sábado, 17 de abril de 2010

Minha caminhada na/com a Igreja: três ensinamentos de Deus para mim nessa caminhada

Leia o texto bíblico que é base para reflexão desse artigo: 1 Sm 30.1-20

Introdução

Muitos não percebem em Davi um modelo ideal a ser abordado quando o assunto é caminhada cristã; no entanto, não podemos ignorar que Lucas ao reler a história de Davi menciona-o como “homem segundo o coração de Deus” (Cf. Atos 13.22).

O texto mencionado de 1 Samuel é muito interessante porque fala da situação de Davi e seus soldados ao chegarem das terras de Gate (dos filisteus) em Ziclague (cidade no Sul de Judá); Davi havia fugido para terra dos filisteus pela segunda vez pelos intentos de Saul: matar Davi!
Ziclague era uma terra de relevo sinuoso onde Davi e seus 600 soldados habitavam junto com seus familiares. Segundo relatos bíblicos, quando eles retornaram de Gate para Ziclague, ao chegar se depararam com a desolação da aldeia imposta pelos amalequitas; relata também que eles sentem profundamente a ausência de seus familiares. Tudo havia sido destruído e suas famílias levadas cativa.

É nesse contexto que a história bíblica se desenvolve e nos revela 3 grandes ensinamentos acerca da postura de Davi, e nos atualiza sobre qual deve ser nossa postura hoje na/com a/ em contexto de Igreja.

O primeiro ensinamento

Quando os 600 soldados de Davi chegaram em Ziclague, a Bíblia fala que eles choraram até perder suas forças (v.4) e pensaram inclusive em apedrejar Davi por raiva (v.6). Davi também chorou, e mais, ele se angustiou pela tentativa de linchamento. Seus companheiros de guerra agora queriam apedrejá-lo! No entanto, devemos nos atentar para o fato de que antes mesmo de consultar a Deus (v.8), e saber d’Ele as orientações devidas, Davi se reanimou no Senhor, seu Deus (v.6).

A palavra reanimar traz consigo todo um processo que ficou para trás, e para o hoje fala de recuperação dessa parte do processo passado: Significa que houve ânimo, houve desânimo, e por fim, reânimo! A Igreja precisa estar atenta à esse processo inerente ao cristão. De reânimo!

Nem sempre estamos bem! Nem tudo em nossa caminhada é sucesso, nem sempre estamos animados e fortalecidos para suportar os dias difíceis. Mas Davi nos dá uma lição incrível sobre confiar em Deus antes mesmo de saber a reposta que virá d’Ele. Não importam as circunstâncias, o processo de estar reanimado por Deus e em Deus é o que faz toda a diferença em nossa caminhada na/ com a Igreja.

Me lembro do trecho da letra de uma música muito bonita chamada “O meu Deus é soberano”, do cantor de música gospel Fernandinho; o trecho ilustra muito bem essa sensação de estar “reanimado” ...

“O meu Deus é soberano,
 O meu Deus é soberano;
 Se o meu coração parar de bater
 Ele sopra em minhas narinas e me traz de volta à vida”.

Deus já soprou sobre nós uma vez para nos dar a vida, Ele mesmo pode nos reanimar quando estivermos vivendo os tantos processos de “C.T.I. da alma”. Davi se reanimou, reanime-se você também existe uma caminhada proposta por Deus onde já somos mais do que vencedores em Cristo Jesus (Rm 8.37).

O segundo ensinamento

Depois que Davi consultou a Deus, ele obteve resposta favorável: Se ele fosse atrás dos salteadores conquistaria vitória; recuperaria seus pertences e família; e aos seus homens Deus permitiria o mesmo (v.8).

Na ida, durante a caminhada, Davi e 400 de seus homens encontraram um egípcio muito fraco por estar sem comida e sem bebida havia 3 dias e 3 noites (v.12). Após recobrada suas forças, alimentado, Davi lhe fez a seguinte pergunta: de quem és tu e de onde vens? (v.13). Essa pergunta certamente era crucial para aquele homem! Sua resposta foi sincera; mais ou menos assim: fui com os amalequitas na sua terra, destruímos tudo o que vimos pela frente e trouxemos com a gente seu gado e sua família. Ele contou ainda à Davi que era servo de um amalequita e que por ter ficado enfermo foi abandonado pelo seu senhor pois não poderia mais para auxiliar nos saques do bando. Logo à seguir, Davi, sempre estratégico, perguntou ao que antes estava enfermo se ele poderia guiá-los ao bando.

E foi exatamente o que aconteceu.

