sábado, 26 de dezembro de 2009

SÓ POR HOJE


“Não há um justo; nem um sequer”


Não há nada mais nefasto na vida do cristão que a presunção. Presunção de justiça própria, presunção de bondade, presunção de virtuosidade. É o orgulho espiritual em sua forma bruta. Em contrapartida, quem freqüenta os Alcoólicos Anônimos (AA) – que não são igreja – possui uma consciência muito clara de seu estado e de sua doença. No “Programa dos 12 Passos”, criado por eles em 1935, há várias confissões, entre elas: “Admitimos perante Deus, perante nós mesmos e perante outro ser humano, a natureza exata de nossas falhas”. Como afirmou Blaise Pascal: “A grandeza do homem é saber-se miserável”.

Cada um que chega às reuniões com o seu vício é recebido com sorriso largo e gestos de apoio. Fiquei pensando que nenhuma igreja saudaria com alegria alguém que se confessasse alcoólico ou dependente de drogas. Nos AA o participante admite a responsabilidade total e completa por todo o seu comportamento. Nas igrejas a culpa quase sempre acaba caindo nas malvadezas do Diabo. Lá ninguém diz que “era” alcoólico cada vez que se apresentam, pois percebem que diariamente lutam contra o mal que continua “existindo” dentro de si. Seria muito bom que cada cristão também reconhecesse sempre que “é” pecador.

Não há espaço para a opulência ou superioridade. “Se tenho de me gloriar, me gloriarei nas minhas fraquezas”, diz humildemente Paulo.

A vida do cristão se dá dia após dia. Se ontem falei e agi em santidade, não há garantias de perpetuidade desses gestos agradáveis a Deus amanhã. Se eu der ocasião à carne, por achar que preguei um piedoso sermão, a vaidade me dominará. O mesmo Pedro que acabara de confessar “tu és o Cristo”, logo em seguida ouve de Jesus um “arreda-te Satanás”, quando ele tenta impedir o Mestre de caminhar para a cruz.

Ninguém cai de uma vez, mas cai-se aos poucos. O salmista confessa que faltou pouco para escorregarem os seus pés (Sl 73.2). É preciso vigiar, é preciso descobrir as artimanhas e artifícios que o nosso inconsciente se utiliza para parecermos bons a nós mesmos.

Lidar com os pecados mais visíveis e grosseiros sempre foi a primeira grande preocupação do neoconvertido. Em pouco tempo ele se mostrará todo gabola porque já não bebe mais, não furta, ou adultera, enquanto vai sendo derrotado diariamente pelas “pequenas raposinhas”: má vontade, mau humor, intolerância, olhos maus, pensamentos mórbidos, descontrole verbal, inimizades..... Antes “furtasse”, ao menos isso o envergonharia e tomaria consciência de seu estado (“Sê pecador e peca fortemente, mas crê muito mais fortemente na Graça de Cristo”, escreveu Lutero a Melanchton). Entretanto esses problemas sutis passam imperceptíveis aos seus próprios olhos, pois quem convive diariamente com uma “leve” febre acaba achando-a normal, sem necessidade de tratamento.

Mas por que muito cristão sincero não percebe essas mazelas? Há um mecanismo de defesa em ação que tenta “eliminar” o impulso mal dos domínios da consciência através da repressão, mas ele continua a agir e a exercer profunda influência sobre a pessoa, apesar dela não se aperceber. Resumindo: sempre há uma distorção no olhar que lançamos sobre nós mesmos, e requer coragem olhar-se no espelho da Palavra e ser sensível ao Espírito Santo que habita em nós.

Não tenho dúvidas que estes precisam tanto de Deus quanto os AA, os NA (Narcóticos Anônimos) e os N/A (Neuróticos Anônimos). Ambos carecem da misericórdia divina: a diferença é que um reconhece e outro não. Um luta diariamente com sua fraqueza, seu pecado, suas tendências, permanecem atentos a cada impulso do inconsciente e a cada desejo que aparece de forma subreptícia (dissimulada). Outro se enxerga acima do mal.

Seguir Jesus implica em passar pelo crivo do Espírito as pulsões, vontades e desejos. Precisamos de cura, e isso não é fácil, ela vem devagar, com consciência, com vontade, e com ajuda do Eterno. Não creio em atos heróicos de supressão da carne, mas num processo que pede minha atenção dia após dia. Por isso:

Só por hoje quero fazer um silêncio interior, e ouvir a voz de Deus sussurrando em meu coração. Tentarei não murmurar das circunstâncias difíceis.

Só por hoje quero aprender a viver a minha vida presente, não ser dirigido pelo passado, nem ser tomado de ansiedade pelo futuro.

