Fico admirado ao ler a história dos irmãos Jacó e Esaú. Principalmente o tão abordado episódio do “prato de lentilhas”. Minha admiração é pelo fato de como os irmãos se movem na cena do texto, e tomam suas decisões, quase que uma brincadeira. Quando Esaú chega com fome de um de suas caçadas, ele sente o cheiro delicioso prato de lentilhas, que Jacó acabara de cozinhar.
Jacó, provavelmente sonhava com o fato de um dia poder ter sido o primogênito, mas é improvável que estivesse premeditando cozinhar as lentilhas para roubar a primogenitura de seu irmão Esaú. Um sonho de criança (...), quem nunca teve um? Talvez um sonho que era alimentado dia a dia, pelo fato de por pouco não ter nascido “o primeiro”.
Jacó, provavelmente sonhava com o fato de um dia poder ter sido o primogênito, mas é improvável que estivesse premeditando cozinhar as lentilhas para roubar a primogenitura de seu irmão Esaú. Um sonho de criança (...), quem nunca teve um? Talvez um sonho que era alimentado dia a dia, pelo fato de por pouco não ter nascido “o primeiro”.
Falar em primogenitura na cultura semita significava tocar em assunto importante – o mesmo que mexer com a lei, uma das “regras da cultura judaica”. No texto (...) ambos abordavam a primogenitura, cada um por um prisma diferente, mas nenhum dos dois estavam falando em regras semitas (...); talvez para Jacó, aquilo fosse um momento terapêutico, onde seus traumas mais infantis estavam sendo trabalhados, e para Esaú, era a oportunidade de matar a sua fome [que não devia ser pouca]. O que aconteceu aqui foi exatamente “uma troca de favores”.
Na “troca de favores”, para ambos, o que valia era muito mais unir o útil ao agradável, que fazer mercado. Vamos negociar então!! O prato de lentilhas pela primogenitura, e tudo logo estaria resolvido. Certamente que nesse caso Esaú saiu na melhor, saciou a sua fome. E infelizmente, o que ele disse a Jacó seu irmão, não valeu de nada. Esaú não tinha condições – de nenhuma espécie - de transferir sua primogenitura ao “irmão sonhador”. Isso fica bastante claro para nós, quando posteriormente, a mãe dos irmãos precisou utilizar-se de certa “artimanha” para que Jacó fosse abençoado por Isaque, no lugar de Esaú.
Tal história nos remete ao período do sistema tribal do povo de Israel, muitos historiadores denominam esse, um período de grande pureza e ingenuidade do povo semita. Tudo quanto colhiam da terra, e o leite, e a carne: dividiam! As necessidades entre o povo no período tribal eram sanadas na radicalidade da fé, por meio da partilha. A troca acabava sendo em função das necessidades uns dos outros, diferente da função utilitarista na busca por aproximação das pessoas, visível atualmente. A história de Jacó e Esaú retrata muito bem “a ingenuidade”, e a propensão à troca - a partilha em função das necessidades de cada um.
Certamente que, a história do povo de Israel toma rumos diferentes com a implantação do sistema monárquico, etc. Implica numa mudança drástica na estrutura cultural mais profunda do povo de Israel. Israel passa a conhecer a “comercialização”: com a inclusão do boi na cultura semita (animal de grande porte), os lucros, surge o exército que tem que ser mantido pelo “Estado”; maior movimentação de valores e etc. A concepção do povo muda, as demandas – agora ambições – passam ser outras. E posteriormente, o contato do semita com o helenismo - mundo helênico, grandes reformas; (...).
Você deve estar se perguntando, mas por que tanta história? Fato é que, hoje somos resultado de “uma história”. O sistema capitalista de mercado, em pleno exercício, como que um vulcão em erupção, já nos dita um estilo de vida, modas e tendências. O capitalismo reformulou a nossa história, mexe com nossas rotinas, e isso nos traz grandes implicações bastante atuais, das quais, não podemos ficar como que alienados. Fazemos parte de uma sociedade, cada vez mais “utilitarista”.
A história de Jacó e Esaú, de que ela nos serve? Como interpretar a história do “prato de lentilhas” hoje? Bem diferente daquela época, hoje tudo é mercado!! A troca não é mais para satisfazer a necessidade do que pede, mas é exatamente “onde” consigo ganhar, explorar, arrancar a qualquer custo o meu lucro.
Temos um bom motivo para refletimos aqui:
Se Jacó fosse vivo hoje, certamente ele estaria preparando o prato de cozido, com o qual roubaria o direito do irmão de primogenitura. Ele seria o primogênito, ainda que a partir da fome do seu irmão – mas, “os fins justificam os meios”? A conversa seria gravada, para que depois um advogado pleiteasse junto de um Juíz a parte que caberia a Jacó: talvez implicações modernas da promessa feita por Esaú.
Também, muitos de nós negociamos coisas, que não deveriam ser negociáveis. Nossa fé, nossa esperança, nosso testemunho, e na sociedade dos “Nick Name” - nosso nome, nossa primogenitura. Não vivemos em uma sociedade ingênua, não podemos sair por aí “fazendo e desfazendo”, e a partir de meus achismos, “negociar” elementos centrais da minha vida, do meu eu – do meu corpo.
E, qual é a minha postura, diante daqueles(as) que estão do meu lado? Enxergo nas pessoas – seres humanos, ou “possibilidades”? Muitas pessoas têm tanto, outros, são tanta coisa – tanto ‘status’, porém é sempre às custas do irmãozinho, da irmãzinha - do fracasso de alguém, do processo chamado “negociação gospel”. Negocio até “o meu dom”, esse vira meio pelo qual consigo acesso àqueles/as que “estão no poder”.
Penso que está na hora de aprendermos com a história do prato de lentilhas, e resignificá-la para hoje: O episódio dos irmãos Jacó e Esaú. Devemos nos revestir da simplicidade e do amor com que os irmãos se ajudavam na comunidade primitiva, período tribal do povo de Israel. Não devemos nunca perder de vista os nossos objetivos enquanto cristãos, paradigmas ensinados por Jesus: de comunhão e partilha. Não podemos negociar aquilo deveria ser inegociável para nós, mas que acabo abrindo mão, por conta das “exigências do mercado”, para obter algum lucro, ainda que a troco de algo que satisfaça nossas necessidades, tão passageiras, e momentâneas, tão ínfimas, tão (...).
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