O segundo ensinamento para nossa caminhada na/com a Igreja nos é precioso. Deus pode nos surpreender usando quem Ele quer e do jeito que Ele quer. Lembremo-nos de 2 Rs 6 e 7; Deus honra a profecia de Eliseu contra os Assírios e ameniza o período de fome em Samaria usando 4 leprosos.
No caso do texto lido Deus usa para guiar Davi e seu exército um enfermo, invalidado pelo seu senhor. Se não fosse os conhecimentos desse homem Davi demoraria muito mais tempo de caminhada até alcançar os amalequitas, “saqueadores de bênçãos”: Deus colocou na frente de Davi e de seus homens, um abandonado, aquele que os levaria à possibilidade de recuperar suas famílias e pertences.

A Igreja não pode ignorar e passar de largo, e nem abandonar os soldados enfermos que vão ficando feridos no meio do caminho. Frequentemente me vejo num gabinete ouvindo alguém que quer terminar de matar o solado ferido por ser ele/a um peso para o ministério, para a Igreja. É muito difícil no meio de uma guerra a tropa ter que dar conta de seus companheiros feridos; não raras às vezes eles vão para cima das costas de alguém que além de se proteger tem agora que suportar os pesos de um colega que caiu ferido em combate. Mas é exatamente essa que deve ser a postura da Igreja em batalha; como um grande grupamento na guerra contra satanás (Ef 6.10) dar suporte real, em tempo real, aos realmente feridos (Ef 4.2). Não podemos fazer isso tão somente em troca de alcançarmos objetivos, isso seria egoísmo e um “des-Evangelho”, embora essa pareça ser a realidade da Igreja hoje, num mundo onde perdeu-se a perspectiva de gratuidade. Mas, certamente Deus usará nosso cuidado para com os combatentes feridos e abandonados no meio do caminho à nosso favor (1 Co 9.17).

Quando a Igreja faz a opção de não abandonar no meio do caminho os soldados feridos, certamente ela chegará com maior eficácia aos seus objetivos de edificação do Reino de Deus entre nós e para o mundo.

O terceiro ensinamento: os despojos!

Após Davi ter alcançado os amalequitas, a Bíblia nos relata que ele ressarciu para si tudo quando havia perdido – de certa forma foi restituído; aos recuperados de Davi foi dado o nome de despojos (cf.: v. 20).
Podemos então qualificar despojo como sendo “o algo” que antes era meu; mas que por algum motivo eu perdi, e agora recuperei novamente.
Uma pérola para nós cristãos!
Muitos de nós ficamos pedindo à Deus bênçãos incontáveis, e não cessamos de pedir. Mas na verdade não nos prontificamos, às vezes por medo, e outras por dificuldades diversas, em vencermos nossos gigantes. Para isso teríamos que identificar nossos inimigos e localizar num segundo passo nossos despojos. Mas em nossa caminhada na/com a Igreja, quase nunca nos preocupamos em vencermos nossos inimigos, e fechar as nossas brechas, esse é o caminho mais difícil. O caminho mais fácil é pedir outro para Deus.

Deus não abençoa mais uma vez, e mais outra (...) - e sempre assim num processo monótono, de quase monólogo: “eu peço e Ele me dá!”. O próprio Jesus disse que se eu pedir pão é isso o que eu terei das mãos de Deus: pão. Todavia se o pão for roubado, eu preciso lutar por ser restituído, e isso demanda energia para alcançar os amalequitas espirituais, os que saquearam minha Ziclague, e pegar meus despojos.

Deus quer que nos levantemos e marchemos, rumo a restituição do que um dia já foi bênção para nós; eia, fechar as brechas, vencer nossos inimigos espirituais (Ef 6.19; 2 Co 10.4) - aos despojos! Quando eu como parte da Igreja entender isso na minha caminhada de fé, certamente estarei disposto a verificar o meu passado, rever os meus erros e consertá-los; isso me aprimorará no processo de caminhada cristã, processo de santificação.

Conclusão

Minha caminhada cristã depende de eu querer estar reanimado em Deus e com Deus antes mesmo de saber o desfecho da minha história; depende do suporte que eu dou às pessoas que estão dentro e fora da Igreja, magoadas por algum motivo, feridas! E depende da minha disposição em visitar meu passado, meu presente e projetar por meio de Deus o meu futuro, para identificar os inimigos da minha mente, os que militam contra mim (Gl 5.17; Tg 4.1), vencê-los e reaver meus despojos.

Onde celebraremos a páscoa? (Mc 14.12-16)

O relato de Marcos sobre a pergunta que os discípulos fizeram à Jesus pode ser uma chave de leitura para nós cristãos entendermos o significado da celebração pascal em nossos dias.
A celebração

No Primeiro Testamento a Páscoa era uma celebração cultural, portanto localizada! Era o tempo em que o povo Hebreu trazia à memória o período do cativeiro em terras egípcias; e celebravam, com boa recordação, o livramento que Deus deu aos primogênitos das famílias cujas portas estavam marcadas nos umbrais com sangue do cordeiro imolado. Podemos afirmar também, que na Páscoa o Hebreu celebrava a libertação do povo caracterizada no êxodo, e a entrada na terra que emana leite e mel: terra prometida por Deus!