Só por hoje mostrarei simpatia por alguém que me tira do sério, terei mais paciência nas adversidades, e falarei devagar e com mansidão.

Só por hoje não exigirei das pessoas que as coisas sejam exatamente da maneira que eu quero: respeitarei a forma que os outros vêem.

Só por hoje não quero ficar me remoendo com os erros cometidos. Quero viver pela Graça e saber que em Cristo sou amado, liberto e perdoado.

Somente por hoje não farei drama de meus problemas, e orarei por um amigo distante.

E amanhã? Bem, se hoje eu conseguir viver de forma agradável a Deus, já serei mais feliz. Quando amanhã chegar será outra vez mais um hoje.... então vou começar tudo novamente.


Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

TEMPO DE ANUNCAR

Por Rev. Antônio Luiz de Freitas

"Está escrito na lei: Por homens de outras línguas e por lábios de estrangeiros falarei a este povo; e nem assim me ouvirão, diz o Senhor" (I Coríntios 14. 21)

Dentre as coisas mais difíceis para todo ser humano está a mudança de hábito. A força de um hábito adquirido leva as pessoas a agirem de forma mecânica e instintiva. Isto também pode estar ligado aos paradigmas e às crenças que herdamos de nossos antepassados pelas coisas que ouvimos e que vamos absorvendo em pequenas doses diárias tornando-se a "nossa verdade".

Muitas pessoas têm dificuldades tremendas em relação ao evangelho porque, em grande parte, o que receberam foi algo distorcido e, por vezes, mesclado com práticas destituídas da verdade. Há um provérbio popular que afirma que "quem conta um conto sempre aumenta um ponto".

Parece-me que Deus quis preservar-se deste perigo delegando aos próprios anjos a anunciação dos eventos mais importantes da história. No que tange ao Messias, o Cristo, sem fazer alusão ao AT, o "Ministério da Comunicação Celeste" entra em ação começando pelo anúncio do precursor a Zacarias (Cf. Lc 1. 1-20) e depois à própria Maria (Cf. Lc 1. 26-37). Mais tarde, o nascimento de Jesus foi também anunciado por anjos aos pastores que guardavam seus rebanhos na vigília da noite (Cf. Lc 2. 8-15). Depois de cumprido seu ministério terreno e haver consumado na cruz o plano de salvação, mais uma vez iremos encontrar a figura do anjo anunciando sua ressurreição (Cf. Mt 28. 1-8).

Temos que admitir que de todas as religiões que se propõem aproximar o ser humano de Deus o cristianismo é a mais difícil de ser entendida porque caminha na contramão da lógica humana: Concepção virginal, sem a participação do homem; A cruz, símbolo de maldição, que toma a forma de redenção; o sangue humano que contaminava os judeus torna-se o elemento purificador; a ressurreição, algo inadmissível para os gregos torna-se a razão da nossa esperança; a graça de Deus que chega a ser "escandalosa", conforme descreve Phillip Yansey em seu livro Maravilhosa Graça. Enfim, não há como nos dispor a anunciar este evangelho sem esperar resistência, porém, é impossível, mesmo aos mais descrentes, omitir o evento mais importante de todos os tempos: o nascimento de Jesus que dividiu a história em duas partes; antes e depois de Cristo! Nossos primeiros irmãos enfrentaram até à morte as mais cruéis perseguições por causa do amor a Cristo e assim a Igreja do Senhor, espalhada por todo o mundo, seguiu anunciando o evangelho, escrevendo a sua história. O Livro de Atos dos Apóstolos termina de forma muito diferente dos demais livros do NT. Nele não há uma saudação nem uma bênção final. É um livro que vai continuar sendo escrito pela Igreja enquanto estiver na terra e cada cristão é um personagem desta história. Gosto de me imaginar no lugar de algum dos antigos cristãos perguntando-me a qual deles mais me assemelho: João Batista; Herodes; Barnabé; Ananias e Safira; Filipe; Estevão; Pedro; Paulo; João; (...)? O marco histórico do nascimento de Jesus não deixa ninguém fora desta história. O mundo tornou-se um grande palco onde se desenrola este enredo. O que irá fazer a grande diferença é o papel que nos dispomos a desempenhar!

Em tempo de advento somos chamados não apenas a esperar, mas também a anunciar. "Mas também, se padecerdes por amor da justiça, bem-aventurados sereis; e não temais as suas ameaças, nem vos turbeis; antes santificai em vossos corações a Cristo como Senhor; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a todo aquele que vos pedir a razão da esperança que há em vós" (I Pd 3. 14-15).

