos dias vivendo um personagem oco, vazio e triste.

Talvez ninguém mais que Michael Jackson tenha tentado manter um personagem irreal, um menino permanentemente infantilizado que não queria crescer, sempre “trocando” o verdadeiro rosto que envelhecia, e vivendo refém de suas ilusões. Viver uma persona sem reconhecer quem se é realmente, é de uma solidão e angústia sem fim, que só encontrará um certo prazer enquanto representa.

Não conheço nenhum espelho melhor que o Evangelho de Cristo. Ele desnuda, radiografa, mapeia o nosso ser. Dele nada posso esconder. Nele me enxergo na figura do homem de mão ressequida que não tem como ser solidário a ninguém. Nele reconheço minha cegueira, incapaz que sou de olhar e ver com bons olhos, e me pego como a prostituta que vende a alma por alguns momentos de prazer.

Saber quem eu sou, ao mesmo tempo que entristece, liberta. O rei Davi se considerava piedoso e temente a Deus. Certo dia o profeta Natã foi ao seu encontro e contou-lhe uma parábola sobre um homem cruel e injusto. O rei se revoltou e prometeu dar cabo daquela criatura abjeta. Mas, Natã, corajosamente aponta para o rei e lhe diz sem meias palavras: “Tu és o homem!” (2Sm 12.7).

Precisamos de um ser amoroso que nos diga quem somos, pois há fortes defesas que nos impedem de encarar nossa miséria. Foi preciso que Alguém lá de cima descesse à Terra para me dizer que sou pecador, invejoso, rancoroso, persigo fantasias e troco diariamente a glória de Deus por qualquer bobagem.

Michael Jackson queria “perder-se” de sua história, apagando do rosto tudo o que lembrava o passado. Deus não pretende destruir quem eu fui, mas usar esse material que servirá de base para aquilo que o Espírito estará formando em nós. É doloroso, mas é a forma que Ele escolheu para agir.

Tenha a coragem de responder: “Quem é mesmo você?”. Não importa a resposta, desde que você entregue ao Oleiro esse vaso torto, rachado e sem valor. Ele é especialista em trabalhar com massas informes desde a criação. Conceda ao Eterno a permissão de trabalhar em você, pois “como o barro do oleiro, assim sois vós na minha mão” (Jr 18.6).

Pr. Daniel Rocha

dadaro@uol.com.br

P.S.: quem desejar ouvir a música que mencionei, clique no link

http://www.youtube.com/watch?v=JGFn6nW7uDk&feature=related

quarta-feira, 24 de junho de 2009

PROS INFERNOS com as máquinas ...

Hoje, depois de muito tempo, eu peguei num lápis para escrever qualquer coisa que me leve para longe da tela do computador. Na tela de um computador eu me envolvo, me prendo, e quando me apercebo ... perdido ... em profundo ÊXTASE VIRTUAL ... vejo que aos poucos fui desfalecendo. A vida foi ficando ... ficando. As amizades ficaram frias; mas hoje é mais coletivo? eu diria que sim, mas um coletivismo solitário - cadê todo mundo? SUMIU ! Sumiu todo mundo daqui da rua, daqui do café.

O tempo passa e os sonhos ficam ali, no quadrado do monitor, nos quadrados de cada uma das teclas, na 'CPU' - sou apêndice de máquina, sendo enquadrado.

Com o lápis eu me liberto. A imaginação me leva para longe ... posso até pintar sentindo o peso do punho, e as articulações do braço ... braço que abraçou ... braço que ninou. O cérebro grita: LIBERDADE !! Aí então ... pintei crianças na rua, crianças inocentes jogando bola e andando de bicicleta ... brincando de polícia e ladrão .. "nossa quanta gritaria" ... CRIANÇAS, belas ... encantadoras crianças. Pintei as favelas do Rio de Janeiro e de São Paulo, com mais cores, o preto junto com o branco, o branco junto com o preto, o branco-preto e o preto-branco, ambos uma só pessoa, um só ser.

Sobre as cidades ... nessas eu pintei mais amor, menos máquinas, menos carros nas ruas nos apertando nas calçadas, no meio da rua colori as crianças, e os carros pendurei cada um deles nas estrelas do céu, bem alto, mais longe ... para sobrar mais espaço: NÃO !! ELES NÃO VÃO CAIR de volta!!