No Novo Testamento a celebração pascal vai aos poucos adquirindo um caráter festivo-universal; deixa portanto de ser uma festa localizada, ou hebréia somente. Deixa de ser específica de uma cultura e se transforma num compromisso cristão de famílias, e de cada um dos membros da mesma, para com Deus. Temos um exemplo esclarecedor disso quando, nas palavras do Apóstolo Paulo em sua epístola aos corintos (1Co 5.7-8), Cristo é o Cordeiro-Pascal imolado. Na medida em que Cristo foi sendo difundido Ele mesmo foi ficando universal; acontece o mesmo com a festa da páscoa e dos pães asmos. A dimensão do fermento que ficou de fora dos pães asmos no êxodo, concreta para o povo hebreu, agora é elevada à dimensão de “pecado-pureza”: no “ser”, no culto doméstico, na Igreja, e assim por diante.

Mas e hoje, o que significa a Páscoa? onde vamos celebrar então?

Essa pareceu ser a essência da pergunta dos discípulos à Jesus no relato do Evangelista Marcos. Vamos observar atentos o texto bíblico e ver o que estava implícito na resposta de Jesus.

Vimos que Jesus envia os discípulos à uma casa; o envio foi específico (o verbo apostello, no grego pode ser lido como “ir a um lugar estabelecido”). Alguns detalhes me chamaram atenção nesse envio a um local pré-estabelecido. Por exemplo, a ênfase que Jesus dá no “espaço-disponível”.

a. Espaço disponível fora da casa do homem – Trazendo um cântaro de água (v.13). Conforme Lv 23.2-3, no primeiro e último dia da celebração da páscoa e dos pães asmos não poderia haver esforço físico, de forma alguma; a menos que fosse para a preparação do que se haveria de comer. É possível que esse moço soubesse do risco de vida que ele corria por carregar um cântaro de água no primeiro dia da celebração. Seria isso uma afronta à cultura, ou uma forma de subversão? Ou um esforço necessário para que a celebração fosse possível? Consideramos essas duas possibilidades como plausíveis, mas não podemos fazer maiores afirmações nesse sentido. No entanto, sabemos com certeza que o homem estava indo para sua casa com um cântaro de água. Fica-nos claro a ênfase na caminhada desse homem fora da casa onde haveria de acontecer a celebração pascal: ele não temeu, por algum motivo, sofrer as penalidades da lei judaica.

b. Espaço disponível dentro da casa do homem – havia um cenáculo espaçoso, mobiliado e estava pronto (v.15). Conforme Jesus orientou seus discípulos, já havia o espaço necessário na casa; ali eles/as já estavam preparados/as para receber Jesus e seus discípulos/as para a celebração.

c. Espaço disponível no coração do homem – Diga ao dono da casa que é o Mestre (gr.Didaskalos, professor) quem pergunta (v.14). É muito interessante Jesus referir-se a si mesmo como “o professor”; certamente era uma família de corações aprendizes; uma família que estabeleceu com Deus uma relação de sala de aula, onde eles eram os alunos.

Conclusão

Já temos condições de, ainda que de forma básica, respondermos pelo significado de páscoa para nós hoje, e qual é a família que tem condições de celebrar uma páscoa genuína? Acredito que, com base nesse trecho lido do evangelho de Marcos, sim! Páscoa é Deus em Cristo, ressurreto e com a gente onde quer que estejamos; é Deus com a gente na nossa casa, nossos espaços!

Jesus tem buscado corações, e famílias, que “tenham condições” de oferecer-lhe hospedagem! Contrariando a lógica atual, onde “ter condições” significa gozar de espaços amplos para lazer, entretenimento e uma “conta bancária gorda”, Jesus busca uma família que trabalhe espaços cristãos; isso é ter condições de oferecer-lhe hospedagem. Ele busca a família que leva as Boas Novas para “o lado de fora”; e que não teme correr riscos quando isso for necessário. Famílias que tenham o espaço da casa preparado para sua chegada e para acomodar seus discípulos; um cenáculo precisa estar preparado em nossos lares, em nossos corações: Deus tem buscado, para estabelecer seu Reino de amor e justiça, famílias que gozem de um espaço favorável à fé.

Finalmente, a páscoa é celebrada onde os corações são um espaço vivo para a atuação de Deus; o espaço possível de estabelecermos com Ele uma relação de aprendizado: Ele é o Mestre e Professor, e nós alunos/as.