Feliz Natal e um grande abraço do menor de todos os vossos conservos no Senhor Jesus. Aguardando a sua volta, sou,



PRALF/14/12/2009.

domingo, 20 de dezembro de 2009

NATAL: o milagre de um Deus que ama

Por Rev. Ronan Boechat de Amorim

Por muitos séculos o mundo não cristão e até mesmo a Igreja cristã tiveram dificuldades de explicar o mistério do Natal, ou seja, o mistério que envolve a encarnação de Deus em Jesus, que se fez feto na barriga de Maria, criança dependente dos cuidados e proteção da família e homem que morreu cruel e injustamente assassinado na cruz.

Influenciada pela filosofia grega, uma grande parcela do mundo daquela época em que Jesus nasceu acreditava que o mundo humano, histórico e material (esse mundo onde vivemos!) era uma espécie de purgatório, para onde algumas almas eram condenadas a vir e aqui serem provadas, até serem “remidas” (salvas). Essa salvação acontecia depois de sucessivas reencarnações até que a alma (a pessoa) em questão tivesse alcançado um grau de sabedoria tamanho que pudesse voltar ao mundo perfeito das idéias (qualquer semelhança com o espiritismo kardecista não é mera coincidência!). O mundo me que vivemos era mal, lugar de sofrimento, de provação... uma prisão para a alma!

Como pode um Deus onipotente e onipresente se tornar um feto e caber dentro da pequenez e fragilidade de um corpo hu-mano? Como pode um ser tão transcendente tornar-se depen-dente do amor familiar para poder nascer e sobreviver? Como um oceano poderia caber num balde?
Para muitos – gente de dentro e de fora da Igreja! – a encar-nação era um grande absurdo, pois um Deus soberano que se humilhava assim não merecia ser temido e adorado! Diante des-ses questionamentos alguns cristãos caíram na cilada de tornar o mistério mais palatável, compreensível e aceito e o reduziram a explicações que foram consideradas heréticas pela igreja: Jesus não era Deus, havia sido adotado na hora do seu batismo por Deus para ser o seu Filho. Ou: Jesus não era Deus, foi a primeira criatura criada por Deus.

Coube aos Evangelhos afirmarem a verdade: Jesus era Deus desde o princípio (cf. Jo 1:1-14), que por amor (Jo 3:16) veio ao nosso encontro para nos ensinar a viver bem (Jo 10:10).
Assim como a redenção oferecida por Jesus nos faz “nascer de novo” e nos torna em novos homens e novas mulheres, a redenção divina também transforma o velho mundo numa nova terra e num novo Céu (Is 65:17-25). A presença de Deus em algum momento, nós cremos, reencherá a terra da sua Glória. Jesus traz as primícias (primeiros frutos) desse Reino, desse momento novo. Jesus fez-se homem para que os demais homens e mulheres pudessem ver Deus. Ele veio ao nosso encontro para nos oferecer sua Palavra, seu exemplo, seu amor e sua própria vida para que nós pudéssemos ter vida abundante, vida eterna, reconciliados uns com os outros e reconciliados com Deus.

Segundo Fp 2:5-11, Deus esvaziou-se de sua Glória (humilhou-se) e fez-se carne (gente), mostrando que o mundo não é purgatório, mas o “palco” da redenção, lugar da ação salvadora de Deus, lugar profético onde vida, paz, justiça e salvação vencerão as forças da morte e do mal. Parte integrante do Reino de Deus (cf. Rm 8:18-25) e de onde o diabo e seus anjos serão lançados fora para dentro do poço de enxofre cujo fogo não se apaga nunca (Ap 19:19-21; Ap Ap 20:14). E a cerca e o portão do velho Éden vigiados por querubins (cf. Gn 3:23-24) cairão por terra e a Glória de Deus será derramada e alcançará toda a terra. E Jesus é o "sinal" mais latente e poderoso dessa derrubada: é o véu que se rasga, é o lugar do templo chamado Santo dos Santos que transborda e invade a nave do templo onde fica a congregação e começa a transbordar pelos átrios e pátios, pelas circunvizinhanças, por Jerusalém, Judéia, Samaria e os confins do mundo... É a santidade de Deus que santifica e santificará o mundo que agora vive parcialmente em trevas. É em caráter cósmico o que é descrito na relação conjugal e familiar em 1Co7:14. A terra não será o Céu, mas a terra e o mundo limpo pela palavra de Deus (Jo 15:3) será parte do Céu.
Portanto, não nos esqueçamos do centro do Natal: um Deus amoroso e salvador que vem ao nosso encontro para nos salvar.

Não nos esqueçamos do mistério do Natal: um Deus tão grandioso surpreendeu a todos (inclusive à ciência, à cultura, à teologia) e de modo misterioso foi gestado pelo Espírito Santo no ventre de Maria e tornou-se um de nós.