Puxa vida .... acabei quebrando a ponta do lápis ... isso não é o mesmo que estar desconectado da internete, mesmo assim vou parando por aqui, vou apontar sim, e começar tudo mais uma vez. E escrever mais de "próprio punho", assinar com o dedão cheio de tinta, amar mais, ser mais doação, menos extensão de máquina. Quero ser mais calor ... mais livre dos tantos e-mail's rotineiros ... quero ser mais corpo, mais eu - GENTE - que computador.

Com o que me resta de chama ... de ponta ... do lápis ... vou apontar - para começar de novo; mas antes .. PROS INFERNOS COM AS MÁQUINAS!!!




segunda-feira, 22 de junho de 2009

BIG brother, BRASIL?

Este artigo é parte de um texto que eu escrevi para um jornal da cidade de Cunha/SP.

As mídias trabalham com a “virtualidade” de cada fato, e se tratando de mídia televisiva, vários/as autores/as elaboram suas teses. Concordamos que hoje, a imagem editada (sempre escolhida a partir de um ideal subjetivo), vale muito mais do que o próprio fato em si. É a fascinação pela espetacularização do fato, que faz com que a “cena original” e seu significado objetivo sejam desprezados.

O fenômeno é complexo, mas, nunca na história a televisão foi tão "consumida" também para entretenimento. Informação + entretenimento + espetacularidade, nos embalos hodiernos, sob a égide do mercado, é uma coalizão com desdobramentos intensos e profundos: os feitos são maiores do que podemos registrar.

Surge então a problemática: o que significa “para a”, e “na” sociedade, o programa "BBB" exibido pela Rede Globo de Televisão, que tem o poder de mobilizar alto índice de telespectadores quando vai ao ar? Estamos falando do Big Brother Brasil.

Sobre isso, gostaria de pontuar duas coisas importantes:

1) O cotidiano é exacerbadamente mostrado como possibilidade de mercado. É interessante como o “BBB” tem o poder de atrair as atenções alterando profundamente nosso senso de privacidade. Isso não é gratuito. Somos estimulados a “bisbilhotar” a rotina de pessoas comuns, mas que são “celebratizadas” pela ênfase dada na estética dos “corpos que interagem”. Estudos comprovam que a “nudez” total, mais ainda a parcial, atrai os olhares de forma quase que hipnótica, pois estimulam instintos primitivos em nós. Apelos eróticos não faltam no “BBB”. Mas, qual é a intenção? Vender! Cada vez que, aparentemente sem propósito, ou que seja conscientemente em busca de diversão, ligamos a TV para assistirmos o “BBB”, estamos “consumindo” e conseqüentemente gerando lucro.

2) Manipulação à vista! A neutralidade não existe, há quem diga que ela é um mito. Fico estarrecido ao ver como o “jogo dinâmico” das câmeras; e a seleção de cada imagem, concernente o que vai ao ar naquele determinado momento; e até como as intervenções de Pedro Bial, são elementos concretos que têm o poder real de induzir à entrega do prêmio final: R$ 1 milhão. Temos a sensação de que estamos vendo o todo das histórias de cada pessoa, mas isso não é verdade. Estamos vendo o que “a equipe” que comanda câmeras e microfones quer que nós vejamos e ouçamos. Ou seja, vamos interagindo e votando conforme constantes induções, como que orientados/as pelo próprio programa a quem devemos premiar na grande final. Nossa empatia por cada participante é, quase que totalmente determinada e caracterizada, na medida em que câmeras e microfones nos servem aparentemente sem segundas intenções.

Não quero generalizar e divagar, mas objetividade e clareza são termos que ficam comprometidos num texto que precisa prezar pelos limites técnicos do artigo. No entanto, chamo sua atenção para o fato de que quase sempre, estamos sob a influência das tramas agradáveis, mas apelativas, estabelecidas nesse reality show que tem o aparente objetivo de ser um “magazine virtual”. Nós pagamos isso à duras penas, e em vários níveis. Olhe para dentro de sua própria casa, e perceba você mesmo/a como sua família reage à esses estímulos variados, e até reflete a assimilação de cada um deles no cotidiano.

Com o advento da TV nossas estruturas familiares foram profundamente alteradas, e mais recentemente, desde o primeiro Big Brother Brasil, nós já não somos mais os/as mesmos/as.

Abraços a tod@s.