Não nos esqueçamos do significado do Natal: um Deus que por amor a nós faz o possível e o impossível, que opera sinais e milagres, que move céus e terra para poder nos salvar. O Natal cristão é o milagre de um Deus que ama.

Aleluia!

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

SEM TÍTULO .... E SEM FIGURINHA .... É SÓ UMA DICA ...

De tanto olhar, tentando entender,
fui perdendo o jeito de ouvir para entender.
Quando parei para tentar ouvir percebi o quanto era difícil - só ouvir, sem olhar!
Aí foi a visão que em mim, aos poucos, atrofiou.
E o conhecimento me faltava se eu estacionava em um desses extremos.

E eu ia vivendo e tentando entender!

Mesmo quando exercitava os olhos e os ouvidos, buscando sincronizar ao máximo suas potencialidades, algo parecia me faltar: era o cheiro que escapava aos olhos e aos ouvidos! E eu continuava sem entender!

Quando me dei conta do sabor; do toque que pega! Tudo me parecia tão distante, e tudo ficava tão confuso!

Eu sempre parava para tentar entender!

Me dei conta também do quanto era angustiante o vazio! Não queria ter amigos, pois tinha medo de me abrir à relacionamentos; não queria traçar objetivos significantes para minha vida.

E eu vivia tentando entender!

Hoje olho para tras, e entendo! Que os sentidos não funcionam se penso e vivo eles numa dimensão privativa, eu em mim mesmo!

Assim sou incompleto, sou sem vida, sempre falta!

Quando me abri às possibilidade de amizades ... e não temi correr os riscos inerentes à toda possibilidade de relacionamento que brotava feito água na rocha diante de mim ... minha vida pareceu fazer mais sentido! Porque onde duas ou mais pessoas se encontram aí existe a completude de todas as percepções mais importantes do ser ....

... cada qual na sua especialidade, desenvolvendo seus sentidos, exercitando sentido, gerando sentidos infinitos ....

Hoje eu entendo ... eu queria tentar sozinho, ter meus próprios méritos quando fosse mostrar minha sala de troféu! No meu egoísmo eu queria viver “eu para mim”! Mas foi tentando entender, sem nunca ter entendido que eu aprendi ...... sozinho eu não sou ninguém!

Aprendi que ..... se os sentidos do ser estão fundamentados numa percepção monológica de uma existência exclusiva, isso resultará sempre numa alma sem aspirações, num sujeito sem sentido, e que vai sempre tentar entender .... estagnado sem nunca entender!

Ainda não entendi tudo ... mas fica o convite: se abra à novas amizades, se relacione mais, viva mais seus sentidos ..... de forma comunitária ao invés de refugiado em si mesmo dentro de um quarto frio e sem vida!

Aposte no aprimoramento de seus relacionamentos! Quaisquer que sejam eles, só assim serão de verdade: intensos e reais!

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

DA FRAQUEZA TIROU FORÇA


“...quando estou fraco, então é que sou forte” (2Co 12.10)



O perfil de uma pessoa poderosa e bem sucedida normalmente está associado à sua capacidade de vencer, convencer e impor-se, seja pela beleza, pelo talento ou pela fortuna que detém. Anualmente é publicado o ranking das 100 pessoas mais influentes do mundo. Nele estão presidentes, generais, estrelas do cinema e bilionários. Há algo em comum em todos eles: o poder que exercem e o fascínio que suscitam.

Fecha o pano e corta rápido para a Bíblia. Entramos num mundo paradoxal. Ali não é mais o forte ou o poderoso que conta, mas o pobre, o fraco, o simples. A Bíblia é um livro que contém relatos surpreendentes de lutas e desafios que contam de um lado os fracos e impotentes e de outro lado os detentores de força e poder. É o jovem Davi lutando “mano a mano” com o gigante Golias, é Elias versus 450 profetas de Baal, é o povo de Israel tentando escapar do faraó e seus carros de guerra, ou os primeiros cristãos diante das feras no Coliseu romano. Desde o seu nascimento, Jesus já nos ensinava que há algo de diferente no universo da fé.

A força nunca foi característica da fé cristã, e sim o amor. As bem-aventuranças lançadas por Jesus no sermão do monte apontam justamente para aquilo que é considerado fraqueza diante do mundo: mansos, humildes, perseguidos, promotores da paz.... estes são felizes.

Diariamente constatamos que os poderosos, os ricos, e os que pretensamente possuem domínio da situação, “não precisam” de Deus. Quem teve dinheiro para embarcar no Titanic em sua viagem inaugural, entrou ali na certeza que estava num navio que “nem Deus poderia afundá-lo”. Os auto-suficientes desdenham tudo o que se refere ao Eterno. Certamente esta sensação mudou quando milhares se viram lançados nas águas geladas do Atlântico Norte.

É bom saber-se fraco. Faz-nos solidários, despretensiosos. Ao confessarmos nossa fragilidade e vulnerabilidade, podemos ser transparentes, sem nada a esconder. Reconhecer a limitação impede a indolência e nos leva a lutar para superar as dificuldades.

Sempre me fascinou o fato de que quando Deus precisa de pessoas para realizar a Sua Obra, Sua escolha recai nos que demonstram alguma forma de deficiência. Moisés , chamado para liderar um povo, reconhecia-se tímido e com dificuldades para falar em público. Jeremias achava-se imaturo para a carreira proposta. Amós era um “caipira” sem as credenciais formais de um profeta. E Gideão se surpreende ao ser escolhido para livrar Israel: “minha família é a mais pobre de toda a tribo e eu o menor na casa de meu pai” (Jz 6.15). Lutero era um homem atormentado por conflitos interiores, Agostinho também.

Essas fraquezas resultam num senso de insuficiência e numa sede por Deus muito grande. Eles precisam de algo maior, da transcendência em suas vidas. Deus se agrada em mostrar a Sua Salvação ao mundo através da fraqueza de alguns. Ela não é empecilho, mas é o caminho que Deus se utiliza. A Sua Face, Seus desígnios e Seu Amor para com a humanidade, se valem constantemente de nossas debilidades.

Quando Paulo orou para que lhe fosse tirado o espinho na carne, que o humilhava e o debilitava, Deus negou, mas em sua fraqueza logo descobriu uma força que não era dele, e que o sustentaria dali pra frente. Ou seja, a “doença” de Paulo era o canal por onde passaria o amor de Deus. Ele cedeu para Deus.

É comum encontrar nas livrarias literatura do tipo “a arte de vencer”, ou “dez lições como ser um vencedor”, mas não há nada sobre a arte de ceder, a não ser na bíblia. A bíblia, como sempre, vai na contramão do senso comum. O evangelho não pretende me fazer vencedor aos olhos do mundo: Jesus terminou sua vida pendurado numa cruz, todos os seus discípulos – à exceção de João – foram martirizados, e o maior apóstolo dos gentios, Paulo de Tarso terminou sua carreira sozinho numa cela fria, “desamparado por todos” (2Tm 4.16).

Fico atento quando encontro na caminhada da vida, companheiros que estão no limite de suas forças, outros no limiar da sanidade, e ainda outros lidando com a doença e fragilidade física. Sim, fico atento, pois sei que são neles que o Eterno haverá de se mostrar.

Um soldado francês com amnésia por traumas de guerra, após a II Grande Guerra, estava sendo conduzido com outros pacientes para uma clínica em uma cidade no interior da França. O trem em que estavam precisava parar em um vilarejo. Como teriam de esperar, ele pediu permissão para caminhar por aquele lugar, que lhe parecia familiar. Andava um pouco e parava pensativo. Em frente a uma casa, parou, e timidamente bateu à porta. A porta se abre e um homem já idoso olhou surpreso para o jovem à sua frente e de seus lábios brota uma frase: "- Meu filho". O jovem, surpreso, respondeu: "- Meu pai....”. E correu para abraçá-lo. “Pai, agora eu sei quem eu sou!", disse ele chorando.

Deus é aquele que nos desperta de nossa “amnésia” existencial provocada pelos traumas causados pelo pecado, e nos mostra quem somos. Somente com a aceitação de nossa filiação divina é que nossos olhos se abrirão para conhecer os valores que realmente importam na vida. Jesus veio em fraqueza, humildade e mansidão. Não há outra forma legítima de viver. O resto é ilusão.


Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

PERGUNTAS HONESTAS PARA CRISTÃOS SINCEROS


Maiêutica [do Gr. maieutikós: parto] era um processo pedagógico utilizado por Sócrates (IV sec. a.C.) que consistia em uma sequência de perguntas e respostas que ele fazia aos seus interlocutores, “parindo” deles idéias complexas a partir de perguntas simples. De igual forma, Jesus, inúmeras vezes também questionou aos seus discípulos e aqueles que o rodeavam, esperando respostas e posicionamentos, e a partir delas anunciava-lhes um novo entendimento.

Mesmo o cristão mais sincero normalmente não se anima a rever conceitos que foram se estratificando na alma durante anos, e permaneceram na forma ainda “deficiente” de um neófito na fé. Talvez por isso o apóstolo Paulo se preocupava tanto em reparar continuamente “as deficiências da fé” que os primeiros cristãos apresentavam (1Ts 3.10).

Elaboramos algumas questões para confrontar convicções e paradigmas que nem sempre resistem a uma acareação mais acurada. Vejamos:


I. É razoavelmente aceito no meio evangélico que o crente enfrente certas enfermidades, como taquicardia, hipertensão ou miopia. Entretanto, não se admite que algumas debilidades venham atingir a sua mente, o que gera uma grande resistência caso tenha de fazer terapia ou tomar drogas psiquiátricas. Por que só o corpo sofreria as conseqüências de um mundo decaído, mas a mente não?

II. Muito cristão usa e abusa do bordão “foi da vontade de Deus” para explicar mortes que ocorrem pelo descaso dos governantes e pelas injustiças sociais. Somente em nosso país cerca de 102 mil crianças morrem por ano de doenças ligadas à desnutrição. Faz parte do plano divino que elas morram no Brasil, mas não na Suécia?

III. “Nenhum pardal cai no chão sem o consentimento do Pai”, diz a bíblia. Ainda assim os pardais caem no chão e morrem. Proteção divina significa salvo conduto e a certeza que nenhum mal acontecerá a quem tem fé? O que significa para você ser protegido de Deus?

IV. Por que os pecados relacionados à sexualidade causam aos cristãos reação muito maior que a vaidade, a inveja, a maledicência e a falta de amor? Você se sentiria mais à vontade ouvindo o sermão de um homem sabidamente orgulhoso ou de um adúltero que se confessa arrependido?

V. Por que alguns segmentos cristãos julgam com severidade os apreciadores de um bom vinho, mas se calam contra os que se empanturram de comidas gordurosas, frituras e carnes vermelhas, e tomam bebidas fabricadas com corantes, acidulantes, aromatizantes e conservantes, tudo isso reconhecidamente nocivo à saúde? Não é contraditório?

VI. Se alguns pastores modernos realizam de fato inúmeros milagres na frente das câmeras, porque eles não separam um dia por semana do seu tempo para fazer a alegria de centenas de pacientes nos corredores do Hospital das Clínicas ou então às crianças internadas no Hospital do Câncer?

VII. Se a teologia da prosperidade realmente “funciona”, porque os que promovem tais coisas não fazem um bem para a humanidade instalando seus ministérios nos piores lugares do planeta, tais como a Nigéria, o Haiti ou o Sudão? Por que ela não funciona no vale do Jequitinhonha, a região mais pobre do Brasil?

VIII. Depois de mais de duas décadas de igrejas pregando a prosperidade e atingindo milhões de pessoas nas periferias das grandes cidades, já não era tempo do IBGE ter constatado que os bolsões de miséria na periferia desapareceram, e que bairros de classe média surgiram no seu lugar?

IX. Se Jesus ama as criancinhas, colocando-as como nosso modelo e afirmando que é delas o Reino dos Céus – para desgosto dos discípulos que queriam afastá-las de Sua presença – porque hoje, na prática, as igrejas impedem a efetiva inserção delas no seio das comunidades? Colocamos mais em prática a orientação de Jesus ou a repreensão dos discípulos?

X. Jesus aceitou de bom grado o gesto que uma prostituta lhe fez, chorando muito e adorando-o, causando espanto a todos os convidados que estavam à mesa. Que tipo de pessoas ou grupos, que se derramassem hoje perante Cristo, lhe causaria grande indignação?

XI. Por que Jesus, ao ressuscitar, não foi direto ao palácio de Herodes e de Pilatos, mostrando-se a eles, para causar assombro e admiração aos formadores de opinião da época? Dar visibilidade à fé com marchas e shows faria parte dos propósitos de Jesus hoje?

XII. Por que damos tanta importância aos empreendedores, vitoriosos, e famosos, e mal reparamos nos simples e desprovidos de atrativos, se Jesus falou que aquilo que é “elevado entre os homens é abominação diante de Deus”? Preferimos as coisas humildes ou as que exercem fascínio?

XIII. Se Jesus pede para cada um tomar a sua cruz e segui-lo, por que tanta gente vai atrás Dele pedindo facilidades na vida?

XIV. O que você acha de deixar noventa e nove ovelhas no aprisco para ir atrás de uma rebelde que se perdeu? Você concorda com essa aritmética divina ou é adepto do pragmatismo que privilegia as multidões?


As respostas a todas estas perguntas estão nas Escrituras. Confronte o que você “sabe, pensa ou acha” com a Palavra. Busque-a, leia com honestidade, esqueça tudo o que já ouviu de terceiros não confiáveis, peça orientação ao Espírito Santo e sabedoria que vem do Alto. Amém!


Pr. Daniel Rocha
dadaro@uol.com.br

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

SAUDOSISMO OU INDIGESTÃO?

Por: Rev. Antônio Luiz de Freitas

“Porque por amor de ti tenho suportado afrontas; a confusão me cobriu o rosto. Tornei-me como um estranho para os meus irmãos, e um desconhecido para os filhos de minha mãe.
Pois o zelo da tua casa me devorou, e as afrontas dos que te afrontam caíram sobre mim” (Salmo 69. 7-9).

Não é necessário, em qualquer meio relacionado ao povo evangélico em nossos dias, um acurado estudo sobre conduta ética ou moral para sermos acometidos de uma dispepsia religiosa e/ou teológica. Os próprios meios de comunicação em massa nos poupam deste trabalho, pois nos oferecem diariamente um farto cardápio. Não dá nem para reclamar da variedade das iguarias, porém, elas corroem como câncer e têm a cada dia vacinado um grande número de pessoas contra o genuíno evangelho que salva e que liberta. Torna-se cada vez mais difícil ser um “Pastor aprovado diante de Deus” nesta geração consumista que vai continuar sempre precisando de algo mais. Escândalos sobre escândalos se multiplicam e trazem à tona todo o excremento gerado pelos ventres insaciáveis dos modernos “mercadores gospel” para quem o dinheiro nunca basta e que, para consegui-lo, se utilizam de todos os meios possíveis. Eles estão por toda parte e podem ser encontrados nas versões: teológica, religiosa ou política. Alguém menos avisado poderia até lançar toda a culpa nos últimos, porém, penso que estes só refletem aquilo que acostumaram a ouvir de seus líderes, somando-se a isto a falta de escrúpulo da própria classe. Diante deste quadro funesto faltam-me palavras, mas não vou mesmo precisar de muitas; tampouco será necessário recorrer à verborréia latente do meio para exprimir toda minha decepção. Bastam-me apenas duas palavras: “Estou cansado!”. Li, há algum tempo atrás, um artigo do Rev. Ricardo Gondim com este mesmo título e é exatamente assim que me sinto: Cansado, frustrado e dispéptico! Sinto saudades do meu tempo de criança e adolescência, quando o pastor visitava nossa casa e meus pais nos ensinavam que deveríamos manter silêncio para ouvirmos tudo o que ele tinha para dizer. Era como se o próprio anjo de Deus tivesse chegado à nossa casa. Até os vizinhos que não eram crentes o honravam. A figura do pastor era respeitada e reverenciada, pois a isso fazia jus. Esta foi a maior razão do despertar em mim a vocação pelo ministério pastoral. Sinto saudade das máquinas com as quais lidei por toda minha vida, pois elas nunca me decepcionaram; nunca me injuriaram nem tramaram contra mim. Nunca tive que confrontá-las por mau testemunho, por obstinação em continuar pecando, nem por reincidência de desvio de conduta. Nunca vi nenhuma carta do SPC ameaçando alguma delas, nem soube de alguma que tenha adulterado, caluniado às outras, boicotado a programação da empresa, mas me entristeço ao deparar-me com estas coisas dentro da Igreja, “Corpo de Cristo”. Diferentemente das pessoas, elas poderiam até estar sujas, mas não rejeitavam quem poderia limpa-las nem se voltavam contra quem se dispunha fazê-lo. Um único procedimento era suficiente para a manutenção de todas as que eram do mesmo modelo. Acho que é exatamente aí que reside um dos pontos cruciais de todo este contexto: Os crentes de nossa geração não estão sendo mais gerados do mesmo Modelo; Jesus. Antes, se gabam de ser “um dos doze do Ap. X, Y ou Z. Não estou preocupado em que ordem me colocam na escala em relação ao bispo de minha região – pois ele, apesar de toda autoridade da qual se encontra investido e do respeito que lhe devo é, assim como eu, tão carente e dependente da graça e da misericórdia de Deus - mas se de fato meu nome está registrado no “Livro da Vida”.

Desde o início desta semana nosso país tem assistido exaustivamente pelos telejornais a notícia de um fato que foi apenas mais um dos muitos que já ocorreram e dos que continuarão acontecendo até a volta do Senhor Jesus. Políticos da chamada “Bancada Evangélica” apanhados no mais nefando ato de corrupção recebendo propina. E o que mais me chocou foi a ousadia de orar agradecendo (a Deus?) pela vida daquele que fazia chegar o suborno até eles, pedindo que aquele dinheiro desse a eles a vitória sobre seus inimigos políticos, evocando sobre eles o Sangue de Jesus. O que devemos esperar destes a quem delegamos a tarefa de nos representar quando este é o exacerbado testemunho que apresentam? Se os “evangélicos”, de quem no mínimo deveríamos esperar o respeito aos atributos inerentes ao que nos identifica como tal, agem desta forma o que devemos esperar dos outros?
Tenho evitado, sempre que posso, me identificar como evangélico. Nunca me identifico como pastor ao preencher algum cadastro porque corro o risco de não tê-lo aprovado. Prefiro deixar que as pessoas descubram o que sou por elas mesmas; não por aquilo que digo ser, mas pelo que de fato faço. Sinto vergonha de ser comparado a eles! Temos, nas palavras do Senhor Jesus, quando disse a seus discípulos que eles eram o sal da terra e a luz do mundo, uma grande lição: A luz e o sal não emitem nenhum som, mas é impossível não notar sua presença. Creio que nunca houve em tempo nenhum tanta sujeira manifesta no meio do chamado “Povo de Deus”. Que tristeza! Uma verdadeira lástima!
Estes fatos são apenas a práxis do discurso gospel alienado e triunfalista que está sendo pregado nas “igrejas modernas”, destituído da cruz de Cristo, do autoconhecimento de pecado e do arrependimento, do novo nascimento e da santidade bíblica.
Não é este o contexto do “Posso todas as coisas naquele que fortalece” (Cf. Fp 4. 13) que escreveu o “antigo” apóstolo Paulo; antes, é totalmente o oposto do pregam os “modernos” para justificar seus abomináveis intentos. Sua afirmação apenas expressa sua disposição em continuar servindo ao Senhor mesmo nas circunstâncias adversas que o acometeram. Diante destas coisas fico imaginando Satanás diante do trono de Deus apontando seu dedo imundo para a terra perguntando: “Foi por aqueles que Você entregou seu único Filho para morrer naquela cruz...?” (Cf. Ap 12. 10).

Gosto de meditar nas palavras da terceira estrofe do Hino 203 HE: “Desperta, Igreja! E vem o teu dever cumprir! A todos faze a Cristo conhecer; A tua mão estende com paciente amor; Não deixes pecador nenhum se vá perder”. Ao mesmo tempo fico preocupado ao ver o povo cantando sem ao menos pensar no que está expressando: “Satanás debaixo do meu pé” quando, na verdade, podemos vê-lo claramente nos ombros e na mente das pessoas; “Deus sabe que pode contar comigo” enquanto é quase necessário orar para que Deus levante outras jumentas que falem, a exemplo da de Balaão; As pessoas cantam a plenos pulmões: “Abro mão dos meus sonhos e das minhas vontades...”, enquanto vemos a rebeldia, o egoísmo, o orgulho e a vaidade se sobressaindo; “Eu não preciso ser reconhecido por ninguém...”, mas na verdade isto é tudo o que eu quero!

Hoje, no culto doméstico, assentado com minha família à mesa na hora do almoço, enquanto falávamos de frases notáveis esculpidas nas lápides de alguns finados, disse aos meus filhos que seria uma grande honra para qualquer mortal ter em seu túmulo a expressão bíblica compreendida entre os versículos 6 e 8 do prólogo de João: “Houve um homem enviado de Deus, cujo nome era João. Este veio como testemunha, a fim de dar testemunho da luz, para que todos cressem por meio dele. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz”. Oxalá possa eu conquistar esta bênção, embora reconheça que no momento esteja mais para Jeremias que para João.
Encerro minha catarse tomando emprestadas as palavras do profeta Isaias: “O Senhor chamou-me desde o ventre, desde as entranhas de minha mãe fez menção do meu nome e fez a minha boca qual espada aguda; na sombra da sua mão me escondeu; fez-me qual uma flecha polida, e me encobriu na sua aljava; e me disse: Tu és meu servo; és Israel, por quem hei de ser glorificado. Mas eu disse: Debalde tenho trabalhado, inútil e vãmente gastei as minhas forças; todavia o meu direito está perante o Senhor, e o meu galardão perante o meu Deus” (Is 49. 1-4).
Resguardadas as devidas proporções, é exatamente assim que me sinto! Oro para que o Senhor tenha misericórdia de nós.
Um grande abraço a todos os que, sinceramente, amam e aguardam a volta de Nosso Senhor e Salvador Jesus. MARANATHA!!!
Do menor de todos os servos do Senhor, pela sua maravilhosa graça e sua grande misericórdia para comigo e para sua honra e glória, sou para servir,

Pr. Antônio Luiz de Freitas
Igreja Metodista em Santa CruzVolta Redonda, 03 de dezembro de 2009